relações reatadas

Castro e Obama só conversaram sobre acordo um dia antes do anúncio

Assessor do presidente dos EUA para a AL diz que líderes acompanharam negociações por meio de assessores e que o papa Francisco foi fundamental para criar um clima de confianças entre as partes

EFE

Castro: acordo sustentável com EUA, mas pendências como Guantánamo e bloqueio econômico continuam

Washington – Os líderes de Cuba, Raúl Castro, e dos EUA, Barack Obama, só conversaram sobre o histórico acordo de retomada de relações diplomáticas, anunciado simultaneamente por ambos, na quarta-feira (17), no dia anterior, em contato por telefone que durou aproximadamente uma hora.

Essa conversa representou o primeiro contato entre os líderes de ambos os países em mais de meio século, revelou hoje (19) Ricardo Zúñiga, um dos negociadores da histórica retomada. Segundo ele, Castro e Obama “não participaram diretamente de nenhuma das conversas, mas eram muito bem informados da situação por suas respectivas equipes”.

“Após o fracasso da política das últimas décadas e o início de reformas na ilha, o que queríamos fazer era melhorar as possibilidades de ver um avanço positivo dentro de Cuba”, contou Zúñiga, de origem hondurenha e o principal assessor de Obama para a América Latina. Segundo ele, o apoio do papa Francisco foi essencial para criar “um ambiente de confiança” entre as partes.

“Trata-se de aumentar a possibilidade do fluxo de recursos e informação em direção a Cuba, para melhorar as condições do cidadão comum”, segundo Zúñiga, que liderou junto com o conselheiro adjunto de segurança nacional da Casa Branca, Ben Rhodes, a delegação norte-americana que negociava em segredo com Cuba desde junho de 2013.

Dessas negociações nasceu o acordo anunciado por Obama e pelo presidente cubano, Raúl Castro, para iniciar um processo rumo à restauração das relações diplomáticas entre os dois países, rompidas desde 1961, que contempla a abertura de embaixadas em Washington e Havana nos próximos meses.

O acordo inclui também a flexibilização das restrições às viagens e ao comércio entre Estados Unidos e Cuba, e às remessas de dinheiro que os cubanos recebem vindas do território americano.

“A troca comercial vai beneficiar o povo cubano, que sofre com as restrições vigentes na ilha”, de acordo com Zúñiga, que destacou que, apesar da mudança de posição prometida por Obama, os Estados Unidos vão continuar sendo “críticos à situação política e social” do país caribenho.

As conversas secretas, em sua maioria realizadas no Canadá e que se prolongaram durante um ano e meio, foram “muito difíceis e muito claras”, revelou o assessor de Obama.

Durante sua viagem ao Vaticano em março passado, Obama falou dessas negociações com o papa, que se mostrou “muito interessado na situação da relação entre os dois países (…) e disposto a ajudar em certa forma”, afirmou Zúñiga.

“Quando chegamos à conclusão de que tínhamos um acerto que ia ser sustentável e aceitável para as partes, nos reunimos com o Vaticano, porque é um ator no qual ambos temos confiança”, detalhou.

Essa “reta final” rumo ao fechamento do acordo, faltando alguns “detalhes”, aconteceu em outubro e Obama deu o sinal verde, após as eleições legislativas do dia 4 de novembro, nas quais a oposição republicana assumiu o controle total do Congresso.

“Utilizamos e manejamos várias fórmulas (para o acordo), nenhuma das partes conseguiu tudo o que queria, de nenhuma forma, mas pudemos ter uma troca correta, que foi construtiva também”, explicou Zúñiga.

Pelo acordo, o prestador de serviços americano Alan Gross foi libertado depois de ter passado mais de cinco anos preso em Havana, enquanto os três agentes cubanos do grupo “Los Cinco” condenados em 2001, que ainda estavam presos nos EUA, também recuperaram a liberdade e retornaram à ilha.

Esses três agentes foram libertados em troca de um espião de origem cubana que trabalhou em segredo para a CIA, identificado como Rolando Sarraff Trujillo, e que ficou preso na ilha durante quase 20 anos.

Obama e Castro se encontraram em dezembro do ano passado no funeral do ex-presidente sul-africano Nelson Mandela em Johanesburgo, onde apertaram de mãos.

Como disse nesta quarta-feira em seu discurso sobre a mudança de política em relação a Cuba, Obama espera que o Congresso, que a partir de janeiro será totalmente controlado pelos republicanos, inicie um debate “sério e honesto” sobre o embargo econômico unilateral imposto à ilha em 1961, durante a presidência de John F. Kennedy.

Apesar de existirem poucas possibilidades de que isso ocorra, “há muitos republicanos que apoiam as medidas” de Obama e “que pensam que, através da troca comercial e pessoal entre os dois povos, podemos avançar tudo o que não se avançou em mais de meio século”, enfatizou Zúñiga.