Enquanto busca reconstrução, Cunha perde negócios e tem dúvidas sobre aulas

Cidade afetada pela enchente no começo do ano ainda tem problemas sérios nas estradas rurais e espera por licitação para recuperação de ligação com Guaratinguetá

A cidade de Cunha, no interior de São Paulo, ainda tenta superar alguns dos problemas deixados pela enchente do início do ano. O segundo maior município paulista em extensão territorial, com 1.410 quilômetros quadrados, registrou problemas especialmente na zona rural.

O prefeito Osmar Felipe Júnior (PSDB) considera que a maior parte do trabalho de reconstrução foi realizado, mas aponta que a situação em muitas estradas rurais ainda é precária. “A diferença é que aqui a situação é mais dispersa. São onze mil habitantes na zona rural e alguns produtores estão a 70 quilômetros de distância uns dos outros. Não é tão fácil de se visualizar a situação de Cunha”, afirma. A comparação é com o quadro de municípios próximos,como São Luiz do Paraitinga, em que a destruição concentrou-se na área urbana.

A situação das estradas explica a decisão tomada pelo produtor Carlos Hermindo de Jesus Janela. Há quatro anos, ele iniciou um cultivo de lavouras orgânicas – sem uso de agrotóxicos – em uma propriedade na área rural do município. Pouco mais de um ano depois de começar a revenda para estabelecimentos da capital paulista, Carlos se vê obrigado a interromper as operações. “A estrada hoje não tem como operar com esse tipo de negócio. É produto perecível, que depende de sair no dia certo e o cliente quer receber na data determinada. Hoje, se vou, não sei se chego. Se chego, não sei se volto”, destaca.

A propriedade de Carlos fica a 13 quilômetros do asfalto. A estrada de terra, que tinha um assentamento frágil, foi invadida pelo rio depois das enchentes. Para que se tenha uma ideia, continuar com o negócio significaria receber caminhões cujo peso, somado à carga, chega a mais de dez toneladas – algo impossível nas atuais condições.

Mas não é apenas a situação da estrada de terra que levou à mudança de rumo. Carlos teme que a SP-171, que vai de Guaratinguetá a Cunha e de Cunha a Paraty, não aguente a pressão dos próximos meses. O Departamento de Estradas de Rodagem (DER) confirma que há muitas barreiras a serem removidas devido às chuvas que assolaram a região no começo do ano.

A expectativa é que, finalmente, seja lançada uma licitação para poder fazer a recuperação do asfalto que, segundo a reportagem apurou, é o mesmo há décadas, com alguns poucos retoques. 

De toda maneira, a recuperação dessa e das outras estradas de Cunha vai depender do fim da temporada de chuvas. O solo encharcado não permite a recuperação definitiva e tudo o que se pode fazer são trabalhos emergenciais.

Vislumbrando essa perspectiva e o verão altamente chuvoso, os diretores de escolas já se questionam como será o retorno às aulas. A rede municipal prevê o início das atividades no próximo dia 18, quinta-feira pós-Carnaval, mas tudo vai depender de avaliações feitas na véspera.

“Ainda não sabemos como será o planejamento, mas trabalhamos com a ideia de que alguns professores passem a morar provisoriamente nas escolas em que dão aulas, retornando à área urbana apenas aos fins de semana”, afirma Cristiana de Oliveira Ferraz, vice-diretora de educação do município.

Pais têm telefonado aos colégios questionando quais serão as alternativas no retorno às aulas. Alguns cogitam que os filhos percorram o caminho a cavalo, já que os ônibus municipais não terão como atravessar estradas danificadas pela chuva.

Carnaval

A área urbana vive situação diferente. O prefeito de Cunha trabalha em parceria com as pousadas no sentido de mostrar que tudo está normal e que a cidade poderá receber o Carnaval, embora numa versão mais enxuta que as dos anos anteriores.

Osmar Felipe Júnior não quer se dar ao luxo de perder qualquer oportunidade de geração de recursos para uma cidade que sofreu um prejuízo estimado em mais de R$ 60 milhões, frente a um orçamento anual de R$ 20 milhões.

O Ministério da Integração Nacional recebeu esta semana o pedido de auxílio em torno de R$ 25 milhões. O governo de São Paulo, até agora, colaborou na construção de muros de arrimo, mas o prefeito afirma que será preciso muito mais.

O produtor Carlos Hermindo pede mais atenção por parte das instâncias superiores de governo para uma cidade que tem poucas alternativas de reconstrução. “Não é uma população grande, mas qualquer pessoa conta. São seres humanos”, lamenta.