Sem mentiras

PL dos aplicativos: 32 reais/hora não é máximo, mas mínimo, e ganhos por corrida seguirão. Fake news dificultam entendimento

Oposição divulga uma série de mentiras sobre o projeto, que busca garantir direitos mínimos a esses trabalhadores

Marcelo Camargo / Agência Brasil
Marcelo Camargo / Agência Brasil
Embora existam críticas e algumas demandas de fato importantes a serem avaliadas, o cenário apresenta uma dificuldade extra: as mentiras.

São Paulo – O governo federal, em negociação ampla, tenta resolver um dos principais problemas trabalhistas do mundo contemporâneo: a questão dos trabalhadores com aplicativos. O tema é alvo de incertezas no Judiciário, com entendimento diverso entre a Justiça do Trabalho e o Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a existência de vínculo empregatício. Dessa forma, em iniciativa que tenta garantir condições dignas aos trabalhadores e conciliar interesses das empresas, o Executivo propôs um projeto de lei complementar (PLP 12), chamado de PL dos aplicativos.

Esforço não faltou: durante quase um ano, diferentes áreas da gestão federal sentaram à mesa com empresários e representantes dos trabalhadores para chegar a um acordo. Embora existam críticas e algumas demandas de fato importantes a serem avaliadas, o cenário apresenta uma dificuldade extra – as fake news. A extrema direita vem espalhando uma série de mentiras sobre a lei. Uma delas afirma que os motoristas receberão, no máximo, R$ 32,09 por hora trabalhada, o que é falso.

Valor mínimo ou máximo?

A inflamação de setores que buscam simplesmente agitar trabalhadores contra o governo por questões ideológicas ignora a realidade. E, embora a verdade passe longe de muitos discursos destes agentes políticos, muitos trabalhadores acabam acreditando. Então, cresce o movimento de motoristas de plataformas que realizam manifestações pelo país. Na última semana, em São Paulo, mais de 300 carros pararam a zona oeste da capital. Entre as reivindicações, a de que eles ganham mais do que os R$ 32,09 e não querem limitar a isso.

Mas o que a lei fala sobre este valor é que ele é um mínimo. Ou seja, enquanto o motorista estiver disponível, mesmo sem corrida, este valor é de recebimento garantido. Assim, a realidade é diametralmente oposta ao pregado pelos bolsonaristas. Não é máximo, mas mínimo. Os ganhos por corrida seguirão.

Sem mentiras

“É preciso reforçar que o valor de R$ 32,10 por hora trabalhada, previsto no PLC, será pago, obrigatoriamente, pelas plataformas e é uma renda mínima para o motorista. Não deverá servir de teto para o rendimento. A renda, portanto, passa a ter uma garantia de piso salarial nacional para que todos os trabalhadores e trabalhadoras do setor, em todas as cidades do país, tenham o mesmo rendimento”, explica em nota a CUT, que participou dos debates para elaboração do projeto.

A entidade lembra que, hoje em dia, em muitas cidades, o valor da hora paga pelos aplicativos gira em torno de R$ 20. “A plataforma não pode usar os R$ 32,10 como teto e se usar, terá multa para plataforma. O sindicato é que vai fiscalizar, receber denúncias e acionar a empresa”, diz a presidenta do Sindicato dos Motoristas Particulares por Aplicativos do Rio Grande do Sul (Simtrapli-RS), Carina Trindade.

Na última sexta-feira (5), centrais sindicais se manifestaram em defesa do PLP 12/2024, à espera de tramitação na Câmara. O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, criticou a “desinformação” sobre o tema.

Proteção social

Outra investida contra o PL dos aplicativos tem relação com a proteção social. O argumento insistente dos ultraliberais afirma que o fato de haver proteção do trabalhador implica em menores ganhos. Não é bem assim. De fato, a nova lei propõe a inserção destes trabalhadores no regime de Previdência. É importante pensar que nem sempre o trabalhador poderá recorrer às jornadas abusivas de hoje, que ultrapassam 10 a 12 horas por dia. Se ele ficar doente, hoje, não existe amparo. A lei garante algo diferente.

“O PLC é comemorado por motoristas que têm a consciência da necessidade de se ter proteção social, ou seja, poder, por exemplo, recorrer à Previdência em situações que precise se afastar do trabalho por doença ou acidentes”, informa a CUT. A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) também explica, em artigo recente, como será essa proteção. “Haverá contribuição de 7,5% sobre seu salário para o INSS. Uma complementação de 20% será de responsabilidade da empresa, em cima do valor-base”, explica.

“No fim do mês, a remuneração, com base na jornada de oito horas de trabalho, durante 22 dias no mês, será de R$ 5.649,60. Caso houver acordo com o coletivo, a jornada pode chegar até 12 horas diárias, entretanto, a conexão do trabalhador a uma mesma plataforma não poderá ultrapassar esse limite”, completa.

A secretária de Finanças da CNTE, Rosilene Corrêa, lembra que “ao fazer isso, o atual governo demonstra que a classe trabalhadora, em sua totalidade, terá respeito”. “Vivemos uma nova era do mundo do trabalho que nos impõe mudanças, mas essas novidades não podem, nunca, estarem atreladas ou representarem um retrocesso na garantia da qualidade de vida de qualquer trabalhador”, completa.

Mais mentiras

A CUT fez um levamento das principais mentiras dos bolsonaristas sobre o tema. Além das já ditas, segue uma lista desmentindo outras falácias:

* A mentira: “Com o PL dos aplicativos, as plataformas vão sair do Brasil”

A verdade: não há chance de as plataformas saírem do Brasil. Elas participaram da mesa de trabalho e deixaram claro que não farão isso. Isso porque o Brasil é um dos maiores mercados no mundo para elas. Se saírem, a concorrência tomará o lugar e isso as plataformas não querem”

* A mentira: “Nós motoristas não fomos ouvidos sobre o projeto”

A verdade: durante a elaboração do projeto houveram assembleias nos sindicatos, audiências públicas municipais, estaduais e em nível nacional, além de pesquisas para saber o que o trabalhador queria. Houve manifestações de motoristas em 18 estados de onde saíram as pautas que se transformaram em um documento que foi levado à mesa de negociação”

* A mentira: “A corrida vai ficar mais cara com o PL”

A verdade: as corridas não ficarão mais caras. As plataformas trabalharam no limite do que podiam para negociar o valor mínimo de renda, justamente para não onerar os passageiros. Hoje as corridas estão até quatro vezes mais baratas do que um taxi, por exemplo. Mas, se houver um aumento, será irrisório. E além disso com valor maior, o próprio trabalhador ganharia mais.

* A mentira: “Vou ter que pagar sindicato”

A verdade: desde 2018 a contribuição sindical é facultativa, ou seja, trabalhador contribui se quiser. E para contribuir, tem que estar filiado ao sindicato, participar das lutas, da própria da vida do sindicato. E é assim que a classe trabalhadora garante direitos.

* A mentira: “Vou ter que trabalhar oito horas por dia e não vou poder fazer meus horários. Vou perder minha autonomia”

A verdade: a carga horária limite por plataforma já existe. A partir de oito horas ela bloqueia o motorista por seis horas. O PL determina limite de oito horas podendo chegar a doze. Com o PL aprovado, ninguém terá que fazer um mínimo de horas. Poderá trabalhar quatro, seis, oito. E se for bloqueado após o limite de 12 horas, vai poder se conectar a outra plataforma e continuar trabalhando. O PL não tira a autonomia de nenhum motorista. 

* A mentira: “A plataforma vai parar de me direcionar corrida quando eu atingir o salário mínimo”

A verdade: as plataformas vivem do valor que descontam do motorista, da porcentagem de cada corrida. Quanto menos corridas fizer, menos a plataforma vai ganhar. Além disso, no projeto há uma cláusula que não permite que a plataforma suspenda ou boicote o motorista sem justificativa antecipada. Se fizer, haverá pena.