Ensino ruim explica desinteresse pela ciência

Pesquisa do governo federal mostra que, apesar do crescente interesse, muitos brasileiros não entendem ou não gostam do tema

São Paulo – A baixa qualidade do ensino de ciências nas escolas e a linguagem pouco acessível da imprensa na cobertura científica são as principais razões do desinteresse do brasileiro pelo assunto. Esta é a opinião do físico Ildeu de Castro Moreira, diretor do Departamento de Popularização e Difusão da Ciência e Tecnologia, do ministério de mesmo nome.

Ele é coordenador de uma pesquisa feita entre junho e julho do ano passado para avaliar o interesse, grau de informação, atitudes, visões e conhecimento do brasileiro sobre Ciência e Tecnologia (C&T).

Dos 2016 entrevistados, 36,7% (a maioria) respondeu que não se interessa porque não entende, enquanto que 10,4% alegou não gostar. “O ensino da disciplina é muito fraco, com metodologia pouco atraente para o aluno que acaba perdendo o interesse e até mesmo desgostando”, aponta Moreira, que é professor do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

“Para piorar, a imprensa que cobre o setor geralmente é despreparada, pouco entende do assunto e exagera no uso de expressões que só quem é da área entende, quando deveria traduzir para as informações para o leigo”. 

Outro dado da pesquisa que explica a distância é a baixa visitação e participação em eventos científicos. Dos entrevistados, apenas 8,3% disseram frequentar museu ou outros espaços de divulgação científica; 4,8% estiveram em atividades da Semana Nacional de C&T; 16,4% em feiras ou olimpíadas de matemática. No máximo  (28,7%) vão a bibliotecas e parques ambientais e botânicos ou zoológicos. “Na Europa, a média de visitação a museus de ciência é de 20% da população”, compara Moreira.

Para ele, serão necessários pelo menos mais dez anos de investimentos no setor para o  enfrentamento do quadro. “Precisamos melhorar a qualidade do ensino de ciências, aumentar a oferta de museus e espaços de divulgação científica e, sobretudo, usar os meios de comunicação como aliados. Praticamente não existem programas de tevê que tratam do assunto. E os raríssimos são apresentados em horários em que poucas pessoas estão assistindo”. 

Em compensação, a pesquisa mostrou interesse crescente do brasileiro pela C&T. Em 2006, quando foi realizada pela primeira vez, a sondagem revelou que 41% dos entrevistados afirmaram ter muito interesse pela área, e 35% declararam pouco interesse. Em 2010, os índices foram, respectivamente, 65% e 20%.

“Esse aumento se deve ao maior acesso à informação propiciado pela estabilidade econômica, à melhoria, mesmo que tímida, no ensino, e também à internet, embora muitos brasileiros ainda não tenham acesso a ela”, explica o diretor do departamento de popularização da ciência do Ministério da C&T.

Interesse maior

Questões ambientais são as mais importantes para 83% dos entrevistados, que se declararam muito interessados (46%) e interessados (37%). Tanto que este é o tema sobre o qual eles mais se informam. Medicina e saúde apareceu em segundo lugar, com 42% muito interessados e 39% interessados.
“Isso reflete a preocupação da população brasileira com um tema de grande importância para a nossa sobrevivência. O que, por outro lado, aponta demandas por mais e melhores programas de educação ambiental.

Ildeu de Castro Moreira destaca também a postura crítica do brasileiro frente a diversas questões. Para 68% dos entrevistados, é necessário que os cientistas exponham publicamente riscos decorrentes dos desenvolvimentos científicos e tecnológicos; para 56%  a maioria das pessoas é capaz de entender o conhecimento científico se ele for bem explicado; e para 42,3%  “a C&T traz mais benefícios que malefícios. 

Quanto às razões de insatisfação quanto à cobertura das descobertas científicas pela tevê, para 77,6% o número de matérias é pequeno; para 65,7% são ignorados os riscos e problemas que a aplicação da C&T pode causar; para 63,8% a cobertura é tendenciosa; para 55,7%, em geral, é difícil  entender as matérias; e, para 45%, as matérias são de má qualidade.