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Professores e alunos reafirmam resistência a ‘reorganização’; começa ocupação de escolas

Manifestantes marcharam até o Palácio dos Bandeirantes em protesto contra o fechamento de 94 escolas pelo governo de Alckmin (PSDB). Militantes do movimento sem-teto estão acampados no local e duas escolas já foram ocupadas

FramePhoto/Folhapress

Outro ato de protesto será o boicote às provas do Saresp, programada para 24 e 25 de novembro

Sao Paulo – Professores e alunos da rede estadual paulista, de diversos municípios do estado, marcharam hoje (10) do estádio do Morumbi até o Palácio dos Bandeirantes, na zona sul da capital paulista, em protesto contra o fechamento de pelo menos 94 escolas pelo plano de reorganização escolar do governo de Geraldo Alckmin (PSDB). Em palavras de ordem, os manifestantes prometiam ocupar as instituições e resistir à medida. O próximo ato será dia 27, no vao livre do Masp, na avenida Paulista.

Um grupo de estudantes da Escola Estadual Lecio Akaishi, de Ribeirao Pires, chegou ao ato entoando, em coro, “se o Lecio fechar, nós vamos ocupar!”. “Tenho muitos amigos que terão que ir para uma outra escola, que fica a mais de três quilômetros de distância de onde moram. Isso é péssimo. Para nós, é tudo muito triste. Nossa escola é como uma grande família. Os pais de muitos colegas se formaram lá há anos… E nós também vamos, porque vamos resistir!”, disse o estudante Adams Henrique, de 17 anos.

Só hoje, duas escolas estaduais que estão para ser fechadas foram ocupadas por estudantes e professores: a Fernão Dias, em Pinheiros, e a Escola Estadual Diadema, localizada no município de mesmo nome. Os manifestantes prometem ficar no local até que o governo do estado reveja a decisão. “Sofremos com muita pressão e intimidação da Polícia Militar para deixarmos o local, mas não voltamos atrás. Estamos nos revezando e fazendo vigílias para impedir o fechamento da escola”, disse um dos professores envolvidos na ocupação da Escola Diadema Antonio Jovem.

“Seguimos em um movimento muito representativo que tende a continuar forte, porque não há negociação: não vamos aceitar o fechamento de nenhuma escola”, afirmou a presidenta do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial de São Paulo (Apeoesp), Maria Izabel Noronha, a Bebel. “Nós continuamos pedindo uma reunião com o secretário estadual da Educação (Herman Voorwald) para mostrar que é possível reduzir o número de alunos nas salas e aumentar a qualidade.”

Durante o ato, um grupo de pelo menos 30 militantes do movimento sem-teto acampou em frente ao Palácio dos Bandeirantes, onde permanece até agora, em protesto contra o fechamento das instituições de ensino e exigindo a entrega de 10 mil habitações populares prometidas pelo governo estadual. “Era só o que faltava o governo Alckmin, que não entrega moradia nem políticas de saúde e segurança, vir fechar escolas. É um crime contra a juventude e contra os trabalhadores, sobretudo contra os mais pobres. Sabemos que quem fecha escolas abre presídios e não vamos aceitar isso”, bradou o coordenador da Central Única de Movimentos Populares, Raimundo Bonfim.

Também uniram ao movimento estudantil e à Apeoesp a CUT, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), a Uniao dos Movimentos de Moradia e os petroleiros, que estão em greve desde o último dia 1º. Estiveram presentes regionais do sindicato de todas as regiões do estado, incluindo os municípios de Bauru, Jacareí, Campinas, Marília e Assis.

“A previsão é que pelo menos 20 mil colegas professores sejam afetados com o fechamento das escolas. E ainda não temos nenhuma garantia que essa proposta possa melhorar a qualidade da educação. Se esse é o objetivo do governo, eles deveriam investir nas escolas, melhorar a infraestrutura e disponibilizar laboratórios”, defende a professora de matemática Solange Loureiro, que leciona na Escola Estadual Ruy Rodriguez, em Campinas.

No sábado (14), quando ocorrem as reuniões de pais, os estudantes e militantes de movimentos sociais vão fazer uma vigília das 94 escolas que serão fechadas, e alertar para os pais que a chamada “reorganização” tem por trás uma proposta de economia de dinheiro. “Queremos escolas de qualidade, com professores valorizados. Não vamos retroceder nenhum passo na educação paulista nem nos sonhos da juventude”, defende a presidenta da União Paulista dos Estudantes Secundaristas (Upes), Angela Meyer.

Outro ato de protesto será o boicote às provas do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp), programadas para serem aplicadas nos dias 24 e 25 deste mês. “Neste momento em que a rede está desorganizada, como vamos fazer avaliações? Para qual escola vai a nota dos alunos se muitas vão ser fechadas?”, questionou Bebel.

O governo Alckmin justificou o fechamento das escolas dizendo que vai reunir apenas alunos do mesmo ciclo – fundamental I e II e médio – nas escolas e com isso melhorar a qualidade do ensino. Professores e estudantes temem que as mudanças levem à superlotação de salas, demissão de docentes e à redução de salário decorrente da redução de jornada. Além disso, a Apeoesp acredita que o número de escolas a serem fechadas será muito maior.

Apesar dessa crise de superlotação no início do ano, o secretário Voorwald afirmou ao telejornal Bom Dia São Paulo, em 22 de setembro, que São Paulo tem 2 milhões de vagas ociosas. “O momento é absolutamente apropriado para isso porque houve redução de dois milhões de alunos na rede, a estrutura física que foi preparada há mais de 20 anos para receber 6 milhões de alunos em um processo de universalização, hoje, por conta da queda na taxa de natalidade, viabiliza que eu tenha escolas ociosas. A rede foi desenvolvida para absorver até 6 milhões de alunos, hoje tem 4 milhões.”

Ângela, da Upes, defendeu em entrevista à RBA que essa “janela demográfica” seja usada para reduzir o número de estudantes por sala de aula, uma reivindicação histórica do movimento estudantil: “Nos últimos dez anos, a rede pública diminui quase 2 milhões de estudantes. Uma parte evadiu, mas pelo menos 600 mil ingressaram em escolas particulares. A rede privada de ensino aumentou 36%, um dado muito preocupante, que evidencia um projeto de privatizar a educação.”

Professores ligados à Apeoesp concordam e reivindicam que a estrutura das escolas seja otimizada para que as salas de aula tenham no máximo 20 alunos, em qualquer dos ciclos. Os docentes reclamam ainda que a chamada reorganização da educação foi anunciada sem nenhuma discussão prévia com a comunidade escolar e com entidades ligadas à educação. O governo Alckmin já havia adotado a mesma postura com o Plano Estadual da Educação, elaborado pelo governo e apresentado pelo à Assembleia Legislativa por Alckmin sem participação popular.

São Paulo tem hoje 5.108 escolas, das quais 1.443 são de ciclo único, outras 3.186 mantêm dois ciclos e 479 escolas têm três ciclos. Essas últimas devem ser transformadas em escolas de ciclo único, assim como grande parte das de dois ciclos. Só neste ano, pelo menos 3.390 salas de aula foram fechadas no estado de São Paulo. Muitas escolas iniciaram o ano letivo com até 60 estudantes por classe, em turmas do ensino regular, e até cem estudantes por classe em turmas da Educação de Jovens e Adultos (EJA), segundo a Apeoesp.

No último dia 15, depois de uma série de mobilizações estudantis, o Ministério Público Estadual e a Defensoria Pública de São Paulo cobraram explicações do governo sobre o projeto da suposta “reorganização” do ensino. Os processos estão em andamento.