Contradições

Moraes abre inquérito para investigar Marcos do Val por versões da ‘Operação Tabajara’

Após anunciar que Bolsonaro o teria “coagido” a participar de um golpe, senador mudou relatos em favor do ex-presidente e atacou o ministro do STF

Marcos Oliveira/Agência Senado
Marcos Oliveira/Agência Senado
Marcos do Val também disse que renunciaria, mas desistiu após ouvir filhos de Bolsonaro

São Paulo – O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), abriu nesta sexta-feira (3) inquérito contra o senador Marcos do Val (Podemos-ES). A investigação pretende apurar as versões “conflitantes” que o senador apresentou sobre a participação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em mais uma trama golpista. A “Operação Tabajara”, conforme classificou mais cedo o próprio ministro, tinha o objetivo de grampeá-lo, e depois prendê-lo, como forma de invalidar o resultado das eleições presidenciais.

A iniciativa de Moraes ocorre após do Val anunciar que vai pedir à Procuradoria-Geral da República (PGR) para afastar o ministro da relatoria do inquérito dos atos antidemocráticos. O ministro do STF confirmou hoje que o senador o procurou para relatar a trama golpista elaborada pelo então deputado Daniel Silveira (PTB-RJ). Na ocasião, ele sugeriu ao senador que formalizasse a denúncia. O senador alega que Moraes estaria mentindo.

Na petição, o ministro diz que do Val “apresentou, à Polícia Federal, uma quarta versão dos fatos por ele divulgados, todas entre si antagônicas”. Desse modo, indica a “a pertinência e necessidade de diligência para o seu completo esclarecimento, bem como para a apuração dos crimes de falso testemunho, denunciação caluniosa e coação no curso do processo”. As informações são da CCN Brasil.

Pisando na própria língua

Em entrevista à revista Veja ontem (2), o senador afirmou que se encontrou com Silveira e Bolsonaro, quando teria sido “coagido” a participar da trama golpista. Do Val disse inclusive que iria renunciar e se mudar para os Estados Unidos. Depois, procurado pelos filhos de Bolsonaro, ele foi mudando a versão. Primeiro, disse que Bolsonaro ficou em silêncio durante o encontro.

No mesmo dia, ele prestou depoimento à Polícia Federal (PF). Disse então aos investigadores que toda a explanação da trama golpista foi exposta por Silveira. Disse que Bolsonaro “ficou calado”, mas que “em nenhum momento negou o plano ou mostrou contrariedade ao plano”. O senador relatou que pediu uns dias para “pensar” sobre o plano. “Foi quando ele (Bolsonaro) disse: ‘então, aguardo a resposta’. Foi a única coisa que ele falou”.

Em função das contradições nas versões do senador, Moraes determinou que a Veja envie a íntegra da entrevista em até cinco dias, sob pena de multa de R$ 100 mil reais. GloboNews e CNN Brasil também devem entregar as entrevistas com do Val. O ministro ainda ordenou que a Meta – dona do Facebook e Instagram – envie a live em que o senador afirma que foi coagido por Bolsonaro a participar do golpe.

Na mira do Conselho de Ética

Alinhado com o governo Bolsonaro, Marcos do Val agora recusa a pecha de “bolsonarista”. Contudo, o desenrolar da trama da “Operação Tabajara” revela que o objetivo do senador seria levantar suspeição contra Moraes. A live em que ele denuncia que foi “coagido” por Bolsonaro foi ao ar na madrugada de ontem, horas depois da derrota do também bolsonarista Rogério Marinho (PL-RN) à presidência do Senado.

Um dos ativos da campanha de Marinho era a possibilidade de abrir processos de impeachment ou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra o que os bolsonaristas consideram “abusos” do STF, em especial Alexandre de Moraes. Logo, após a derrota do seu aliado, do Val parece ter destravado outro plano para tentar atingir o ministro.

Além do afastamento de Moraes, do Val também afirmou apoiar a criação da CPI dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro. Mesmo enrolado, do Val publicou ontem num story do Instagram um suposto documento da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). “Neste relatório, cai o ministro da Justiça e cai o presidente Lula!”, afirmou. O alegado relatório, no entanto, é apenas um calendário da agência.

Desse modo, Marcos do Val também terá que prestar esclarecimentos ao Senado. O líder do governo, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), disse que seu partido deve entrar ainda hoje com um pedido de investigação no Conselho de Ética.

“Não terá a CPI que ele quer, mas quero antecipar para todos vocês, terá Conselho de Ética, porque se ele presenciou as articulações para ocorrência de um golpe de Estado e não denunciou, no exercício da função pública, prevaricou”, disse Randolfe à GloboNews.