Violência sexual

Frigorífico é condenado a indenizar trabalhadora que foi estuprada por supervisor

Violência começou dentro da própria empresa, analisou juiz, que viu omissão do empregador. Ele se baseou em protocolo do CNJ sobre perspectiva de gênero

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São Paulo – A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) condenou um frigorífico no Paraná a indenizar uma ex-funcionária vítima de assédio e estupro cometido por um supervisor. Os magistrados viram responsabilidade da empresa no episódio e fixaram indenização equivalente a 100 salários mínimos (R$ 132 mil) por danos morais e mais R$ 6 mil por danos patrimoniais, entre outros itens. O caso corre em segredo de Justiça.

“A mulher foi vítima de assédio, estupro e violência praticados pelo seu superior”, afirma o TST. Isso aconteceu quando ela voltava para casa, após perder o transporte fornecido pela empresa porque havia trabalhado além do horário, por ordem do próprio chefe. Segundo o processo, enquanto a funcionária esperava carona, ele a forçou a entrar no carro e a levou até um motel, “onde foi vítima de estupro e violência física e verbal”. 

Trauma e depressão

“Depois da violência, a mulher passou a sofrer de estresse pós-traumático e transtorno depressivo. No entendimento dos ministros que integram a Sétima Turma, a empresa foi omissa em apurar a conduta do empregado, acusado de assediar também outras funcionárias”, relata o TST. “Na decisão, foi aplicado o Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O protocolo prevê que, para casos que envolvam assédio e violência sexual no ambiente de trabalho, os indícios e o depoimento da vítima ganham maior relevância.”

Depois do episódio, a empregada afirma ter procurado a equipe de RH. Mas teria sido aconselhada a não registrar boletim de ocorrência. Ela não trabalhou mais no frigorífico. Ficou afastada por 15 dias, e em seguida passou a receber auxílio-doença. Em 4 de abril de 2011, pediu demissão. “Perícia médica constatou que ela desenvolveu estresse pós-traumático e transtorno depressivo que, segundo o laudo, tiveram origem ‘a partir de um trauma importante, uma ameaça à vida’.”  

“Semblante de pavor”

Já o frigorífico negou ter havido conduta delituosa. Se houve algum problema entre o supervisor e a funcionária, alegou, “não foi no horário de trabalho, no ambiente de trabalho ou em razão do trabalho”. Na primeira instância, a Justiça considerou a empresa “confessa” quanto ao estupro, porque sua representante afirmou que o episódio foi informado à gerente de RH e existiam relatos de outros casos.

Assim, a sentença considerou nulo o pedido de demissão e reconheceu a rescisão indireta (“justa causa” do empregador), além do direito da funcionária receber verbas rescisórias, saque do FGTS e seguro-desemprego. O frigorífico foi condenado a pagar indenização de R$ 30 mil por danos morais e R$ 6 mil por danos materiais (gastos com tratamento psiquiátrico). A juíza citou “o semblante de pavor”, “o choro ininterrupto”, “os tremores de mãos” e “a ansiedade no falar” da trabalhadora, durante seu depoimento no processo.

Omissão do empregador

A empresa recorreu, então, à segunda instância (Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região). O TRT do Paraná reconheceu o assédio, mas não o estupro, por falta de abertura de inquérito e prova testemunhal considerada frágil. Foi a vez de a trabalhadora recorrer, e o caso chegou então ao TST.

“Ao examinar o recurso, o relator, ministro Agra Belmonte, entendeu que, diante das próprias circunstâncias narradas na decisão do TRT, revela-se haver, sim, provas da conduta omissiva da empresa, que não fiscalizou ou averiguou a ocorrência de assédio sexual por um de seus funcionários, ocupante de cargo de chefia, a demandar a necessidade de reenquadramento”, informa o tribunal. Para o magistrado, a violência sexual começou dentro da empresa, quando o supervisor determinou que a empregada ficasse até mais tarde. 

Medo de represália

Ele acrescentou que a ausência de processo penal não é fato incomum em casos dessa natureza. Isso porque grande parte das vítimas tem “verdadeiro pavor em expor a agressão sofrida e enfrentar represálias, o que, no caso dos autos, fica ainda mais palpável, por tratar-se de situação envolvendo superior hierárquico”. Além do protocolo do CNJ, o relator se baseou na legislação nacional e em convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT)

Na sentença, voltou a ser declarada a nulidade do pedido de demissão feito pela funcionária, com reconhecimento de culpa da empresa (rescisão indireta). Além disso, a Sétima Turma determinou que fosse expedido ofício ao Ministério Público do Trabalho para apuração.


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