Repressão

Para prender ativistas, polícia mobilizou megaoperação no Rio

Advogados questionam erros graves da ação, como casos de pessoas detidas sem acusação e menor não emancipada responsabilizada por ser dona de uma casa

Taylor Barnes

Entre os materiais apreendidos pela polícia do Rio, uma garrafa com material que “parece gasolina”, edições do jornal Estudantes do Povo, coletes de imprensa e máscaras de gás

São Paulo – Chamada de “Firewall 2″, a operação executada ontem (12) pela Polícia Civil do Rio de Janeiro foi conduzida pela Delegacia de Repressão a Crimes de Informática e prendeu 28 pessoas, na véspera da final da Copa do Mundo. Foram mobilizadas 25 delegacias, 80 policiais e uma aeronave e há informações de que mais pessoas, ainda não identificadas, também serão presas preventivamente nos próximos dias.

Em entrevista coletiva na tarde deste sábado, o delegado Fernando Veloso, chefe da Polícia Civil, alegou que as pessoas presas estavam se mobilizando “de forma clara” para organizar atos de violência, indicando que participavam de movimentos como Organização Anarquista Terra e Liberdade (OATL), Frente Independente Popular (FIP), Movimento Estudantil Popular Revolucionário (MEPR), Anonymous e Black Bloc. Entre elas, está a ativista Elisa Quadros (Sininho), presa em Porto Alegre. Segundo o advogado que a defende, Elisa é acusada de ser chefe de quadrilha armada.

Houve também prisão em flagrante, por terem encontrado na casa dos acusados materiais como máscaras de gás e bandeiras. Além das pessoas presas, há 16 que foram detidas para averiguação, por estarem na casa dos presos no momento da detenção ou por serem vizinhas. Elas foram levadas sem mandado ou sem qualquer acusação. Todos os mandados cumpridos ontem foram expedidos pela 27ª Vara Criminal do Rio de Janeiro.

Do lado de fora da Cidade da Polícia, para onde foram levados os acusados, midialivristas, familiares e outros ativistas prestaram apoio aos presos desde cedo.

Questionável

Entre os materiais apreendidos pela Polícia Civil durante o cumprimento dos mandados, há uma arma de fogo, mas ela pertence ao pai de uma adolescente apreendida. O homem tem posse legal da arma. A informação é de que a posse estaria fora de validade. Ainda assim, a arma não pode ser considerada ilegal no inquérito.

Advogados alegam que a inspetora policial que fez a apreensão ignorava o fato de a menina apreendida ter 16 anos e não ser emancipada. Ela responsabilizou a menor de idade pela posse da arma, considerando que a adolescente seria dona da casa.

Delegados confirmaram que a operação da Polícia Civil começou em setembro do ano passado e que os mandados foram expedidos na sexta-feira (11) e cumpridos ontem. Os números são de 28 mandatos de prisão, dois de apreensão (por serem destinados a menores de idade) e três prisões em flagrante. Todos são temporários, têm duração de cinco dias e já foram cumpridos, mas algumas pessoas ainda não foram encontradas.

As alegações são de associação criminosa por atos de violência e se enquadram no artigo 288, que prevê de 1 a 3 anos de prisão. No entanto, os movimentos garantem que não existe, até o momento, nenhum tipo de prova que confirme a associação entre os presos – advogados, professores das redes municipal e estadual, e da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), midialivristas e uma radialista da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

Segundo o Instituto de Defensores de Direitos Humanos (DDH), “as prisões provisórias baseiam-se supostamente em informações obtidas por quebra de sigilo telefônico, informática e telemática.”

O DDH denunciou, em nota, que o poder Judiciário do Rio de Janeiro tomou uma “decisão antidemocrática e arbitrária” pela prisão de manifestantes à véspera da final da Copa do Mundo e a “intenção política” para inibir protestos. O Instituto diz, também, que “nítida é a intenção política de inibir protestos no último dia do evento.”

“Prova disso é que entre policiais e soldados o governo reserva 26 mil homens para fazer segurança da final da Copa. Advogados do DDH e de outros coletivos estão na Cidade da Polícia prestando assessoria jurídica aos manifestantes presos. Ninguém ficará para trás”, afirma o texto do DDH.

“A transferência para o Complexo Penitenciário de Bangu pode se dar ainda hoje. Dia no qual Defensoria Pública, Legislativo e outros órgãos do Estado que poderiam atuar contra esta arbitrariedade estão em regime de plantão, dificultando sua atuação. Fatos que, somados ao curto prazo de prisão, evidenciam o propósito único de neutralizar, reprimir e amedrontar aqueles e aquelas que têm feito da presença na rua uma das suas formas de expressão e luta por justiça social”, enfatiza nota, também publicada ontem, da ONG de Direitos Humanos Justiça Global.

Para o Movimento Passe Livre (MPL), “a ação absurda do Estado é para tentar reprimir a luta social no Rio de Janeiro.” O MPL considera que “o objetivo imediato dessa ação, tão ilegal e arbitrária como várias outras que acontecem no país desde os protestos que começaram em junho do ano passado, parece ser intimidar e amedrontar as pessoas dispostas a participar dos protestos que estão sendo convocados para o dia da partida final da Copa do Mundo, no Maracanã.”

“Para isso, está sendo utilizada a legislação de exceção aprovada aos níveis federal e estadual desde o ano passado. Legislação condenada como atentado ao Estado de Direito por entidades e organizações defensoras dos Direitos Humanos de todo o mundo, incluindo a OAB e a Anistia Internacional”, argumenta o MPL.

Neste domingo (13), há dois atos contra a Copa programados pelas redes sociais no Rio. A concentração do ato organizado pelo Comitê Popular da Copa será às 10h, na Praça Afonso Pena, na Tijuca, zona norte da capital fluminense. A final está marcada para as 16h, no Estádio do Maracanã, entre Alemanha e Argentina. O comitê tem ido às ruas desde antes do início do torneio. Entre as reivindicações do grupo, estão o fim dos despejos e remoções forçadas, a desmilitarização das polícias e democratização dos meios de comunicação.

Também no Rio de Janeiro, a Frente Independente Popular convoca, pelo Facebook, a Grande Manifestação Fifa Go Home! Não vai ter final!, com concentração às 13h, na Praça Saens Peña, também na Tijuca. O ato será contra os gastos públicos com a Copa, as remoções, a opressão de gênero e raça e segregação nos estádios.

Na mesma hora e local, a Associação de Defesa da Favela Chapéu Mangueira se juntará ao protesto, com o slogan A Festa Nos Estádios Não Vale as Lágrimas Nas Favelas, contra a opressão histórica nas comunidades faveladas.

Com informações da Agência Brasil e Coletivo Rio na Rua

 

 

 

 

 

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