Visões

Distância tecnológica entre Brasil e China deve se alargar e virar abismo

"Em vez de investir mais em educação e ciência e tecnologia, estamos desmontando nossa estrutura. É um crime, de uma proporção que as pessoas não estão se dando conta", diz Milton Pomar

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China lidera ranking internacional de respeito aos professores, enquanto o Brasil ocupa o último lugar

São Paulo – O governo chinês anunciou na última segunda-feira (23) que todas as áreas urbanas das cidades daquele país deverão contar com internet celular 5G até o final de 2020. Serão 126.000 estações instaladas pelo território chinês. A nova tecnologia deve desembarcar no Brasil também no ano que vem, mas a expansão da cobertura deverá ocorrer a passos muito mais lentos. Segundo o geógrafo Vladimir Milton Pomar, analista de relações internacionais especializado em China –que é a segunda maior economia do mundo –, a distância entre o desenvolvimento chinês e o brasileiro, que já era grande, está virando “um abismo” e tende a se ampliar nos próximos anos. A diferença, segundo ele, é o papel estratégico que o gigante asiático atribui à educação.

Em 2018, o país os chineses ficaram em primeiro lugar no ranking do Programa Internacional de Estudantes (Pisa), da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Pelo décimo ano consecutivo, a China também é o país que mais envia estudantes universitários para o exterior.

Ele criticou os governos Temer e Bolsonaro pelo desmantelamento do programa Ciência Sem Fronteiras, criado pelo governo Dilma em 2011, com o objetivo de estimular o intercâmbio de estudantes brasileiros no exterior. “Estamos fadados a aumentar muito a distância entre o desenvolvimento da América Latina, particularmente o Brasil, e o desenvolvimento da Ásia, e principalmente da China – ainda mais depois dessa desgraça que se abateu sobre o Brasil em forma de presidente”, afirmou, em referência a Jair Bolsonaro. Ele foi entrevistado pela jornalista Marilu Cabañas, no Jornal Brasil Atual, nesta sexta-feira (27).

“Em vez de investir mais em educação e ciência e tecnologia, estamos desmontando toda a estrutura de institutos federais, universidades e investimentos em pesquisa, enquanto o mundo avança. É um crime que está sendo cometido, de uma proporção que as pessoas não estão se dando conta”, disse Pomar.

O resultado dessa discrepância, segundo ele, é que a maioria das exportações brasileiras para a China é composta de produtos primários (agrícolas e minerais), enquanto importamos massivamente produtos industrializados de alta tecnologia. A China também lidera o Índice Global de Status de Professores (GTSI), elaborado pelo Pisa, enquanto que o Brasil ficou em último, entre 35 países. A situação é agravada, segundo Pomar, por conta da atuação do ministro da Educação, Abraham Weintraub, que se destacou por agredir a comunidade acadêmica.

A questão não envolve apenas investimentos em pesquisa e no ensino universitário, mas também na educação básica. Segundo Pomar, os professores do ensino público no Brasil precisam lutar para “mudar de patamar”, para serem respeitados e valorizados, assim como as demais carreiras com formação superior.

Ele chamou a atenção que a juventude brasileira vem perdendo o interesse em seguir a carreira do magistério. “A Coreia do Sul, que era um país pobre e pequeno, deu essa arrancada nos últimos 40 anos porque investiu em educação. Como é que alguém vai respeitar uma categoria profissional que ganha uma merreca?”