ABCD paulista evita erro da capital para circulação de caminhão

A restrição aos caminhões nas ruas do ABCD está sendo negociada com transportadores, empresas, sindicatos e prefeituras, diferente do que ocorre na capital

Caminhão passa por faixa que alerta sobre restrição na avenida Pereira Barreto, uma das vias da região, onde o tráfego será limitado (Foto: Amanda Perobelli)

São Bernardo do Campo – O ABCD quer evitar o caos no abastecimento ocorrido esta semana em toda a Grande São Paulo e negocia restrição à circulação de caminhões nas  vias locais junto com empresas de  transportes, prefeituras, Consórcio Intermunicipal e sindicatos. Uma das alterações surgidas nas discussões entre as partes interessadas foi a liberação de um trecho da avenida Goiás, em São Caetano.

As prefeituras do ABCD estão reforçando a negociação para acertar os últimos detalhes da operação ‘Horário de Pico’, que inclui a restrição à circulação de  caminhões em diversas vias da região a partir de 8 de abril. A intenção é impedir um caos no abastecimento, como o ocorrido nesta semana em São Paulo. Após os protestos que a medida provocou na capital, a prefeitura de São Caetano decidiu liberar o  trecho da avenida Goiás, que era alvo de impasse com os caminhoneiros. 

O trecho liberado deve compreender desde a avenida Guido Aliberti até a altura da rua Piratininga, o que facilitará o acesso às fábricas na região da avenida dos Estados. Mauá e Ribeirão Pires já haviam sido excluídas da medida. Diadema e Santo André  ainda negociam novas alterações no projeto. 

“Independentemente do resultado, somos contra. Mas já que é preciso ter, estamos desenvolvendo um trabalho técnico em conjunto para chegar a um denominador comum”, afirmou o presidente do Setrans (Sindicato das  Empresas de Transporte de Carga  do ABC), Sallum Kalil Neto.  

“Ainda é cedo para discutir a  possibilidade de uma paralisação, como em São Paulo. O grande diferencial entre as medidas aplicadas no ABCD e em São Paulo é que aqui está havendo negociação. Acredito que as prefeituras vão conseguir contemplar as necessidades de todos”, avaliou Kalil Neto. 

Para o secretário executivo do Consórcio Intermunicipal, Luís Paulo Bresciani, as alterações devem prosseguir até o fim de março. “Pretendemos publicar o decreto com todos esses ajustes no fim do mês. Apesar da posição contrária das entidades, temos buscado dialogar em torno de solução desde novembro.” 

Além da exclusão dos trechos, as prefeituras decidiram reduzir o horário de restrição em uma hora e meia. Agora, a proibição será das 6h30 às 8h30 e das 17h às 20h. O projeto original previa restrição das 6h às 8h30 e das 16h às 20h. “Essas mudanças já são resultado dessa discussão e faremos mais ajustes pontuais, conforme a demanda do nosso polo industrial”, disse.

De acordo com Bresciani, a restrição é uma medida de caráter emergencial e deve ser sucedida  de novas alternativas para diminuir os índices de congestionamento. “É claro que essa é uma solução emergencial. Precisamos muito mais do que isso, por isso continuamos reivindicando investimentos junto ao Estado e governo federal.” 

Entre as alternativas, Bresciani citou a vinda do Metrô para o ABCD, prevista para 2015. As  sete prefeituras também devem trabalhar na elaboração do plano regional de mobilidade. “Precisamos de uma visão integrada e inteligente de transporte de carga  e coletivo. Essa será uma medida pensada a médio prazo.”

O Consórcio Intermunicipal vai encomendar nos próximos dias uma pesquisa de opinião sobre a implementação do rodízio de veículos na região. A aplicação da medida ainda não é consenso entre os sete prefeitos.

A proibição do tráfego de caminhões nas principais vias do ABCD nos horários de pico deve resultar em alívio imediato dos índices de  congestionamento, mas não é medida de efeito a longo prazo. Na avaliação do mestre em Transportes e professor da FEI (Fundação Educacional Inaciana), Creso de  Franco Peixoto, a restrição  pode provocar ainda um novo horário de pico.

“É uma medida necessária,  mas tem cunho de solução  a curto prazo. O número de carros nas ruas continua aumentando. A restrição vai  ajudar, mas por um período de tempo apenas”, avaliou Peixoto. Para o especialista em transportes, a mudança deve prolongar o período de congestionamento. “Os caminhoneiros vão realocar as viagens. Aquele usuário que utilizava o horário da tarde por ser mais livre tende a enfrentar congestionamento.”

Para o professor, não há  dúvida de que a solução é o investimento em transporte público. “Com o passar do  tempo, não há solução para o carro. A chave é o transporte de massa, o metrô precisa chegar ao ABCD”, afirmou. Peixoto citou o exemplo do  BRT (Bus Rapid Transit), aplicado em Curitiba, no Paraná. Conhecido como ‘ligeirinho’, o meio de transporte funciona como um ônibus de via exclusiva e tem menos paradas nos períodos da manhã e fim da tarde. “Os usuários  pagam a taxa no ponto, o que  também acelera a passagem.”

Na opinião do taxista de São Bernardo Antônio Carlos, a restrição a caminhões deve prejudicar o transporte de cargas na região. “Aquele caminhoneiro que transportava frutas do Interior para cá, já perde o interesse. Isso sem contar os perigos que quem escolher viajar à noite pode enfrentar”, analisou o  taxista, que atuou 12 anos como caminhoneiro.   

Já o taxista Adilson Juliano julgou positivo o efeito da proibição, mas apontou a demora nas obras do Rodoanel como prejudicial ao  transporte de cargas. “Se as obras do Rodoanel estivessem completas, os caminhoneiros teriam uma alternativa”, ponderou. Até agora, apenas o trecho Sul da obra foi entregue na região. O trecho Leste continua em obras.

A restrição de circulação de caminhões decidida pelo GT (Grupo de Trabalho) de Mobilidade do Consórcio Intermunicipal,  prevista a partir de 8 de abril, começa a gerar preocupação para as pequenas, médias e grandes  empresas instaladas na região. A medida adotada na capital trouxe reflexos como desabastecimento de combustível nesta semana. 

Os empresários do setor de transporte de cargas ressaltaram que o custo do frete deve aumentar por conta do horário diferenciado que os profissionais irão atuar. Os gestores pontuaram que a competitividade dos empreendimentos regionais automaticamente também será afetada e as grandes empresas podem optar por contratar transportadores da capital para receber os produtos. 

Para evitar o problema, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC quer propor uma reunião com as prefeituras da região e com os executivos do segmento de transportes para discutir uma forma de equalizar a questão.

Para o proprietário da Starvan Tranportes Rodoviários, de São  Bernardo, Vanberto Washington de Souza, a restrição aos veículos pesados deve expandir os gastos das empresas que atuam no segmento de transportes. “O número de funcionários acaba aumentando, além de outros, ou seja,  o governo municipal precisa pensar em ampliar as vias da região para o trânsito fluir melhor, sendo  assim, os caminhões não enfrentariam tantos problemas como ocorre atualmente”, disse. 

De acordo com o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do  ABC, Sérgio Nobre, as administrações públicas regional e estadual precisam elaborar um plano de melhoria do transporte coletivo, como a expansão das linhas de Metrô e também a ampliação e a construção de  novas vias. “Atualmente, o trânsito no ABCD está até pior do que o da capital. Nosso objetivo é trabalhar em conjunto com o poder público e com os empresários para encontrar uma solução eficiente o fluxo das vias”, frisou.

Para o professor de Economia da Esags (Escola Superior de Administração e Gestão), Manoel Marcondes Filho, a decisão do poder público regional de restringir a circulação de caminhões pelas principais vias do ABCD irá  provocar uma série de problemas. “As entregas nas montadoras da região devem ficar comprometidas. A todo instante as empresas recebem e enviam produtos, ou seja, a restrição não ajuda na questão econômica e muito menos na diminuição do trânsito”,  ressaltou.

Na ótica do professor da Faculdade de  Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Antonio Lacerda, o mercado de transportes é um dos mais importantes e a restrição terá como reflexo aumento de preços nos produtos finais para os consumidores.