Desenvolvimento urbano: uma tarefa que prefeitos devem pensar a longo prazo

Porto Alegre – A importância da escolha do gestor municipal é fundamental em tempos de crescimento desordenado das metrópoles e tantas intervenções da humanidade no meio ambiente. Desde o início do […]

Porto Alegre – A importância da escolha do gestor municipal é fundamental em tempos de crescimento desordenado das metrópoles e tantas intervenções da humanidade no meio ambiente. Desde o início do século passado, mais da metade da população mundial deixou o campo para morar em cidades. Segundo o doutor em Urbanismo e professor de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Benamy Turkienicz , saímos de uma fase da história onde as populações não se comunicavam para uma interação cada vez maior, o que acarretou uma série de mudanças nas cidades, de forma rápida e sem a resposta do poder público na mesma velocidade. “Houve um movimento interno parecido nas diferentes nações do mundo, de migração do campo para a cidade. Porque as formas de produção envolvem, via de regra, a concentração de pessoas. A automatização e eficácia da produção rural também reduziram a utilização de pessoas para produção. Isso aconteceu de forma muito rápida”, afirma.

No caso do Rio Grande do Sul, a curva do êxodo rural estacionou nos últimos anos, mas a população urbana já é de 84% no estado e, segundo Turkienicz, a tendência é aumentar até 2025, chegando a 90% do total de habitantes. “Isso envolve uma demanda de planejamento para que o afluxo da população corresponda à capacidade de oferta dos serviços para as populações das grandes e médias cidades”, diz.

Com a chegada dos grandes eventos é ainda mais preocupante a capacidade de previsão de futuro nas intervenções feitas pelos prefeitos municipais. “Se é possível prever quantas pessoas cabem em um estádio, a lógica para prever quantas pessoas cabem em uma cidade requer a mesma previsão. As cidades têm limitações geográficas e os lugares para as pessoas morarem são como os assentos de um estádio, têm limitação para ser ocupados”, compara.

Na avaliação do presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil no RS, Tiago da Silva, a lógica de construção das cidades, por seguir a lógica do sistema capitalista, segue os interesses de mercado e não das pessoas. “Vivemos diante de conflitos constantes por causa do valor de cidade e o valor do mercado. A administração pública tem dois papeis fundamentais neste processo e que, de modo geral, não são cumpridos nas cidades médias. É ser indutor do desenvolvimento para todos e não para alguns setores da sociedade e ser mediadora dos conflitos naturais de uma cidade”, diz.

“O bem comum, que é um termo muito usado pelos políticos, é beneficiar a todos. O que acaba não ocorrendo na prática. Vemos uma transferência de recursos para grandes obras e grandes empreendimentos, o que permite a construção de imóveis e viadutos de forma a causar grandes impactos e beneficiando pequenos grupos”, critica o presidente do IAB-RS.

Diante dos problemas sociais, econômicos e ambientais comuns às cidades, o prefeito é o político mais exposto à aprovação ou reprovação. Um presidente ou governador, com uma boa equipe de ministros ou secretários, até consegue driblar certas debilidades, o que fica muito mais difícil para os prefeitos. O valor da política local se torna fundamental para o desenvolvimento da humanidade de forma global.

Qualidade técnica 

 

O desfecho poderia ser outro e o desenvolvimento urbano, uma consequência real com a eleição nas cidades. De acordo com o doutor em Urbanismo Benamy Turkienicz, é possível fazer uma série de previsões com o auxílio da tecnologia em diversas áreas. “A meteorologia nos auxilia a prever o tempo, os modelos demográficos nos mostram o quanto a população irá aumentar nos próximos anos. Ferramentas de tráfego nos mostram a capacidade de veículos no espaço e no tempo em que podem congestionar. Temos modelos de drenagem urbana que demonstram que determinadas precipitações de chuva por hora não terão suporte no sistema de drenagem. Então, temos atributos da estrutura urbana que nos dão confiabilidade de prever os impactos nas cidades. Não o fazem, porque fazem divisão das secretarias para acomodar partidos que não dialogam depois. As coisas acabam sendo administradas separadamente”, analisa.

De acordo com o urbanista, a capacidade de resposta dos gestores é ainda mais desafiada, porque, nas cidades, a maioria dos eventos ocorre simultaneamente. “Uma chuva pode gerar problemas de tráfego e de drenagem. O problema é a setorialização das intervenções. Se um departamento abre um buraco, o mesmo é aberto pela empresa de telefonia ou por outro departamento municipal depois. Eles não se comunicam e quem paga pelo ônus é o cidadão”, diz.

Para o presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil no RS, Tiago da Silva, a atual gestão da Prefeitura de Porto Alegre dá exemplos de situações concretas onde o desenvolvimento fica comprometido aos interesses econômicos e políticos. “O projeto do Metrô de Porto Alegre está sendo licitado sem existir de fato um projeto. A cidade não o que será feito e ficará submetida ao futuro concessionário”, afirma.

Planos diretores 


O instrumento básico de um processo de planejamento municipal para a implementação da política de desenvolvimento urbano, norteando a ação dos agentes públicos se chama Plano Diretor, geralmente feito sem qualificação técnica adequada, diz o urbanista Benamy Turkienicz. Ele explica que a falta de formação em Urbanismo é um dos problemas. “Não temos formação de Graduação ou Pós-Graduação em Urbanismo e somente 8% dos créditos dos cursos de Arquitetura tratam de urbanismo”, diz.


Por lei, todas as cidades com mais de 20 mil habitantes precisam ter Plano Diretor, o que não prática não ocorre e mais de 1,4 mil não tem. “Normalmente as que desenvolvem, fazem um conjunto de leis que não tem qualquer integração com uma previsão de futuro. E quem administra estas leis são pessoas que não têm formação para prevê-lo. Sabemos fazer edifícios, mas não monitorar o crescimento das nossas cidades”, avalia.