Contêineres de lixo em SP contrariam, de novo, política nacional para o setor

R$ 12 milhões são injetados pela administração Kassab em equipamentos que terão de ser descartados em 2014 por conta do Plano Nacional de Resíduos Sólidos

SP: Contêiner para coleta indiscriminada de resíduos: solução improvisada para garantir recursos sem resolver o problema (© Loga/Divulgação)

São Paulo – Desde o começo do mês de agosto, a prefeitura de São Paulo vem implantando um novo modelo de coleta de lixo, mecanizado, que consiste em um contêiner colocado na frente de casas previamente selecionadas para que os moradores do entorno possam depositar o descarte a qualquer hora do dia. “O sistema oferece, entre outros benefícios, ganho de produtividade e menor contato humano com o resíduo”, diz o texto de apresentação da empresa Loga, responsável pelo serviço. Tido como uma “quebra de paradigma” pela empresa, a medida é alvo de críticas por quem acompanha de perto o setor, apontando mais uma falha de uma série cometida pela administração de Gilberto Kassab (PSD) na coleta e manejo de materiais descartados. 

A implantação está prevista no Plano Municipal de Resíduos Sólidos que a prefeitura enviou ao Ministério do Meio Ambiente no último dia 2 de agosto, cumprindo, na data-limite, a obrigação. Trata-se de um pré-requisito para obter, por meio do Executivo nacional, financiamentos para políticas públicas relacionadas ao Plano Nacional de Resíduos Sólidos, como tratamento de aterros sanitários, coletas seletivas, centrais de triagem, entre outros programas.

Nina Orlow, integrante do grupo de trabalho sobre meio ambiente da Rede Nossa São Paulo, afirma que o plano foi entregue, mas o conteúdo descrevia apenas situações “genéricas” do que ainda pode ser feito para resolver o problema na capital, como, por exemplo, a falta de coleta seletiva.

Para ela, a opção de oferecer contêineres para depósito de lixo nada mais é do que “ir na contramão” do plano nacional. A partir de agosto de 2014 nenhum rejeito que ainda possa ser reciclado ou compostado poderá ir para aterros sanitários, ou seja, será responsabilizado quem destinar.

Segundo nota publicada no jornal O Estado de S.Paulo, o valor total do investimento para implantação de 700 contêineres é de R$ 12 milhões, ao custo de mais de R$17 mil cada um. Em um primeiro momento, os equipamentos estarão disponíveis para os moradores dos Jardins, bairro central e de classe alta, utilizado em outros projetos-piloto da administração Kassab.

“Está se gastando recurso não com a coleta seletiva, já que em 2014 vai ter de ser tudo coletado separadamente. É tanto investimento, mas que nada tem de separação do lixo ou ajuda ao trabalho do catador. A gente precisa de uma outra forma de cuidar dos resíduos. Se você joga tudo num conteiner, você não vai saber quem responsabilizar”, pontua Nina Orlow.

Trata-se de mais um passo em rumo contrário ao da política nacional. Também neste ano, a prefeitura quer concluir a entrega de 1,5 mil Pontos de Entrega Voluntária (PEVs), que são contêineres verdes de plástico espalhados pelas ruas da cidade com custo projetado em mais R$ 1 milhão. Por outro lado, o Ministério Público Estadual ameaça processar a atual administração por descumprir a legislação ao não realizar a entrega de 32 ecopontos, necessários para que cada distrito da cidade tenha ao menos um equipamento de coleta seletiva.  

Para Luzia Honorato, da coordenação do Movimento Nacional dos Catadores de Material Reciclável (MNCR), a “conteinerização” é um desrespeito à política nacional de resíduos sólidos, pois é lá que está prevista a obrigatoriedade da coleta seletiva, detalhando um roteiro para resolver o problema do destino correto do material descartável no Brasil. “Então viola de um modo agressivo , absurdo e ignorante”, lamenta Honorato.

No entanto, para a empresa Loga trata-se de um processo de coleta que proporcionará a retirada de resíduos das ruas “de forma inteligente, higiênica, segura e rápida”. O sistema, segundo o site da empresa, oferece ganho de produtividade e menor contato humano com o resíduo. 

“Eu diria até que esses contêineres são mais do que um depósito de lixo, e o que é mais grave é que a sociedade não pode permitir que aconteça, é o dinheiro público jogado fora”, comenta a catadora. Luzia relata ainda que as atuais centrais de triagem não dão conta dos resíduos que a cidade produz atualmente e que políticas públicas para melhoria e ampliação dessas estações deveriam ser a prioridade.

O Plano Nacional de Resíduos Sólidos determina que após agosto de 2014 todos os rejeitos levados ao aterro sanitário serão aqueles que já não têm mais possibilidade de reutilização. Para isso, será penalizado o responsável pelo depósito do lixo, seja ele administrador público, empresa ou qualquer cidadão. “A gente está a dois anos da obrigatoriedade de fazer coleta seletiva antes de ir pro aterro. Quer dizer agora que dois anos antes estamos investindo na contramão daquilo que a gente precisa  em 2014”, afirma a representante da Nossa São Paulo.

A empresa Loga, responsável pela implantação do modelo de contêineres, foi procurada pela reportagem, mas não respondeu aos pedidos de entrevista.