gestão urbana

Igreja pressiona discussão do novo Plano Diretor de São Paulo

Mudanças na classificação de vias no zoneamento e menos exigências para obtenção de alvará de funcionamento estão entre as demandas

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Regular o funcionamento de igrejas e templos religiosos deve ter discussão à parte na revisão do Plano Diretor

São Paulo – Projeto de lei do vereador Jair Tatto (PT) pretende anistiar todos os templos religiosos de multas recebidas por falta de alvará de funcionamento. Ainda em inicio de tramitação na Câmara Municipal, o PL 266/2013 é o primeiro resultado de uma articulação da Igreja Católica para influenciar as discussões do novo Plano Diretor Estratégico (PDE) do município, prevista para ocorrer ainda este ano.

Segundo o vereador Tatto, o bispo de Santo Amaro, dom Fernando Antônio Figueiredo, chamou os vereadores da zona sul para uma reunião na qual apresentou uma série de problemas sofridos por igrejas de suas paróquias, em especial as localizadas em bairros de periferia, para se adequarem às regras previstas hoje no Plano Diretor. A principal é a falta de alvará de funcionamento, que já causou multas e até ordem de fechamento.

Segundo a assessoria de Jair, as demandas foram feitas pela igreja católica, mas também se aplicam a templos de todas as religiões. Como resultado da reunião, o vereador Arselino Tatto (PT), irmão de Jair e líder do governo na Câmara, solicitou à Coordenadoria das Subsecretarias um estudo sobre a situação dos templos religiosos no município. O resultado resultará em projetos de lei e emendas a serem apresentadas na discussão do novo Plano Diretor da cidade.

O projeto de lei de Jair adiantou a discussão, propondo a anistia das multas recebidas até aqui, com a contrapartida de que os templos usem os recursos para obras de adequação, necessárias para garantir o bom funcionamento dos espaços. “Proponho uma contrapartida rigorosa, terão que investir para realizar adequações de segurança. Isso não prejudica o debate do Plano Diretor, onde vamos forçar a discussão sobre o zoneamento. Precisamos mudar a lei”, afirma Jair, que, na justificativa do PL, defende a anistia para “viabilizar o funcionamento de templos religiosos que, através de suas especificidades, beneficiam o governo e a sociedade por meio de suas ações.”

“Diversas pesquisas apontam que a prática religiosa ou os que creem em uma entidade superior têm maior capacidade de resiliência. Além disso, os valores religiosos propagam a bondade, amor e respeito quando aplicados no ambiente familiar e na sociedade formam indivíduos conscientes e, assim, verdadeiros cidadãos”, completa o texto.

Propriedade

Guilherme Frontini, advogado da Diocese de Santo Amaro, explica que um dos principais problemas das igrejas para regularizar o alvará é a exigência de comprovação da propriedade do terreno em que ela está instalada. “A maioria das igrejas da região está na periferia, em loteamentos não regularizados, ruas não oficiais, o que impossibilita a emissão de título de propriedade. Quando isso está regularizado, o título está em nome de um terceiro que doou ou cedeu para a igreja, e a lei pede que esteja em nome do titular, ou o terreno está em processo de usucapião, são muitos problemas”, diz.

A demanda dos religiosos é que a prefeitura desvincule o título de propriedade da regularização da construção. “A regularização da construção visa a garantir que ela está regular, em zona adequada, que ela segue os padrões exigidos – não diz respeito à propriedade. Tanto que a própria prefeitura quando usa um carimbo que declara que a prefeitura não reconhece direito de propriedade. Isso é atribuição exclusiva do Judiciário ou do registro de imóveis. A prefeitura já se resguarda dessa questão, então por que vincular a prova de propriedade para regularizar construção?”, questiona.

Outro problema deriva das ruas em que as igrejas estão localizadas. Hoje, o Plano Diretor não permite a instalação de qualquer tipo de templo religioso nas vias chamadas Locais, imensa maioria do total de ruas da cidade. “As que já existiam antes da nova lei têm direito adquirido, mas não podem ampliar suas instalações, construir salas para catequese, por exemplo”, explica Frontini, lembrando que o limite máximo de aproveitamento de construções em vias locais é de 250 metros quadrados por lote. “O problema é que essa qualificação viária foi feita pela CET, com base apenas em questões de tráfego. Estamos pleiteando uma reclassificação viária no novo plano diretor, e que ela seja feita pela Secretaria de Planejamento ou Habitação, com base no zoneamento”, afirma Frontini. “Veja o poder econômico: igrejas não podem se instalar em vias locais, mas bancos, que produzem mais trânsito e risco de segurança, podem”, diz.

Outro ponto é o limite de pessoas que podem se reunir em um mesmo local sem que esse seja classificado como polo gerador de tráfego – e logo, impedido de estar em vias locais. Hoje, o limite é de 200 pessoas, mas os religiosos cobram um aumento para 500 específico para templos religiosos. “Hoje igrejas estão equiparadas a casa de shows, estádios de futebol, boates. São públicos diferentes, na igreja você vai para rezar, não causa tumulto”, esclarece.

Segundo Frontini, um projeto de lei contemplando as demandas da Diocese já está sendo elaborado pelos vereadores. “Será um projeto assinado por todos os vereadores da região. Eu recebi uma primeira versão do texto, fiz algumas modificações, e retornei”, conta. Um exemplo de modificação, segundo ele, é que o texto como estava previa que as entidades deveriam apresentar certificado de filantropia para serem enquadradas nas novas regras. “Igrejas não têm esse certificado, é uma entidade sem fins lucrativos, não filantrópica. Quem tem são as entidades que muitas igrejas mantêm, como uma creche ou algo assim”, afirma.