Início turbulento

Cunha diz que só define comissões depois de resposta do STF

Na retomada das atividades parlamentares, mesmo pressionado, presidente da Câmara afirma que envia hoje recurso contra julgamento sobre rito do impeachment. Formação de comissões deve atrasar

José Cruz/Agência Brasil

Cunha tem de apresentar até dia 10 defesa ao STF sobre seu afastamento do cargo, pedido por Janot

Brasília – Com o dia de hoje (1º) marcado por reuniões, reencontros dos parlamentares no Congresso e, sobretudo, novos acertos partidários, o protagonista é o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Mesmo depois de mais denúncias de existência de contas irregulares fora do país, ele chegou ao Congresso afirmando que hoje mesmo encaminhará ao Supremo Tribunal Federal (STF) embargos de declaração – espécie de recurso – questionando o rito para o processo de impeachment decidido pelos ministros da mais alta Corte. Ele evitou falar em obstrução dos trabalhos, como quer a oposição, e prometeu abrir a sessão de votações da Casa na quarta-feira (3). Disse que só quer definir nova composição das comissões depois de receber esclarecimentos do STF.

Cunha ainda passou por uma saia-justa, ao participar da solenidade de abertura do ano do Judiciário, na sede do STF, no início da tarde. O evento contou com a presença do presidente do tribunal, ministro Ricardo Lewandowski, o deputado e o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) – presidente do Senado (Cunha e Calheiros representaram o Legislativo), além do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo (pelo Executivo), e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Janot sentou-se ao lado do presidente da Câmara e destacou, em seu discurso, a relevância da Operação Lava Jato (que investiga tanto Cunha como Calheiros) e a necessidade de continuação dos trabalhos. A fala do procurador-geral, embora atribuída a todos os envolvidos, foi vista como uma ironia mais direcionada a Cunha, uma vez que Janot é o autor do pedido feito ao Supremo para que o deputado seja afastado do cargo enquanto correm as investigações contra seu nome no âmbito da operação.

Atraso nas comissões

O presidente da Câmara, que não fez discurso, disse que espera um esclarecimento célere do STF sobre o rito do julgamento do impeachment e ressaltou: “O que vale para uma terá de valer para todas as comissões”. Ou seja, inicia o ano comprando mais uma briga com boa parte dos parlamentares que não concordam com esse entendimento.

Ao fazer esta afirmação, o deputado praticamente atrasa a mudança nas composições das comissões técnicas da Casa. E o mês de fevereiro costuma ser, justamente, de ajustes e realinhamento nestas comissões.

“O julgamento do STF foi claro, o que ficou decidido disse respeito apenas à comissão do impeachment. Se não ficou entendido para o presidente da Câmara, (ficou) para nós”, reclamou o líder da Rede Sustentabilidade, Alessandro Molon (RJ). “Isso é mais um pretexto para manter a composição atual das comissões, que têm a maior parte dos integrantes escolhida com a interveniência do presidente”, acrescentou o líder do Psol, Chico Alencar (RJ). “Sabemos que este ano a situação dele será diferente, e estamos mais próximos de acabar com esse autoritarismo que tomou conta das ações da presidência da Casa no ano passado. Ele (Cunha) quer aproveitar até o último minuto a oportunidade que tem de se manter no cargo e usufruir dos desmandos que realizou ao longo do ano passado.”

Recurso e CPIs

Mesmo assim, Cunha diz que tem pela frente três missões – a apresentação desses embargos de declaração sobre o julgamento do impeachment ao STF é apenas a primeira. A segunda é a apresentação de recursos pela sua defesa ao Conselho de Ética da Câmara para cancelar a votação que autorizou o processo de investigação contra ele. O argumento do deputado é que, como o relatório votado foi apresentado por um segundo relator, esse relator deveria ter dado mais tempo para pedido de vistas aos integrantes do Conselho.

Por fim, Cunha tem por obrigação, apresentar, até o próximo dia 10, sua defesa oficial ao Supremo sobre o pedido de afastamento dele do cargo e as denúncias de que tem se valido da presidência da Casa para protelar decisões a esse respeito. O pedido ao Supremo foi feito pela Procuradoria-Geral em dezembro. Após esse prazo, será marcado o julgamento.

O presidente da Casa ainda afirmou que formalizará esta semana a criação de duas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs): a do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e a da Federação Internacional de Futebol (Fifa). A do Carf funcionou no Senado e teve suas atividades encerradas no final de 2015. E a da Fifa está em pleno funcionamento na outra Casa legislativa. Mesmo assim, o deputado insiste em autorizar os requerimentos que pediram suas criações.

“Não é escolha minha, foram requerimentos aprovados e cabe a mim, apenas, fazer as instalações”, enfatizou. Uma vez que seu antecessor no cargo, o atual ministro do Turismo e ex-deputado Henrique Eduardo Alves, segurou o quanto pôde a instalação de várias CPIs que não eram do interesse dele.

Segundo o deputado, a CPI do Carf será criada quarta-feira, após o encerramento da CPI dos Maus-Tratos de Animais. Já a da Fifa será instalada após o encerramento da CPI do BNDES, provavelmente entre março e abril – em razão do regimento interno, que estabelece um limite máximo para a existência desse tipo de comissão na Casa.

Novos líderes

Em relação à escolha dos novos líderes na Câmara, entretanto, praticamente estão definidos (ou bem encaminhados) os nomes de várias legendas. No PT, a bancada deverá escolher ao longo da semana entre Afonso Florence (BA), Paulo Pimenta (RS) e Reginaldo Lopes (MG).

No caso do PMDB – onde a disputa é mais acirrada por causa da divisão dos parlamentares –, o partido já divulgou que só escolherá seu líder numa eleição a ser realizada no próximo dia 17. Até quarta-feira poderão ser formalizadas novas candidaturas. Até agora, estão na disputa o atual líder da legenda, Leonardo Picciani (RJ), e Hugo Motta (PB).

As demais siglas definiram da seguinte forma as suas lideranças para 2016 na Câmara: No PSDB, o escolhido foi Antonio Imbassahy (BA); no DEM, Pauderney Avelino (AM), que já ocupou o cargo anos atrás. No PSB, PR E PSD, as bancadas preferiram reconduzir os atuais líderes, respectivamente Fernando Coelho Filho (PE), Maurício Quintella Lessa (AL) e Rogério Rosso (DF).

No PDT, ficou definido o nome de Weverton Rocha (MA) para a liderança. Ainda faltam escolher seus nomes o PPS, PTB e PP, além do Psol – que costuma fazer rodízio entre seus parlamentares.