intolerância política

Quando a produção de ódio é um dos alicerces da operação

Para o cientista político Aldo Fornazieri, a Lava Jato toma medidas unilaterais, age contra apenas um dos lados da disputa política e tem a produção de intolerância como alicerce

Vitor teixeira/Facebook

Fornazieri: “Clima de ódio é estimulado pelo MP, o juiz federal Sérgio Moro e por setores da mídia”

São Paulo – A instalação de um ambiente favorável ao sentimento de justiçamento pelos leigos é uma das estratégias assumidas pelos idealizadores e condutores da Operação Lava Jato. Porém, para o cientista político Aldo Fornazieri, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fespsp), o processo está sendo disseminador de intolerância política, incitada pela mídia tradicional e por agentes do Poder Judiciário.

Segundo o professor, o discurso de ódio ganhou mais força no ano passado, por meio da oposição e dos grupos de extrema-direita que emergiram. “Esse clima de ódio vem sendo estimulado pelo Ministério Público, pela Polícia Federal, pelo juiz federal Sergio Moro e, principalmente, por setores da mídia.”

Fornazieri avalia que a investigação toma medidas unilaterais e age contra apenas um dos lados da disputa política, no caso, o PT. “À medida que a Lava Jato se conduziu, contribuiu para pressionar a sociedade, para que adotasse essas medidas de intolerância verbal e que chega à violência física.”

O cientista político analisa que a radicalização do discurso fragiliza o Estado de direito. “A democracia já está em xeque”, complementa. Para ele, é necessário que haja uma reação do governo para “enfrentar o golpismo”.

Quando a intolerância política ganhou força no Brasil?

Na era do varguismo, nós tivemos alguns graus de intolerância. Porém, a partir da ascensão da União Democrática Nacional (UDN), houve maiores práticas de intolerância política. Mas a intolerância política mais efetiva, mais evidente, ocorreu no regime militar, quando houve violência física politicamente orientada contra os opositores do regime.

Como o sr. avalia a intolerância pós-eleição de 2014?

No meu ponto de vista, a intolerância que ocorre hoje começou na campanha eleitoral de 2014. Eu acredito que houve excesso dos dois lados, tanto do governo, quanto da oposição. Porém, a partir de 2015 nós tivemos uma acentuada militância política intolerante por parte dos grupos de extrema-direita, que emergiram, que são aqueles que pedem a volta dos militares, os grupos ligados ao deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) e a cúpula de oposição.

Essa intolerância vem sendo estimulada tanto pela mídia, que criou um clima de linchamento moral contra o PT, contra quem apoia o governo e o ex-presidente Lula. Esse clima também é estimulado pela Operação Lava Jato que começou a tomar medidas politicamente orientadas no sentido de exercer uma ação contra apenas um dos lados da disputa política, quebrando regras do Estado democrático e o princípio sagrado da democracia, o de isonomia. à medida que a operação se conduziu de forma unilateral ela contribuiu para pressionar a sociedade, para que adotasse essas medidas de intolerância verbal e que chega à violência física.

Mas o discurso de ódio é dirigido somente ao PT…

Eu acredito que haja um discurso de ódio contra o PT. Quando o coordenador jurídico do PSDB, Carlos Sampaio, age no sentido de banir o PT da política brasileira, ele estimula um clima de ódio que se dissemina cada vez mais forte na sociedade.

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Aldo Fornazieri é cientista político e professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo

Pode-se dizer que esse discurso está inserido em alguns setores da mídia?

A mídia vem estimulando há tempos esse discurso, criando um clima de linchamento moral. Ela se estabeleceu como o juiz da verdade e prejulga as pessoas que nem sequer ainda foram julgadas. A mídia vem de fato sendo a ponta de lança desse clima de linchamento moral que se faz contra o PT e os simpatizantes do governo Lula.

Essa intolerância resulta de incertezas sobre convicções políticas?

Na verdade, muitas vezes a intolerância funde as incertezas em ódio. Toda a intolerância tem como fundamento o exercício do ódio, independente da avaliação que a pessoa faz se está certa ou errada. O que a motiva é o ódio, puro e simples. Esse clima de ódio vem sendo estimulado pelo Ministério Público, pela Polícia Federal, pelo juiz federal Sérgio Moro e, principalmente, por setores da mídia.

Como é possível combater a intolerância?

Eu acho que tem que reagir. Quando o regime nazista e fascista se fortaleceram, não foi porque encontraram um caminho fácil para chegar ao poder, e sim, porque ninguém resistiu a eles. Eu entendo que a melhor forma de combater esse tipo de prática é reagir a ela.

Esses grupos (intolerantes) fazem uso das liberdades democráticas para violar essas liberdades democráticas. Isso deve ser contido. Os valores da democracia e do Estado de direito têm que prevalecer. Sem resistir de forma efetiva a eles, certamente, quem vai perder essa batalha é a democracia.

Qual a ameaça desse discurso para a democracia?

A democracia se funde em um Estado de direito que tem determinados valores, como princípio da garantia de direitos fundamentais da pessoa humana, da solidariedade, igualdade, justiça, liberdade etc. Essas práticas intolerantes agridem tudo isso. A democracia brasileira está em xeque por causa desse lado político e jurídico, mas também porque temos uma agenda conservadora que visa a agredir os direitos conquistados pelas minorias a duras penas.

A reação democrática tem que ser efetiva. Não é oferecendo buquês de flores a esses que praticam a violência verbal que você vai contê-los, eles merecem uma resposta à altura. Não dá para brincar de democracia.

Qual quadro o sr. enxerga com uma eventual eleição de outro governo do PT em 2018?

Eu acho que seria especulação falar sobre isso. Nós não podemos falar disso agora, porque temos uma crise em curso. Temos um governo que não governa. Temos uma oposição golpista. Ninguém quer sentar à mesa para dialogar. Vamos deixar 2018 para 2018.

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