desigualdade

Pesquisa mostra que fome é maior em lares chefiados por mulheres negras

De todas as famílias que passam fome no Brasil, 39,5% são chefiadas por mulheres negras. Essa desvantagem aparece também no recorte dos lares chefiados por pessoas com oito anos ou mais de estudo. A falta de alimentos foi maior quando uma mulher negra estava à frente: 33%

Leonardo França/BDF
Leonardo França/BDF
País precisa reconhecer a intersecção entre o racismo e o sexismo na formação estrutural da sociedade brasileira. E assim qualificar e implementar políticas públicas

São Paulo – De todas as famílias que passam fome no Brasil, 39,5% são chefiadas por mulheres negras. E 34,3%, por homens negros. Esse recorte de raça e gênero na insegurança alimentar grave é destaque entre os dados do período entre novembro de 2021 e abril de 2022, lançados nessa segunda-feira (26), como parte do 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil (II Vigisan).

Essas famílias aparecem também em desvantagem em outras abordagens. É o caso dos lares chefiados por pessoas com oito anos ou mais de estudo. A falta de alimentos foi maior quando uma mulher negra estava à frente: 33%. Esse número foi menor no caso de homens negros (21,3%), mulheres brancas (17,8%) e homens brancos (9,8%).

O viés de raça apareceu também em situações em que o chefe da família tinha emprego formal, embora com renda mensal familiar maior do que um salário mínimo per capita. A segurança alimentar estava presente em 80% dos lares chefiados por pessoas brancas e em 73% dos chefiados por pessoas negras.

Racismo, sexismo e a fome no Brasil

A presença de crianças menores de 10 anos de idade nas famílias também foi um fator importante. Nesse contexto, a segurança alimentar era uma realidade em apenas 21,3% dos lares chefiados por mulheres negras, menos da metade dos chefiados por homens brancos (52,5%) e quase metade das chefiadas por mulheres brancas (39,5%). 

“A situação de insegurança alimentar e de fome no Brasil ganha maior nitidez agora. Precisamos urgentemente reconhecer a intersecção entre o racismo e o sexismo na formação estrutural da sociedade brasileira, implementar e qualificar as políticas públicas, tornando-as promotoras da equidade e do acesso amplo, irrestrito e igualitário à alimentação”, disse a professora Sandra Chaves, coordenadora da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan).

A Rede Penssan é responsável pelo inquérito, que leva em conta dados registrados pelo Instituto Vox Populi, com apoio da Ação da Cidadania, ActionAidFord Foundation, Fundação Friedrich Ebert Brasil, Ibirapitanga, Oxfam Brasil e Sesc São Paulo.

Fome é maior entre as famílias negras

No total, 33,1 milhões de pessoas foram afetadas pela fome no Brasil. Aqueles que se enquadram em recortes de raça e gênero estão mais vulneráveis. Os lares chefiados por mulheres negras representam 22% dos que sofrem com o problema, quase o dobro em relação aos liderados por mulheres brancas (13,5%).

Em termos gerais, a fome atinge um quinto das famílias chefiadas por pessoas autodeclaradas pardas e pretas no Brasil (20,6%). Esse percentual é duas vezes maior quando comparado ao de famílias comandadas por pessoas brancas (10,6%).

Em dados gerais divulgados anteriormente, o estudo mostrou que quatro entre 10 famílias tinham acesso pleno a alimentos, ou seja, em condição de segurança alimentar. Por outro lado, 125,2 milhões estavam na condição de insegurança alimentar, seja leve, moderada ou grave. Os níveis foram medidos pela Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (Ebia), também usada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Redação: Cida de Oliveira – Edição: Helder Lima