AFASTAMENTO DE CUNHA

Câmara discute como ficará com outro presidente investigado pelo STF

Em meio a dúvidas e tantos nomes na linha sucessória envolvidos com processos e investigações penais, principal entendimento de especialistas e parlamentares é que decisão terá de sair do STF

Câmara dos Deputados

Governança da Câmara dos Deputados: dilema

Brasília – A situação da Câmara no dia seguinte ao afastamento de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Casa divide os deputados. É quase consenso que a decisão deverá sair do próprio STF, a exemplo do que aconteceu com o rito de tramitação do pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff, julgado pelos ministros em dezembro passado. Isto, pelo fato de que o país vive uma situação atípica em termos de Legislativo e de Executivo.

“O vice-presidente que assume interinamente na Câmara, deputado Waldir Maranhão (PP-MA), é alvo de inquérito na Operação Lava Jato e, independente disso, não tem direito à linha sucessória da presidência da República num suposto governo de Michel Temer. E, no tocante ao Executivo, o nome que poderia substituir Eduardo Cunha como vice-presidente da República é o do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que também é alvo de inquéritos no STF e pode vir a figurar como réu”, afirmou o cientista político Alexandre Ramalho, analista legislativo e professor da Universidade de Brasília (UnB) – mostrando bem o “nó” que envolve a questão.

De acordo com informações da mesa diretora da Câmara, o regimento interno da Casa é claro: a convocação de novas eleições para a presidência só pode acontecer em caso de cassação de mandato, morte ou renúncia do presidente. Por conta disso, líderes partidários se reuniram esta manhã para tentar costurar alguma alternativa que seja permitida pelo regimento interno ou venha a ter um futuro aval do STF.

Uma das possibilidades é a negociação da saída de Maranhão do cargo de presidente interino – pelo fato de ele também ser objeto de inquérito – para a designação, com a sua anuência, de um nome que ocuparia mandato tampão até a realização de nova eleição para o comando da Casa. Já se cogita, inclusive, que este nome de consenso seja o do líder do PSD, o deputado Rogério Rosso (DF), mas não há confirmações quanto a isso.

Outra decisão que suscita duvida é sobre quem assumirá a Presidência da República, em substituição a Renan Calheiros, no caso de um governo Temer, quando este viajar para fora do país. “Estamos desde cedo procurando ler e estudar todo o regimento ao lado de advogados e assessores legislativos para achar uma solução, mas isso não é coisa a ser definida de uma hora para outra”, afirmou o deputado Bruno Araújo (PSDB-PE).

‘Cassação sairá da Câmara’

Já o ministro Teori Zavascki, que concedeu a liminar afastando Cunha, afirmou, no início da tarde, no STF, que mesmo no caso de a dúvida vir a ser dirimida no plenário do tribunal, a questão da cassação de Eduardo Cunha  não será definida pelo STF, mas pelos próprios deputados, em votação a ser realizada numa sessão plenária da Câmara.

O ministro praticamente confirmou entendimentos internos dos integrantes do colegiado da mais alta Corte do país, que vinham sendo mencionados nos bastidores, de que eles querem evitar, ao máximo, alguma acusação de que o Judiciário estaria interferindo em atos internos do Legislativo mais do que deveria.

Enquanto as lideranças não se entendem sobre o dia seguinte à polêmica decisão desta quinta-feira, os deputados que compõem o Conselho de Ética da Câmara comemoram. O presidente do órgão, José Carlos Araújo (PR-BA), afirmou que a partir de agora os integrantes da equipe trabalharão com mais tranquilidade, “sem sobressaltos e sem medo de manobras protelatórias”.

Segundo ele, o grande entrave do conselho era o uso, pelo então presidente da Casa, da estrutura que tinha disponível para travar o processo. “Não acredito que o substituto temporário dele (Cunha) irá fazer as mesmas manobras”, disse.

No próximo dia 19, o prazo para realização das oitivas programadas dentro da tramitação do processo que corre contra Cunha no Conselho de Ética se encerra. A partir dessa data, o relator, deputado Marcos Rogério (DEM-RO), terá dez dias pra proferir seu parecer. Caso seja pelo pedido de cassação e o relatório seja aprovado pelo órgão, o texto seguirá para votação em plenário – o que deve acontecer entre o final de maio e início de junho. “Mas ele (Cunha) pode renunciar antes disso”, ironizou José Carlos Araújo.

O líder do PT, Afonso Florence (BA), por sua vez, entende que a decisão de hoje do STF repercutirá no Conselho de Ética pelo fato de estar baseada em provas robustas contra Cunha. “Ele (Cunha) não vai mais liderar esse processo e acredito que não haverá mais nenhum parlamentar que se disponha a cometer as mesmas ilegalidades. Tenho a impressão de que a agora a investigação deve ocorrer com menos obstáculos”, acentuou.

Sem excessos

Para o líder do PSD, Rogério Rosso, que não quis comentar sobre qualquer acordo em torno do seu nome para assumir a presidência num mandato tampão, “todos fomos pegos de surpresa com a notícia, hoje de manhã”. Rosso pediu serenidade aos colegas. “O momento é de tomarmos cuidado para evitar excessos nesta Casa e preservar a Constituição e a normalidade institucional”, destacou.

Waldir Maranhão, que assumiu pouco antes das 9h o cargo em substituição a Eduardo Cunha, chamou a atenção pela celeridade com que quis sentar na cadeira do colega e se deixar fotografar pela imprensa na sala da presidência.

Maranhão, porém, foi criticado por ter iniciado e encerrado uma sessão plenária praticamente no mesmo momento, para evitar que os deputados fizessem pronunciamentos sobre o deputado afastado. E tem evitado, ao longo do dia, tecer comentários sobre a sua própria situação como investigado pelo STF. Ao ser questionado pelos jornalistas sobre sua condição, disse que tentará trabalhar para “conduzir o andamento das atividades legislativas com normalidade”.