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Dino na CCJ: ‘Não queremos impor nossa pauta, nem aceitamos que ninguém imponha sobre nós’

“STF disse que o ‘liberou geral’ estava errado. O que faríamos nós? Tentar invadir o Supremo? Não, esses não somos nós”, afirmou ministro sobre armas de fogo

Reprodução/TV Câmara
Reprodução/TV Câmara
Flávio Dino dá aula de Direito a deputados na CCJ, observado por Wadih Damous e Ricardo Cappelli

São Paulo – O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, rebateu argumentos da oposição bolsonarista sobre o 8 de janeiro, o controle de armas e as acusações de associação dele próprio, e do governo federal, com facções criminosas. Em depoimento na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados, nesta terça-feira (28), Flávio Dino respondeu com diplomacia e contundência a todas as provocações. Após 4 horas e 16 minutos de audiência, o presidente da CCJ, deputado Rui Falcão (PT-SP), encerrou a sessão, às 18h32.

Os oposicionistas tentaram usar a CCJ como palanque e basearam boa parte de suas intervenções em notícias falsas. Além disso, chegaram a tumultuar o andamento da audiência, com repetição de perguntas já respondidas e interrompendo respostas em andamento.

Flávio Dino afirmou à CCJ que o recadastramento de armas de fogo determinado pelo governo, que se encerra em 2 de abril, mas pode ser prorrogado, “visa separar o joio do trigo”. Já há “mais armas recadastradas do que havia de armas cadastradas”, garantiu. “Na verdade, estamos contribuindo para que pessoas que estavam na ilegalidade venham para a luz da lei.” O recadastramento será finalizado com nova regulamentação sobre a questão.

Assista à sessão com Flávio Dino na CCJ

“Não queremos impor nossa pauta, mas não aceitamos que ninguém imponha a sua sobre nós, porque nós ganhamos a eleição, e legitimamente. Porque ganhamos, compreendemos que governamos para todos e todas”, continuou. “Para nós, lei é coisa séria. E o Supremo disse seguidas vezes que o ‘liberou geral’ estava errado. O que faríamos nós? Rasgar a decisão? Tentar invadir o Supremo? Não, esses não somos nós. Esses são outros.”

Os bolsonaristas insistiam em atrapalhar a sessão. O deputado André Fernandes (PL-CE) liderou essa ala. Esse deputado é investigado no STF por publicar vídeo convocando “ato contra o governo Lula” . E também por postagem de imagem da porta de um armário vandalizado do STF depois do ataque, com o nome do ministro Alexandre de Moraes, e a legenda: “Quem rir vai preso”.

Observado pelo advogado Wadih Damou e o ex-interventor do Distrito Federal, Ricardo Cappelli, Fernandes ouviu uma aula de Flávio Dino e foi motivo de gargalhadas. Cappelli, por exemplo, não se conteve ante a humilhação sofrida pelo bolsonarista.

Sobre o 8 de janeiro

Questionado sobre o 8 de janeiro, Dino afirmou que o Ministério Público Federal, a Polícia Federal (PF) e o Judiciário vêm cumprindo seu papel. “Tudo o que nós fizemos em relação à apuração do dia 8 continua. Os inquéritos são conduzidos tecnicamente, submetidos à Procuradoria Geral da República e ao Judiciário.”

De acordo com ele, a Polícia Federal “tem independência técnica” para investigar. “E lembro, há mais de mil ações penais propostas contra os terroristas. Essas ações vão ser julgadas pelo Judiciário. Espero que o que aconteceu não aconteça nunca mais.”

Ele desmentiu diversas fake news, entre as quais a de que recebeu, antes dos atos terroristas, “um informe da Abin tão secreto que nunca ninguém leu, nem eu mesmo”. Comentou que na atualidade está-se invertendo o chamado “ônus da prova”, um dos princípios do Direito, segundo o qual quem acusa tem que provar. “Como é que eu vou provar que não recebi? Isso não existe juridicamente. Quem diz que eu recebi que mostre o informe mítico e diga que dia e que horas eu recebi.”

Associação esdrúxula

O ministro comentou a associação “esdrúxula” inventada entre ele e uma organização criminosa por ter ido ao Complexo da Maré, no Rio. “Todos, quando chegam em campanha (eleitoral), lembram de favelas e periferias, e ninguém pergunta se ali há crime organizado”, ironizou.

A “tentativa vil de criminalizar aquela população, como se fossem todos criminosos, é um preconceito contra quem mora em bairro popular”, afirmou Dino. “Tenho obrigação, como ministro da Justiça, de reagir contra este ataque a essas pessoas. É esdrúxulo imaginar que me reuni com o Comando Vermelho e antes disso avisei a polícia. É preciso ter seriedade.” Ele prometeu que continuará indo a comunidades, mas não cometerá mais o “erro” de não convidar parlamentares para irem junto.

Dino criticou a “lenda urbana que diz que a proliferação de armas diminuiu a violência” no país. “É mentira”, disse. Uma queda nas estatísticas de violência começou em 2018, portanto antes do “liberou geral” de Jair Bolsonaro, segundo ele. Acrescentou que as responsáveis pelo combate ao crime são as policias e insistir em falácias é desrespeito a elas.

PF, internet e crime organizado

O ministro elencou realizações de sua pasta sob o novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo ele, há R$ 100 milhões bloqueados por decisão judicial devido a investigações da PF contra financiadores e lavadores de dinheiro ilegal decorrentes da exploração do ouro ilegal.

Comentou ainda a intenção de trabalhar o tema da internet, “em que muitos confundem liberdade de expressão com ausência de lei e norma”. “Não é assim nem na ótica da Constituição Federal, nem na ótima do Código Civil.”

O combate ao crime organizado, com apreensões diárias de drogas e armas, assim como a restauração das funções republicanas da Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal também foram citadas pelo ministro da Justiça. Ele acrescentou que está sendo dada especial atenção a fronteiras e garimpo, no “território devastado por facções criminosas”.

Provocado sobre ter ido ao Complexo da Maré amparado por “apenas duas viaturas”, Dino respondeu que “o miliciano” que subiu na passarela para filmar ou não filmou direito, ou só divulgou o que lhe convinha. Disse ainda, questionado sobre ter pedir autorização a facção criminosa, que tratou da visita com o governo estadual, a prefeitura e respectivas áreas de segurança.

Ainda sobre o tema, o ministro classificou como “vil” as expressões discriminatórias e criminalizadoras em relação às comunidades. “Fui muito bem recebido, pretendo voltar lá outras vezes e recomendo que os senhores e senhoras vão também. A todos os convites similares que receber, farei. Porque é meu dever.”