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Empresas envolvidas em cartel e corrupção continuam operando no Metrô e na CPTM

Presidente da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos diz que denúncias não impedem companhias de participar de novos processos licitatórios

alesp/divulgação

Depoimento do presidente da CPTM (à esquerda) durou quatro horas

São Paulo – As denúncias de formação de cartel, pagamento de propina e corrupção no Metrô e na CPTM, envolvendo sucessivas gestões do PSDB no governo de São Paulo, não são suficientes para impedir as empresas envolvidas de participar e ganhar novas licitações, segundo afirmou ontem o presidente da CPTM, Mário Manuel Seabra Rodrigues Bandeira, durante depoimento de mais de mais de quatro horas na Comissão de Infraestrutura da Assembleia Legislativa do estado.

As participantes do conluio denunciado pela multinacional alemã Siemens no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) têm, segundo ele, direito legal de participar de novas concorrências.

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“As denúncias e o acordo de leniência não impedem as empresas de participar de novas licitações. Se impedirmos, eles iriam à justiça e conseguiriam o direito de participar”, justificou. “A própria Siemens ganhou duas licitações de energia para subestação e seccionamento da CPTM.”

As suspeitas de que as empresas continuam a operar o cartel seriam evidenciadas, segundo os deputados da oposição na comissão, pelo recente processo de concorrência para a compra de 65 trens pela CPTM, por meio de licitação aberta em março de 2013. Dividida em dois lotes, a concorrência foi vencida pelo consórcio Iesa-Hyundai Rotem (lote 1) e pela espanhola CAF (lote 2).

Segundo reportagem publicada no blog Viomundo, exibida no telão da audiência da Comissão de Infraestrutura a pedido do deputado Adriano Diogo (PT), coincidentemente a CAF foi a segunda colocada do lote 1 e o consórcio Iesa-Hyundai Rotem o segundo do lote 2.

Os contratos de ambos os lotes domam R$ 1,8 bilhão. Em setembro de 2012, concorrência para aquisição dos mesmos 65 trens foi declarada deserta (sem vencedores). Na ocasião, os mesmos dois lotes tinham preço de referência de R$ 1,58 bilhão.

Além disso, na concorrência de 2013, os trens do lote 1 saíram por R$ 28,89 milhões a unidade, enquanto no lote 2 o preço foi de R$ 26,27 milhões – R$ 2,62 milhões mais caros cada trem.

“Estratégias comerciais”

No depoimento do presidente da CPTM, Adriano Diogo quis saber o porquê das diferenças entre os preços de 2012 e 2013, assim como entre os preços dos trens dos lotes 1 e 2 de 2013.

Bandeira disse que, no segundo caso, a diferença se deve a “estratégias comerciais”. “Provavelmente, a Iesa [empresa que atua em planta industrial da antiga Villares, em Araraquara] queria ganhar um lote e para isso foi mais agressiva no preço [cobrando mais barato], e em outra subiu um pouco o preço.”

Em agosto de 2011, a  Iesa, em parceria com a japonesa Hitachi, assinou memorando de entendimento para a construção de uma fábrica de monotrilhos, trens urbanos e interurbanos em Araraquara (interior de São Paulo). Na ocasião, participaram da cerimônia de assinatura o governador Geraldo Alckmin e o prefeito de Araraquara, Marcelo Barbieri (PMDB), reeleito em 2012.

“As licitações recentes, principalmente essa, da compra dos 65 trens, mostra que um possível cartel continua atuando. É o mesmo produto com preços diferentes. E as empresas suspeitas de participar do cartel [denunciado pela Siemens] continuam participando de novas licitações, seja no fornecimento de trens, seja na participação da Linha 13, até Guarulhos”, disse o presidente da Comissão de Infraestrutura, deputado Alencar Santana Braga (PT).

Para o deputado João Paulo Rillo (PT), não há como funcionários de alto escalão ignorarem a situação. “Está claro que o governador sabia”, disse. Os deputados da oposição consideram impossível que um cartel pudesse operar por vários anos [que, segundo a denúncia da Siemens ao Cade, foi de 2005 a 2008] sem que as autoridades do Estado ficassem sabendo.

Para a deputada Beth Sahão (PT), o presidente da CPTM não respondeu essa questão. “Ele não consegue nos convencer de que todo esse cartel, esses desvios que se tem apontado, não têm a participação de funcionários da CPTM. Não podemos acreditar nisso.”

Mário Manuel Seabra Rodrigues Bandeira é objeto de ação civil movida pelo Ministério Público por improbidade administrativa em processo em que respondem ainda a Alstom Hidro Energia Brasil, a Alstom Brasil Energia e Transporte, a CAF Brasil e a Bombardier Transportation Brasil Ltda.

O motivo é um contrato assinado em janeiro de 1995 para fornecimento de 30 trens num prazo de 12 meses. Dez anos depois, a CPTM, então presidida por Rodrigues Bandeira, incluiu no contrato o aditamento número 6, permitindo uma nova compra de trens, sem licitação.

Bandeira trabalhou como presidente da CPTM entre 2003 e 2006 e de 2011 até agora. “Nunca recebi nenhum tipo de propina em 41 anos de vida pública. Sou criticado no mercado por ser extremamente duro nos processos de negociação”, disse.

Para o líder do governo na Assembleia, deputado Barros Munhoz (PSDB), as tentativas de apuração das denúncias, a audiência com o presidente da CPTM e a insistência da oposição em criar uma CPI são “papagaiada” e “política”. Ele voltou a dizer que CPI não apura nada e é instrumento político da oposição.

Os deputados Orlando Morando (PSDB), Alex Manente (PPS) e Dilador Borges (PSDB) tentaram, durante as mais de quatro horas da reunião do colegiado, usar de estratégias regimentais e intervenções para interromper o andamento da audiência.

Embora estivesse presente em alguns momentos do depoimento, o líder Barros Munhoz não interveio nos trabalhos. Campos Machado (PTB) fez uma intervenção, mas acatou a decisão do presidente da comissão, Alencar Santana, de continuar o depoimento.

Essa postura até certo ponto omissa dos principais líderes de Alckmin, deixando a defesa dos presidentes do Metrô, Luiz Antonio Carvalho Pacheco, na semana passada, e da CPTM, ontem, a cargo de deputados do baixo clero e com pouco poder de fogo, é interpretada nos bastidores da Assembleia como um sinal de que Alckmin poderia não estar tão interessado na defesa dos comandantes das duas grandes empresas de transportes de seu governo.

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