Para professora, ‘moral sexual’ deve pautar busca pelo voto religioso em SP

Especialista da UFRJ vê segundo turno com 'muita necessidade de acordo' entre candidatos e grupos evangélicos e católicos

São Paulo – Especialista em questões que envolvem religião e política, a professora Maria das Dores Campos Machado, da Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirma que tanto José Serra (PSDB) quanto Fernando Haddad (PT) terão inevitavelmente de correr atrás do voto religioso no segundo turno das eleições paulistanas. E vê o petista em desvantagem nesse campo, principalmente entre evangélicos. 

Ela acredita que, a partir de agora, haverá a exploração de questões sensíveis aos grupos pentecostais, como o chamado “Kit Gay” (material didático desenvolvido para combater a homofobia nas escolas públicas), obrigando o PT a fazer concessões no discurso. Para a professora, será necessária uma política de trocas muito efetiva e trabalhosa para conquistar apoios.

“Os evangélicos são pragmáticos e assimilaram muito bem a cultura política brasileira de alianças e fisiologismo. Tanto no sentido positivo quanto no negativo. Então será um segundo turno com muita necessidade de acordos, inclusive por parte do PT, em temas considerados caros aos evangélicos, como a moral sexual”, diz Maria das Dores.

No campo católico, a professora também vê mais dificuldades para o PT. De um lado, os grupos tradicionalmente simpáticos ao partido, pela Teologia da Libertação, perderam força. De outro, os carismáticos tem fortes ligações com governador Geraldo Alckmin (PSDB).

Ela ressalta, porém, que nem evangélicos nem católicos têm potencial para, sozinhos, decidir eleições. O apoio ou não desses grupos é importante, mas deve ser somado a outros fatores. Ela cita como exemplo a candidatura Celso Russomanno (PRB), identificada com parte do eleitorado evangélico por conta dos pastores da Igreja Universal do Reino de Deus que estão na direção de seu partido.

“O apoio da Igreja Universal é importante, pois ela tem a Rede Record e uma forte penetração nas camadas populares. Mesmo assim, a Universal vem perdendo fiéis. Ou seja, pode dar-lhe espaço, inserção, mas não pode, como ficou demonstrado, definir a eleição”, analisa.

De acordo com a professora, José Serra (PSDB) e Gabriel Chalita (PMDB) também tinham apelo religioso. O primeiro da Assembleia de Deus e grupos menores; o segundo da Renovação Carismática católica. Ela lembrou que o crescimento de Chalita nas pesquisas de intenção de voto se deu após a reação da igreja Católica, que começou a se posicionar firmemente sobre a eleição há algumas semanas. Mesmo assim, o candidato ficou apenas na quarta posição.

Incômodo

Para Maria das Dores, a participação religiosa na política não é novidade. A diferença é que isso, antes era feito apenas pelos católicos. 

“Nos últimos 30 anos, observando a fundação PT e de outros movimentos sociais, sempre houve muita vinculação à igreja Católica, por exemplo, com as Comunidades Eclesiais de Base, e essa movimentação não era analisada pela sociedade”, diz. Segundo ela, o que ocorre agora é um incômodo com o surgimento de um grupo minoritário, que vem assumindo uma postura de protagonismo.

“Existe uma forte mobilização dos evangélicos para ocupar um espaço que antes era ocupado quase que naturalmente pelos católicos. E eles tendem a continuar crescendo, ocupando espaços, mobilizando. Agora, a importância que eles efetivamente terão depende da capacidade que os demais movimentos e instituições terão em demarcar seus espaços. Os pentecostais foram apolíticos até os anos 1980. Hoje o discurso deles é que a política, sobretudo o Legislativo, é fundamental, inclusive para a sobrevivência do grupo na sociedade brasileira”, explica Maria das Dores.