Semana do saco cheio

Upes: ‘Era loucura falar em derrotar o Alckmin, mas estamos bem perto’

Presidenta da União Paulista dos Estudantes Secundaristas, Ângela Meyer, acredita que mobilização dos estudantes conseguirá impedir o fechamento das escolas: “Vamos resistir até o governador retroceder”

Reprodução/Facebook

“A escola é pública. Como o Alckmin vai fechar uma escola nossa?”, questiona Ângela (a foto é de seu perfil no Facebook)

São Paulo – A presidenta da União Paulista dos Estudantes Secundaristas (Upes), Ângela Meyer, defendeu que a mobilização dos estudantes e professores contra o fechamento de escolas pelo governo do estado de São Paulo deve crescer até o governador Geraldo Alckmin (PSDB) recuar. “Vamos manter a resistência. Por muito tempo seria uma loucura falar que podíamos derrotar o Alckmin, mas desta vez estamos muito perto”, disse em entrevista à RBA.

Nesta semana, depois de uma série de mobilizações estudantis, o Ministério Público Estadual e a Defensoria Pública de São Paulo cobraram explicações do governo sobre o projeto da suposta “reorganização” do ensino. Até agora, a lista tem 172 escolas a serem fechadas. A previsão da Upes é que chegue a 1.500. “O Alckmin vai condicionar os estudantes a salas ainda mais apertadas para ter prédios vazios e aí disponibilizá-los para prefeituras e para quem mais quiser, para não ter mais os custos de manutenção”, disse Ângela.

A Upes participa hoje (15) de uma série de atos descentralizados no estado organizados por estudantes. Na terça-feira (20), a entidade, em parceria com o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), organiza mobilização estadual em que espera grande adesão de estudantes de diversos municípios. Na capital, a concentração será a partir das 15h, na Praça da República, no centro.

“A Secretaria de Educação alega que a rede é preparada para receber 6 milhões de estudantes, mas que atualmente tem apenas 4,5 milhões. Nós vemos isso como uma janela demográfica importante para reduzir o número de estudantes por sala de aula, uma reivindicação histórica do movimento estudantil”, disse. “Nos últimos dez anos, a rede pública diminui quase 2 milhões de estudantes. Uma parte evadiu, mas pelo menos 600 mil ingressaram em escolas particulares. A rede privada de ensino aumentou 36%, um dado muito preocupante, que evidencia um projeto de privatizar a educação.”

Como a Upes avalia o projeto de reestruturação proposto pelo governo do estado de São Paulo?

É importante ressaltar que não é uma proposta, mas sim uma determinação. Estudantes, professores, pais, ninguém foi consultado. Esse projeto lembra o que ocorreu em 1995, quando o PSDB também lançou um plano para reorganizar a educação estadual, mas a única parte dele que entrou em prática foi a demissão de pelo menos 20 mil professores da rede, uma brecha para todos os problemas na carreira que verificamos atualmente.

Na nossa avaliação, este é um projeto é muito ruim. Ele atrapalha todo o cotidiano da escola e de estudantes, pais e professores. O que a Secretaria de Educação alega é que a rede é preparada para receber 6 milhões de estudantes, mas que atualmente tem apenas 4,5 milhões. Nós vemos isso como uma janela demográfica importante para reduzir o número de estudantes por sala de aula, uma reivindicação histórica do movimento estudantil. Hoje, há salas superlotadas, com 45 estudantes, o que é comprovadamente péssimo para o processo de aprendizagem.

Para além disso, as estatísticas mostram que nos últimos dez anos a rede pública diminui em quase 2 milhões de estudantes. Uma parte evadiu, mas pelo menos 600 mil ingressaram em escolas particulares. A rede privada de ensino de São Paulo aumentou 36% nos últimos dez anos, um dado muito preocupante, que evidencia um projeto de privatizar a educação.

Há uma lista de escolas que serão fechadas?

Sim, e aumentou de 127 para 172. A perspectiva é que chegue a 1.500 escolas.

No fundo, qual o interesse que há por trás de fechar escolas?

A privatização da educação. Além disso, o Alckmin vai condicionar os estudantes a salas ainda mais apertadas para ter prédios vazios e aí disponibilizá-los para prefeituras e para quem mais quiser, para não ter mais os custos de manutenção. O secretário diz que as escolas fechadas vão virar Etecs (Escolas Técnicas Estaduais), Fatecs (Faculdades de Tecnologia do Estado de São Paulo) ou creches.

Ontem (14) participei de uma audiência pública em Santo André (no ABC paulista), onde a principal escola da cidade, o Américo Brasiliense, será fechada. Militantes denunciaram que no local, um prédio histórico tombado, será instalado um Poupatempo, que hoje funciona dentro de um shopping, mas com aluguel muito caro. Essa é a situação. Está muito complicado, mas estamos dando a resposta. Só na semana passada, mais de 150 escolas foram mobilizadas em protestos no estado de São Paulo.

Como está a agenda de mobilização dos estudantes?

Hoje participamos de vários atos descentralizados que ocorreram no estado inteiro. Além disso, deliberamos em assembleia na terça-feira (13) que o ato já marcado para o dia 20 terá abrangência estadual. Nossa meta é trazer 10 mil estudantes, de diferentes regiões do estado. Na assembleia conseguimos reunir alunos de 16 municípios.

Vocês têm recebido apoio de outros movimentos sociais?

Esse é um movimento encabeçado por estudantes e professores, sobretudo, e temos tido apoio de outros movimentos sociais. Representantes da CUT e do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) foram até nossa assembleia dizer que estão conosco.

Uma das diretrizes do projeto é garantir que as escolas tenham apenas um ciclo da educação formal. Segundo o governo estadual, as instituições que funcionam nesses moldes têm rendimento 10% superior às unidades com os três ciclos de ensino. Como a Upes avalia esse ponto?

O próprio governo já pôs por água abaixo o que está dizendo. Hoje temos 473 escolas no estado de São Paulo com um só ciclo, o ensino médio no caso. Essas escolas não têm laboratório, biblioteca, quadra poliesportiva coberta… nada. Aí batemos de frente com outro problema: no início de 2014 o Alckmin cortou pela metade a verba de manutenção das escolas. Neste ano, desde janeiro escolas não recebem essa verba também. Ou seja, em vez de melhorar a infraestrutura das escolas de acordo com o que cada ciclo demanda, vemos que não há verba nem para a manutenção.

Há algo que o governo federal possa fazer?

Ele não pode fazer muita coisa, até porque a Secretaria Estadual de Educação se fecha para o diálogo. Para você ter uma noção, o Ministério da Educação está construindo um documento chamado Plataforma Base Curricular Nacional, que propõe uma discussão sobre os componentes curriculares da Educação Básica e que precisa da participação de professores e alunos. Eles tiveram que nos procurar para fazer essa ponte, porque o governo estadual é “indialogável”.

Na terça-feira (13), o Ministério Público do Estado abriu inquérito civil para cobrar explicações do governo de São Paulo sobre o fechamento das escolas. Vamos fazer também uma reunião com a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) para ver como eles também podem nos apoiar. Precisamos fazer o Alckmin recuar. Ele está irritado, tanto que mandou a Polícia Militar para cimados estudantes no último ato, jogando gás lacrimogêneo em um monte de menor de idade. Ontem, na sede da Upes, terminamos nossa assembleia com 100 estudantes e estávamos cantando palavras ordem quando dois PMs subiram e nos mandaram parar. Vemos tudo isso como sinal de que estamos conseguindo colocá-lo contra a parede.

A expectativa é que a mobilização cresça?

Sem dúvida. É uma pauta muito central. Há muito tempo nem os professores conseguiam mobilizar tanta gente. E essa resistência não foi instigada pelo movimento estudantil ou pelo sindicato dos professores, foi algo que surgiu dos alunos. Vamos manter a resistência até o final, até o último instante, até o Alckmin retroceder. Por muito tempo seria uma loucura falar que podíamos derrotar o Alckmin, mas desta vez estamos muito perto.

Há anos os movimentos observam um “sucateamento” da educação estadual, com sucessivos cortes de verba, precarização da carreira docente e notas ruins nas avaliações. Por que essa pauta em específico mobilizou tantos estudantes?

Porque é uma pauta sensível, que interfere no dia a dia dos alunos e dos pais. Nesses casos, as pessoas costumam se mobilizar mais. A galera sente na pele a mudança, mexe no cotidiano: você não vai mais estudar com seus amigos, a escola em que você estava há seis anos não vai existir mais, aquele professor que você gosta não vai mais te dar aula, você terá que ir para um colégio mais longe, não poderá mais contar com o vizinho para buscar seu filho enquanto trabalha. As pessoas ficam mesmo muito insatisfeitas. Afinal, a escola é pública, é nossa e funciona com nosso dinheiro. Como o Alckmin vai fechar uma escola nossa?

Os grêmios estão participando?

Sim. Na nossa assembleia, reunimos 73 grêmios estudantis, mas no nosso radar temos mais de 120. É importante frisar que essa é uma articulação que está sendo feita pelos estudantes. O que estamos fazendo é só ajudar nas decisões e na organização. Não tínhamos a expectativa de envolver tanta gente nessa pauta, mas os secundaristas de São Paulo estão com tudo. As diretorias perderam o controle e não conseguem mais suspender ninguém. Está todo mundo mobilizado. Elas vão suspender todos os alunos?