Investigado

Após deboche de Luciano Hang em CPI, senador cita organização criminosa

Estratégia bolsonarista era provocar tumulto e desqualificar CPI. Hang chegou e saiu escoltado por Flávio Bolsonaro

Leopoldo Silva/Agência Senado
Leopoldo Silva/Agência Senado
Estratégia bolsonarista se instala na comissão com depoimento de Luciano Hang

São Paulo – As expectativas de membros da cúpula da CPI da Covid de que o empresário Luciano Hang provocaria tumulto em seu depoimento se confirmaram. O dono da rede de lojas Havan chegou à sessão ladeado pelos senadores Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e Marcos Rogério (DEM-RO) com posturas de seguranças. Outros senadores bolsonaristas, como Luiz Carlos Heinze (PP-RS) e Eduardo Girão (Podemos-CE), despejaram elogios que beiraram a bajulação. O bolsonarista debochou da comissão, mentiu e adotou atitudes ainda não vistas em nenhuma das oitivas. O senador Humberto Costa (PT-PE) observou: “Luciano Hang está rindo porque acha que a CPI não vai dar em nada. Não estamos aqui falando sem ter documentos. O Supremo vai desvendar essa organização criminosa”.

Depois da inquirição do senador, o “veio da Havan” chegou a se dirigir ao parlamentar dizendo-se triste por ele não ter feito perguntas. “Dez minutos de narrativas, de mentiras”, disse Hang a Humberto. Em seguida, Hang recuou e pediu para desconsidera a expressão “mentiras”. No exercício da presidência, o vice Randolfe Rodrigues (Rede-AP) interrompeu e pediu para a secretaria da Mesa retirar a expressão das notas taquigráficas.

Diante da postura até mesmo de um dos advogados de Hang, o presidente da CPI da Covid, Omar Aziz (PSD-AM), hesitou. No início da sessão, permitiu que o bolsonarista exibisse um vídeo que era mera propaganda de suas lojas. Depois, Aziz chegou a expulsar um dos defensores de Hang da sessão por desrespeitar o senador Rogério Carvalho (PT-SE), mas voltou atrás depois de pedido de desculpas.


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O senador Humberto Costa, além de lembrar investigações em andamento no Supremo Tribunal Federal, citou inquérito da Corte que investiga fake news e ataques à democracia, ao próprio STF e às instituições. Segundo Costa, Luciano Hang certamente vai responder, entre outros, pelos crimes de “expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente” e “infração de medida sanitária preventiva”, ambos previstos no Código Penal.

O relator da CPI da Covid, Renan Calheiros (MDB-AL), alertou o depoente que, em maio do ano passado, ele foi alvo de mandados de busca e apreensão executados pela Polícia Federal a pedido do ministro Alexandre de Moraes, do STF. O presidente do PTB, Roberto Jefferson, também foi objeto da ação na mesma data e, por isso, Jefferson está preso.

A audiência com Hang não era consensual entre os membros do G7. Além do previsível tumulto, para alguns senadores, como Randolfe, a oitiva era desnecessária diante de muitas provas contra ele em mãos da comissão. Mas a posição de Renan prevaleceu.

Luciano Hang e robôs nas redes

O senador Rogério Carvalho (PT-SE) chegou a pedir a Randolfe Rodrigues que solicitasse à Polícia Legislativa do Senado um rastreamento de todas as contas das redes sociais que interagiram com os membros titulares e suplentes da CPI. “Faço isso porque houve um ataque sistemático de robôs xingando e ofendendo senadores. Uma ação orquestrada exatamente no dia do depoimento de Hang”, justificou. Em seguida, Randolfe acolheu o pedido. Os senadores conectaram as falas e o comportamento do empresário como calculados para alimentar as redes sociais bolsonaristas.

A CPI mostrou diversos vídeos e fotos com manifestações de Luciano Hang propagando remédios ineficazes contra a covid-19, como hidroxicloroquina, e combatendo a vacina CoronaVac, entre outras. De acordo com a CPI, o empresário financiou o blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, investigado pelo STF por disseminação de informações falsas e por convocar atos antidemocráticos. O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) teria intermediado o contato entre o blogueiro e Hang, que nega ter financiado qualquer coisa.

Dilma Rousseff

Entre as informações falsas exibidas na sessão, Renan Calheiros mostrou em sua inquirição um vídeo de anos atrás, no qual a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) diz que Luciano Hang seria sócio de familiares da ex-presidente Dilma Rousseff. No vídeo absurdo, que seria de 2015, a parlamentar afirma: “Essa loja é da filha da Dilma, a Paulinha. E eu fico impressionada como os filhos de presidentes no Brasil ficam milionários e se tornam grandes empreendedores”.

O depoente reconheceu. “Nessa época ela não me conhecia, tanto é que caiu em uma fake news”, disse. “É normal. Qualquer um de nós recebe vídeos e acaba, lamentavelmente, acreditando naquele vídeo como uma verdade”, justificou.

Entre outros questionamentos, Renan quis saber sobre ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho do Trabalho em Santa Catarina contra Hang por ameaçar funcionários da Havan em 2018 com fechamento de lojas e demissão se Bolsonaro não fosse eleito. “Realmente sou processado, mas jamais vou intimidar (funcionários). É só fazer uma pesquisa com meus 22 mil colaboradores”, respondeu o depoente. “Eu perguntei se está sendo investigado”, devolveu Renan. “Confirmo, e sou inocente”, disse o empresário.

Após a sessão da CPI da Covid, Luciano Hang participou de entrevista coletiva, ao lado do senador Flávio Bolsonaro, na qual se queixou de ter sido tratado como bandido.