Articulações

Mesmo após desmentido, parlamentares pedem, nos bastidores, reforma ministerial

Deputados e senadores incluíram no debate do dia a importância de o Executivo começar a ver como positiva a troca de cadeiras. Lista vai de Ideli e Gleisi a Moreira Franco e Helena Chagas

Antônio Cruz/Arquivo ABr

Ideli, pressionada, foi colocada por Dilma à frente de uma articulação importante

 

Brasília Nem bem abriram os trabalhos para votações no Congresso, deputados e senadores começaram a semana discutindo a necessidade de mudança na estratégia do governo e de realização de uma reforma ministerial para já. O debate sobre esse tema foi observado ontem tanto no anúncio do programa Mais Médicos, lançado no Palácio do Planalto, como nas discussões sobre o assunto mais comentado: a utilização de uma base de espionagem de satélites dos Estados Unidos no país.

A troca de ministros passou a ser questionada e solicitada depois da conversa mantida na última sexta-feira entre a presidenta Dilma Rousseff e um grupo de deputados do PT. A repercussão desse pedido implícito dos parlamentares levou, no final de semana, à divulgação de uma nota por parte da presidenta dizendo que não pretende fazer mudanças no seu ministério. As críticas são direcionadas aos ministros Ideli Salvatti (das Relações Institucionais), Gleisi Hoffmann (Casa Civil), Guido Mantega (Fazenda) e Helena Chagas (Comunicação).

Em relação a Ideli Salvatti, os comentários eram de que a ministra estaria desconfortável no cargo e sem condições de fazer boas articulações com os parlamentares, o que já tem sido observado por meio do remanejamento de tarefas da sua pasta para outros ministros, como Aloizio Mercadante (Educação) e José Eduardo Cardozo (Justiça). Um líder da base aliada chegou a dar como certo, inclusive, que Salvatti poderia entregar o cargo nas próximas duas semanas, porque além da baixa performance, também estaria chateada com a interferência de Mercadante. O papel do paulista como interlocutor preferencial de Dilma com o mundo externo ao Planalto chega também à Casa Civil.

“O fato do Aloizio Mercadante ficar o tempo todo na articulação política deixa o Ministério da Educação, tão importante para o país, sem um interlocutor, o que não pode acontecer. É preciso a presidenta resolver logo isso, e formalizar a posição do ministro Mercadante e nomear um novo ministro para a Educação. Eu acho que ele (Mercadante) é capaz para ocupar qualquer ministério. Só não é capaz de ocupar todos os ministérios ao mesmo tempo, sem falar que isso enfraquece o trabalho das ministras Ideli e Gleisi”, avalia o senador Cristovam Buarque (PDT-DF).

Marco civil da internet

Mas com a crise de invasão da soberania nacional instalada pela denúncia de que os Estados Unidos mantiveram, no Brasil, um escritório para monitorar mensagens e ligações no país, a ministra retomou os trabalhos como se a crise do fim de semana tivesse sido resolvida. Coube a ela conversar com o vice-presidente Michel Temer (PMDB) e o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e trabalhar para que seja votado, dentro das matérias em pauta para apreciação mais célere esta semana, o projeto que trata do Marco Civil da Internet – que vinha sendo tocado pelo Ministério das Comunicações.

O texto estabelece direitos e deveres dos usuários, provedores de acesso e de conteúdo da internet. A ministra deixou claro que o governo pretende apoiar o projeto e quer vê-lo votado rapidamente, uma vez que entrou e saiu do plenário da Câmara por cinco vezes. “É importante termos uma resposta pronta da parte do Congresso Nacional. Consideramos inadmissível a violação da soberania e privacidade dos cidadãos brasileiros nesse momento”, afirmou.

Ao pedir pela aprovação do projeto, Ideli Salvatti voltou a ser colocada pelo Planalto no centro de uma questão mais do que importante para o país: a exigência de que a guarda destas informações só possa ser feita no Brasil. “Dada a gravidade da situação criada, é de muita importância que todos, os órgãos internacionais que representam o Brasil e os órgãos de investigação, possamos ter, também da parte do Congresso Nacional, uma resposta muito pronta”, acentuou.

Inflexibilidade e retorno

Já quanto a Gleisi Hoffmann, as queixas são mais relacionadas a questões interpretadas como atitudes de inflexibilidade. Os deputados criticaram a crise provocada pelas falhas na demarcação das terras indígenas pela Funai, que atribuem ao que chamaram de “trapalhada” da ministra a demora no retorno dos pedidos feitos à sua pasta por parlamentares e o fato de vários dos assuntos mencionados por eles serem objeto de constantes relatórios. “Pedir relatório é correto, mas ministros precisam ter mais agilidade. Por mais que seja preciso analisar todos os itens com seriedade e precisão, os assuntos mais técnicos têm que ser repassados para os outros ministérios. O cargo ocupado por ela (Hoffmann) exige outro timing e maior capacidade de entendimento”, disse o presidente de um dos partidos aliados do governo.

Ficariam preservados, segundo deputados do PT, os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Helena Chagas (Comunicação), também bombardeados. Mantega seria mantido como um ministro do qual a presidenta estaria irredutível em abrir mão. Dilma Rousseff, segundo teriam conversado após a reunião da sexta-feira, considera que a saída enfraqueceria ainda mais o governo e passaria a percepção de uma economia sem rumo. E Helena Chagas seria mantida porque, apesar da falta de comunicação no governo, tanto a presidenta como seus aliados mais diretos, incluindo Gilberto Carvalho (secretário-geral da Presidência), acham que o problema não foi de uma única pasta, mas de todos os ministérios e da articulação do governo como um todo com as organizações sociais.

Obras nos aeroportos

Outra discussão mencionada entre os parlamentares é a posição do ministro Moreira Franco, secretário de Aviação Civil. Da cota do PMDB, Moreira Franco há tempos não agrada ao Palácio do Planalto, mas mexer na pasta dele hoje poderia provocar um estrago ainda maior no relacionamento com os peemedebistas, que já está mais do que estremecido. A avaliação feita entre as lideranças, no entanto, é de que existiria uma clara falta de sintonia entre o ministro e o Executivo.

É Moreira Franco um dos principais responsáveis pelo projeto de recuperação e reforma dos aeroportos dentro da preparação para a Copa do Mundo, que apresentou várias falhas. O ministro teria demonstrado irritação com outras áreas do governo e dito publicamente que não estariam atendendo aos projetos da sua pasta da forma desejada. Além disso, foi voz destoante da reunião ministerial realizada na última semana. Cortado pela presidenta em uma das suas colocações, teria saído do encontro chateado e chegou a declarar, dias depois, em encontro da Associação Brasileira de Consultores de Engenharia (ABCE), que o governo “não deveria perder tempo com sugestões para plebiscito ou referendo” – o que chegou aos ouvidos do Planalto.

Sua saída seria uma forma também de mostrar mais vigor nas obras dos aeroportos, sobretudo dentro dos projetos de mobilidade urbana, que envolvem investimentos de R$ 50 bilhões, em um pacote que está previsto para ser lançado nos próximos dias (ainda sem data definida). Mas há dúvidas se será concretizada ou não.

Sobre a possibilidade de mudança ou não dos ministros, pesa também a importância de consolidação da mensagem do governo ao Congresso para aprovação da realização do plebiscito – tida como emblemática para o projeto do Executivo. E, principalmente, o fato de começarem a ser reforçadas as articulações com vistas às eleições para 2014 em todos os estados. Enquanto até junho o que se discutia era onde o PT e o PMDB ou outros partidos da base aceitariam ou não abrir mão de cabeças de chapa, o que é observado agora é se os partidos que compõem a base do governo votarão com a presidenta Dilma nas próximas eleições.

“A reforma política não vai acontecer se não houver melhoria da articulação política do governo. É preciso uma reforma ministerial, principalmente depois da queda de pontos na pesquisa. Não é questão de redução de ministérios, como tem se falado nos últimos dias, mas de troca de nomes. Precisamos fazer uma atualização em algumas áreas”, afirmou o deputado Fernando Ferro (PT-PE).

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