VIOLÊNCIA

Em Recife e Amaraji, polícia de Pernambuco praticou repressões ‘com ódio’ e ‘politização’

Especialistas e ativistas afirmam que as duas ações policiais promovidas na última semana demonstram sintomas de um “Estado de exceção”

Hugo Muniz
Hugo Muniz
Em Recife, Polícia Militar promoveu 'massacre' contra população, segundo ativistas; ação deixou dois homens cegos de um olho

São Paulo – A Polícia Militar de Pernambuco promoveu duas ações violentas, em apenas uma semana, contra moradores sem-terra em Amaraji, e também contra manifestantes que promoviam uma pacífica na capital Recife. De acordo com ativistas e líderes de movimentos sociais, as ações policias foram baseadas em ódio e demonstram uma politização da corporação.

No último sábado (29), a Polícia Militar de Pernambuco reprimiu com violência uma manifestação contra o presidente Jair Bolsonaro, na capital do estado. Já no dia último 25, outros 450 policiais do Batalhão Especializado de Policiamento do Interior (Bepi), do Batalhão de Choque da Polícia Militar e da cavalaria da PM usaram helicóptero, bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha para despejar 200 famílias sem-terra do Acampamento Bondade, em Amaraji, a 96 quilômetros de Recife.

Em coletiva transmitida pelo Brasil de Fato Pernambuco, nesta quinta-feira (3), especialistas e ativistas apontam que as últimas repressões foram mais graves e violentas. “A forma que a Polícia Militar agiu em Amaraji foi igual em Recife. Os policias tinham ódio, raiva, mostrando que há uma falta de comando. Já sofremos muitas reintegrações, que respeitavam ordens judiciais, mas havia muito ódio envolvido e por isso houve tanta violência agora”, relatou Jaime Amorim, coordenador do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra de Pernambuco (MST-PE).

O advogado do MST de Pernambuco, Tomas Agra, relata que a ação da polícia não foi de um despejo normal e houve uso de poder excessivo por meio da cavalaria, helicóptero e o batalhão de choque. As duas violências, segundo ele, aponta para uma ideologização dos PMs. “O sentimento de ódio, dito pelo Jaime, foi presenciado por mim, quando uma soldada da polícia me disse: ‘hoje é um ótimo dia para quem não gosta de Lula poder descontar a raiva’. Então, é uma politização da polícia que a cada dia aumenta mais”, disse.

‘Massacre’ policial em Recife

O protesto em Recife seguia pacífico pela Avenida Conde da Boa Vista e cumpria as recomendações de uso de máscaras e distanciamento entre manifestantes. Porém, ao fim da caminhada, o Batalhão de Choque interrompeu o ato com violência. Na avaliação do advogado constitucionalista Roberto Leandro, presidente da Comissão de Direito Parlamentar da OAB de Pernambuco, a Polícia Militar promoveu um “massacre”.

“No fim da manifestação, a PM bombardeou a população e disparou muitas balas de borracha. Foi um verdadeiro massacre e os resultados foram públicos: manifestantes agredidos e dois homens cegos de um dos olhos. Esse massacre durou mais de uma hora. Para além da pergunta sobre quem deu a ordem, também precisamos perguntar quem não interrompeu essa ação. Isso é um sintoma de um Estado de exceção que contraria a democracia”, questionou Leandro.

O presidente do Conselho Diretor do Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social (Cendhec), Manoel Moraes, afirma ainda que a Polícia Militar de Pernambuco não só agiu de forma desproporcional como infringiu determinações da Organização dos Estados Americanos (OEA). “Ela (polícia) não prestou socorro aos manifestantes feridos, conforme exige a OEA. O uso de armas não letais é uma discussão internacional, mas é proibido dispará-las na parte superior do corpo de manifestantes, o que foi feito. Durante o ato, os policiais estavam portando armas de fogo, o que é proibido”, denunciou.

Na avaliação de Moraes, as duas ações violentas têm o objetivo de cercear direitos da população. “Isso é para impor medo, é coisa de Estado totalitário. Não podemos sair às ruas e sermos intimidados, pois o livre direito de manifestação é básico na Constituição. A rua é expressão da liberdade, e a liberdade é expressão dos direitos humanos”, criticou.

O governador Paulo Câmara (PSB) afirmou que não houve ordens do Executivo para a truculência e, ontem (2), informou que o comandante da PM pediu exoneração. Na avaliação de Luiz Emmanuel Cunha, que coordena o programa Direito à Cidade do Cendhec, a informação de insubordinação policial preocupa. “A polícia se mostra um braço armado que age de forma independente. O governador precisa mostrar que controla a PM, pois ela não pode ser uma arma de intimidação política ou para constranger o direito à terra.”


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