Insensíveis

Centrão e Rodrigo Maia, trunfos de Bolsonaro e Guedes no corte do auxílio para R$ 300

E, apesar da tragédia sanitária, da crise econômica e de não haver perspectivas do fim da pandemia, governo reduz verbas não obrigatórias para saúde em 2021

Marcos Corrêa/PR-Fotos Públicas
Marcos Corrêa/PR-Fotos Públicas
Bolsonaro participa de café da manhã com parlamentares nesta quarta (2). Aliança com Centrão garante maioria parlamentar para aprovar a agenda neoliberal e entreguista de Paulo Guedes

São Paulo – De acordo com deputados da oposição, o apoio do Centrão vai levar o governo de Jair Bolsonaro a conseguir aprovar a  extensão do auxílio emergencial em mais quatro parcelas, mas reduzido pela metade (de R$ 600 para R$ 300), de acordo com a agenda do ministro Paulo Guedes (Economia) e apesar da tragédia sanitária sem precedentes provocada pela pandemia de coronavírus. Bolsonaro vai enviar ao Congresso uma media provisória estabelecendo a prorrogação e o novo valor.

“A oposição vai manter a posição pelos 600 reais e vamos tentar negociar isso. Quanto a passar ou não, estou achando difícil. O governo está consolidando a base dele, que está cada dia mais sólida. É difícil que a nossa posição passe”, antecipa a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ).

Centrais pressionam por prorrogação do auxílio no valor de R$ 600

“Não tenho dúvida de que vão aprovar (os R$ 300). O Centrão ‘ajustou’ o governo. É uma constatação”, afirma Júlio Delgado (PSB-MG). “Se mantivesse os 600 reais, seria melhor até para Bolsonaro. Voltando para os 300 reais, quem vai perder politicamente é ele”, completa.

Outro Maia

Ambos os parlamentares consideram que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não repetirá a atuação que apresentou quando a Casa aprovou o auxílio emergencial de 600 reais, no início da pandemia. O governo inicialmente propôs um voucher de R$ 200 para ser utilizado na compra de itens de necessidades básicas, como alimentos e produtos de higiene e limpeza.

Jandira e Júlio afirmam que, desta vez, Maia vai sustentar a proposta do governo. “Acho que agora ele não vai apoiar valor maior. Todos se voltaram aos 300 (reais)”, avalia Jandira. “Ele defende o discurso do Guedes e vai defender os 300 (reais). Mais um equívoco dele”, observa Delgado.

Com R$ 325 bi do BC para o Tesouro, governo reforça prioridade a bancos em tempos de pandemia

Enio Verri (PT-PR), líder do seu partido na Câmara, lembra que Paulo Guedes quer que o Banco Central devolva R$ 400 bilhões ao Tesouro Nacional, que resultam dos lucros com operações cambiais e reservas internacionais. “Esses 400 bilhões cobrem por oito meses o auxílio emergencial, que custa 50 bilhões de reais por mês. Nós do PT e a oposição em geral achamos um equívoco a redução para 300 reais e defendemos a manutenção até dezembro. Afinal, 600 reais já é um valor baixo, imagina cortar pela metade.”

Orçamento do desmonte

Apesar da não se vislumbrar no horizonte o fim da pandemia de covid-19, o projeto do Orçamento da União para 2021, enviado pelo governo ao Congresso, prevê gastos discricionários (não obrigatórios por lei), tanto para saúde como para educação, menores do que em 2020.

Se forem levadas em consideração apenas as despesas discricionárias, ou não obrigatórias, Saúde e Educação terão queda em relação ao projeto enviado pelo governo ao Congresso em 2019, com valores para 2020. Para a pasta da Saúde, a verba proposta é 12,13% inferior e para a Educação, a queda é de 8,61%, na comparação com o projeto orçamentário de 2019. Já para a  Defesa, sobe de R$ 10,105 bilhões em 2020 para 11,738 bilhões (aumento de 16,16%).

“O Orçamento é um horror”, diz Jandira Feghali. “Reduz  o papel do Estado, reduz o dinheiro de saúde, educação e ciência. Diminui o orçamento discricionário em relação ao PIB. Joga para ter superávit primário. É ajuste fiscal na veia. Mantém o teto de gastos e mantém a mesma agenda de antes da pandemia.”

Teto de gastos

Apesar da disposição da oposição de derrubar o teto de gastos, Júlio Delgado acredita que a reordenação política da base de Bolsonaro com o Centrão vai ser suficiente para manter a amarra em 2021.

Para Verri, a proposta de orçamento apresentada tem “o pecado do teto de gastos”. “Onde está escrito que a partir de 1° de janeiro de 2021 não vai ter mais pandemia?”, questiona. “O governo está se comportando como se a partir dessa data a pandemia estará extinta, a economia se recuperando e tudo voltará à normalidade. Mas, com este orçamento apresentado, mesmo que não tivesse pandemia, não teria como voltar à normalidade.”

Com queda de quase 10% no trimestre, PIB tem seu pior resultado histórico

O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro no segundo trimestre teve queda histórica de 9,7% e o país ficou na 22ª posição no ranking internacional. “Hoje estamos em 22° lugar do mundo, mas certamente estaríamos entre os piores se não tivéssemos tido o auxilio de 600 reais”, diz Delgado.

Guedes à parte

Já Paulo Guedes, cuja queda, episodicamente, é dada como certa, continua impassível e insensível à tragédia, levando a agenda radicalmente neoliberal à frente. Na terça-feira (1), ele declarou que as quatro parcelas do auxílio emergencial, até dezembro, com a redução do valor para a metade, “são as últimas camadas de proteção que estamos lançando”. “Está havendo uma tentativa de uma aterrissagem suave, descendo para R$ 300, quatro prestações até o fim do ano”, explicou.

Na opinião de Verri, a peça orçamentária “já chega falida, uma peça de faz de conta que é a cara do Paulo Guedes. Para eles o povo não existe”.

Lula: não adianta criar Renda Brasil e não aumentar o salário mínimo

O salário mínimo também foi incluído no pacote de maldades do orçamento. A previsão para 2021 é de R$ 1.067, corrigido apenas pelo INPC estimado até dezembro, sem aumento real pelo segundo ano consecutivo. Segundo o Dieese, o valor proposto pelo governo Bolsonaro é 24,1% do valor necessário para garantir o sustento de uma família de quatro pessoas.