Julgamento do STF

Em voto, Marco Aurélio diz que Renan fez deboche institucional com Judiciário

Para ministro que determinou afastamento, postura do Senado de não atender decisão desmoralizou o STF. PGR diz que não vê “crise entre poderes”, mas “descumprimento inadmissível” de ordem judicial

memória/ebc

‘Inconcebível, intolerável e grotesca, a atitude do senador (Renan)’, disse o ministro

Brasília – Com um discurso duríssimo, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello, responsável pela decisão monocrática de segunda-feira (5) que determinou o afastamento de Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência do Senado – decisão esta descumprida pela mesa diretora da Casa até o julgamento de hoje (7) – disse que Renan fez “um deboche institucional”. O senador, na visão do ministro, “deu o verdadeiro jeitinho brasileiro, a meia sola institucional para permanecer no cargo”.

De acordo com o magistrado, o que chamou de “pulo” apontado como saída para escapar da decisão, dado por Renan (que não recebeu o oficial de justiça com a notificação da decisão), “fere de morte as leis da República, fragiliza o Judiciário e significa uma prática deplorável”.

“Inconcebível, intolerável e grotesca, a atitude do senador implica na desmoralização ímpar do Supremo Tribunal Federal, porque o princípio constitucional passa a ser o nada jurídico. A decisão do Supremo vale para todos, mas não para o senador Renan Calheiros”, afirmou. “A que custo lhe valerá esta blindagem judicial neste momento?”, questionou, ainda, Mello.

Numa ironia ao senador, o ministro também disse que fazia “justiça” a Renan Calheiros em suas declarações feitas ontem, no Senado, por não tê-lo chamado de “juizeco”. Foi uma menção à forma como o senador se referiu ao juiz federal que autorizou a operação de prisão de servidores da policia legislativa, no último mês, sem que houvesse pedido de autorização para isso à presidência do Congresso.

Pouco tempo antes, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou que não via crise institucional com a decisão monocrática de um ministro da mais alta Corte do país em relação ao presidente do Congresso – como foi argumentado pelos integrantes da mesa diretora do Senado, que emitiram nota comunicando que iriam descumprir a decisão judicial. De acordo com Janot, o que há é “um impasse”, provocado pelo descumprimento da decisão do magistrado do STF por Renan.

O procurador-geral lembrou os pedidos de investigação do senador em outras ações (11 ao todo) feitos pelo  Ministério Público Federal e o fato de ele (Renan) ter se transformado em réu pelo mesmo tribunal, no último dia 1º. Janot deu parecer no sentido de que Renan Calheiros seja afastado da presidência da Casa. “É inadmissível que um réu se agarre ao cargo e não cumpra uma decisão do STF”, destacou.

Impasse para o colegiado

Nos bastidores, parlamentares têm expectativa de que haja uma divisão no pleno do STF sobre a questão. Não se sabe se os ministros vão decidir pelo afastamento de Renan da presidência do Senado, conforme pediu o relator do caso, ou optar por uma alternativa, que seria a permanência do parlamentar na presidência do Legislativo, mas sem o direito de integrar a linha sucessória da Presidência da República.

O espaço de acompanhamento da votação no plenário do STF está lotado por deputados, senadores, advogados, juristas, estudantes de Direito e repórteres. O julgamento será retomado em instantes. A presidenta do tribunal, ministra Cármen Lúcia, suspendeu a sessão por alguns minutos, antes que comecem a ser proferidos o votos de cada um dos integrantes do colegiado. Dois deles estão ausentes. Gilmar Mendes, em viagem ao exterior, e Luís Barroso, autodeclarado suspeito para julgar o caso, iniciado por advogados da Rede com quem já trabalhou.

A decisão de Marco Aurélio Mello acolheu a uma ação do partido Rede Sustentabilidade, que questionou a possibilidade de o Congresso ser presidido por um político que se transformou em réu numa ação penal.

Renan passou a manhã inteira em sua residência e está, no momento, em seu gabinete, na presidência do Senado – onde acompanha o julgamento ao lado de aliados, como o senador Romero Jucá (PMDB-RR) e o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP).