Pauta Travada

Sem ‘clima’, Câmara de São Paulo volta a adiar debate sobre o Plano Diretor

Proposta tramita há seis meses na Casa e passou por 62 audiências públicas organizadas pelo parlamento. Acordo para votação parece distante de ocorrer

Rafael Rigues

Plano Diretor vai regrar a organização da cidade pelos próximos 16 anos e esbarra em diversos interesses

São Paulo – A segunda votação do novo Plano Diretor Estratégico (PDE) de São Paulo está emperrada na Câmara Municipal: o clima é pesado na casa e pelo menos quatro projetos substitutivos, textos que podem tomar o lugar da versão atual, podem disputar o voto dos parlamentares na próxima semana. Na manhã de hoje (18), em sessão extraordinária, não ocorreu nem mesmo discussão sobre a proposta mais recente de redação, apresentada ontem (17) pelo vereador Nabil Bonduki (PT) no Diário Oficial da Cidade de São Paulo, e que conta com o apoio do prefeito Fernando Haddad (PT). Esse procedimento é obrigatório pelo Regimento Interno da Câmara e, sem isso, não há votação.

A sessão de hoje foi suspensa logo no início e, em seguida, encerrada por falta de quórum. O clima parece ter pesado entre os vereadores quando o assunto é o PDE: o diálogo sobre o Plano Diretor é curto, seco, sem muitas voltas; clima muito diferente do que havia logo após a aprovação do texto na Comissão de Política Urbana da Câmara, quando até a oposição disse que considerava o projeto bom e falava em “detalhes” a serem acertados para construir consenso.

Os líderes do PMDB, Ricardo Nunes, e do PTB, Paulo Frange, estão fechados com a proposta do PT, e seguem afirmando que só há “detalhes” a discutir. Já os vereadores Andrea Matarazzo (PSDB), José Police Neto (PSD) e Gilberto Natalini (PV) apresentaram propostas inteiramente novas, que podem vir a substituir o texto atual se o plenário assim o decidir.

Para Police Neto, a principal questão é que o PDE não define o cálculo da outorga onerosa, taxa cobrada de empreendedores para construir acima do limite mínimo permitido em determinadas regiões. O vereador protesta ainda pela ausência das descrições dos mapas que definem as macroáreas entre as quais a cidade é dividida pelo Plano Diretor. O vereador deve protocolar o projeto na próxima segunda-feira (23).

Já a bancada tucana também acrescentou emendas que o bloco pretende aprovar e que não encontraram consenso com a base governista. Para Matarazzo, o plano está sendo excessivamente detalhado, quando certas questões deveriam ser tratadas nos planos regionais e de bairros. “Nosso substitutivo trata a cidade como é na realidade. O adensamento dos eixos de mobilidade, por exemplo, seria tratado somente nos planos regionais. Assim como a questão do tamanho dos prédios no miolo dos bairros”, explicou.

No mesmo espírito, o vereador Natalini propôs um novo texto para o Plano Diretor que adia muitas das diretrizes definidas no projeto atual para depois, à ocasião da revisão da Lei de Uso e Ocupação do Solo. Criticado por Bonduki por não ter participado das mais de 150 audiências públicas realizadas sobre o assunto pelos poderes Executivo e Legislativo, 62 delas apenas pela Câmara, o vereador do PV admite que montou o texto com um grupo de arquitetos contratados pelo seu gabinete.

Apesar da polêmica, o texto em discussão sofreu poucas alterações em relação ao que foi aprovado em primeira votação pela Câmara. Entre as mudanças, definiu, por exemplo, que ao menos 30% dos recursos do Fundo de Desenvolvimento Urbano (Fundurb) será destinado para projetos de mobilidade do transporte coletivo e não-motorizado. Além desses, outros 30% já estavam destinados à construção de habitações de interesse social para famílias que ganham entre zero e seis salários mínimos. O texto de Bonduki inclui ainda a proposta de criação de um fundo municipal para financiar a criação e a preservação de parques públicos e áreas verdes, além de retirar a altura limite de oito andares ou 25 metros para prédios construídos fora dos eixos de mobilidade.

Relator da proposta atual, Bonduki evitou comentar os textos sugeridos pelos demais, comentando apenas que se trata “do processo legislativo”, mas espera conseguir votar na próxima semana. Caso sejam mesmo apresentados, os substitutivos são colocados em votação primeiro e, se aprovados, tiram o substitutivo de Bonduki da pauta.

Apesar de fugir das rusgas parlamentares, Bonduki respondeu às críticas feitas pelo presidente do Sindicato da Habitação, Cláudio Bernardes, de que o novo plano iria encarecer empreendimentos na cidade e poderia levar as construtoras a realizar novas obras fora da capital paulista. O principal problema, apontado por Bernardes, seria o encarecimento da outorga onerosa e a limitação do tamanho dos empreendimentos no miolo dos bairros. Mas o setor também não se agrada da proposta de cota de solidariedade.

“Ele está no legítimo direito de defender o setor dele. Vai haver um encarecimento da outorga, isso é claro. Mas a intenção disso é que haja uma contrapartida das construtoras para a cidade de São Paulo. E eu vejo que o setor tem condições sim de pagar esse aumento, inclusive porque eles também se beneficiam da cidade”, afirmou Bonduki. Para o vereador, não há motivo para as empreiteiras atuarem em outras cidades, onde a infraestrutura é inferior a da capital. “Muita gente quer morar aqui, quer trabalhar em São Paulo, então, se algumas empresas saírem, outras certamente vão ocupar esses lugares”, completou.

Alguns pontos polêmicos, como a instalação de um aeroporto em Parelheiros e a definição das Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis) da área da ocupação Copa do Povo, do MTST, na zona leste de São Paulo, continuam de fora do texto. Também seguem sem alteração a ampliação das Zeis, que aumentaram 20% em relação ao plano anterior, e a criação da cota de solidariedade, que determina a construção de Habitações de Interesse Social em um percentual equivalente a 10% dos empreendimentos com área superior a 20 mil metros quadrados, como contrapartida.

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