Vergonha

Jamil Chade detalha agressões e lamenta ‘sumiço’ do Brasil do G20

Um dos profissionais de comunicação brasileiros agredidos por seguranças de Bolsonaro, em Roma, Chade lamenta situação do Brasil no mundo

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Itamaraty ainda não esclareceu quem agrediu e quem ordenou

São Paulo – “O Brasil desapareceu do G20”, lamenta o jornalista Jamil Chade. “Hoje poderíamos facilmente dizer que é um G19. O vigésimo país ali não sabe sequer o que representa o G20”, lamenta o colunista do UOL em bate-papo com o jornalista Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual. Chade, é um dos jornalistas que faz a cobertura do encontro do G20, em Roma,. E foi um dos profissionais agredidos por seguranças durante passeio do presidente nas ruas da capital italiana, quando Bolsonaro saiu para cumprimentar seus apoiadores na rua de trás da embaixada do Brasil.

‘Feriadão’ de Bolsonaro na Itália provoca novos protestos

“E eles não estavam ali por acaso”, revela o jornalista. A claque havia sido informada com três dias de antecedência sobre o dia e horário que Bolsonaro apareceria para cumprimentá-los. “Era um teatro. Algo organizado para que nas redes sociais do bolsonarismo isso aparecesse como algo espontâneo.”

Ele conta que souberam desse encontro marcado por meio de apoiadores do presidente e foram para o local fazer a cobertura. Bolsonaro falou rapidamente e depois saiu em caminhada com os apoiadores. “A terceira caminhada em três dias, porque ele não tinha outra programação para fazer. Nenhum líder internacional quis estar com ele. Nessa caminhada ficou muito claro que os apoiadores eram bem-vindos, mas não a imprensa.”

A agressão

Segundo Jamil Chade, eram sete os jornalistas na cobertura e todos com muita experiência em viagens presidenciais. “Nenhum dos jornalistas ia atacar o presidente. A única coisa que a gente gostaria de fazer é o que se faz sempre: perguntas. Mas perguntas, a gente sabe muito bem, que nesse governo são complicadas.”

E, de fato, num curto espaço de tempo, de cerca de oito minutos, ocorreram muitas agressões contra os jornalistas. “A Ana Estela, da Folha, foi empurrada. Depois, algo mais sério, com a equipe da Globo, o repórter levou um soco. E eu parti para filmar a pessoa que estava agredindo para ter um registro. Essa pessoa, quando me vê filmando, parte para cima de mim também, torce meu braço e leva meu telefone. Depois ele joga na calçada e por uma sorte dessas que a gente não sabe como, o telefone continua gravando e filma tudo que estava acontecendo.”

O jornalista do UOL considera a situação extremamente grave. “Também é muito grave que já estamos terça-feira (quando concedeu a entrevista à Rádio Brasil Atual), e isso aconteceu no domingo, o governo brasileiro não se manifestou, não explica quem são aquelas pessoas. Se são seguranças privados, se são contratados da embaixada, se são orientados pelo governo para fazer aquela agressão. Ou se simplesmente foi um exagero da polícia local, o que também pode ser e está errado”, ressalta Chade, cobrando. “Precisamos saber quem são aquelas pessoas que nos agrediram.”

Brasil constrangido

Jamil Chade prestou depoimento e fez um boletim de ocorrência na polícia local que, segundo ele, ainda está investigando quem são os agressores. O episódio de violência contra o jornalistas manchou ainda mais a já abalada imagem do Brasil no mundo. “O Guardian (jornal inglês) deu essa notícia. A Deutsche Welle, agência pública alemã deu essa matéria. Várias jornais italianos, como o La Republica, o principal, deram a notícia. Uma situação absolutamente constrangedora, mais uma, para o governo brasileiro.”

O jornalista, que vive na Europa há 21 anos trabalhando nesse tipo de cobertura, destaca que não é comum a segurança ou mesmo policiais atacarem jornalistas. “Isso, sinceramente, eu não tinha visto numa cobertura presidencial em nenhum momento nos últimos 21 anos.”

Bolsonaro tem sido alvo de protestos em todas as viagens que faz. O que também é “absolutamente inédito”, lembra Jamil Chade. “Desde a redemocratização no Brasil, é a primeira vez que ser brasileiro no exterior como presidente é algo constrangedor, que não se aceita. Em todas as viagens, Bolsonaro foi alvo de protestos por parte da população local, é importante que se diga. Não se trata de um comitê pró um partido político brasileiro ou um grupo que representa outro partido. Estamos vendo protestos por parte de estrangeiros e isso é completamente novo.”

Um país esquecido

Não bastasse a vergonha das agressões a jornalistas, o Brasil foi ignorado no G20. Nenhuma agenda foi marcada para o presidente Bolsonaro, a não ser encontros informais, como com o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan. “Bolsonaro não sabe que está ali representando um país. Ele acha que está ali representando o Jair. Que foi o Jair que foi convidado. O Jair não foi convidado. O convite é para o Brasil, uma das maiores economias do mundo. Desperdiçar isso é isolar o Brasil ainda mais. Um país que não tem lugar entre as grandes potências”, lamenta.

Jamil Chade revela que até mesmo os líderes de países de extrema-direita no resto do mundo sabem da limitação Bolsonaro. “Já ouvi inclusive da Marine Le Pen (líder da extrema-direita na França), dizendo que o que Bolsonaro fala é inaceitável às vezes. Ou seja, até a extrema-direita europeia tem certa prudência em estar ao lado dele”, diz, ressalvando Mateus Salvini, líder da extrema-direita italiana, país onde ocorreram as agressões aos jornalistas brasileiros.