Na resistência

Visibilidade Trans: 18 anos após a criação da data, um longo caminho ainda a percorrer

Celebrada em 29 de janeiro, data marca a luta de travestis e transgêneros pela própria existência, mas também revela a força e determinação de resistir em busca de avanços e visibilidade

Tomaz Silva/EBC
Tomaz Silva/EBC
"Temos muitas coisas para conquistar. Mas a nossa prioridade é que as nossas lutas já conquistadas aconteçam de fato", observa Symmy Larrat

São Paulo – O Dia Nacional da Visibilidade Trans, celebrado ontem, 29 de janeiro, completa 18 anos desde a sua criação, em 2004. Considerada uma das primeiras iniciativas com foco no combate à transfobia no Brasil, a data nasceu com um ato nacional que lançou a campanha “Travesti e Respeito”, passando a marcar a luta de travestis e transgêneros pela garantia de direitos como acesso à saúde, ao trabalho e ao reconhecimento da identidade social. Mas, quase duas décadas depois, os avanços ainda seguem a passos lentos. 

Esta ainda é a parcela da população que mais sofre violência de todos os tipos: moral, psicológica, social e física. Segundo dossiê da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), o Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo, com 175 mortes mapeadas apenas em 2020. A presidenta da Nova Associação de Travestis e Pessoas Transexuais de Pernambuco (Natrape), Samantha Cabral, comenta que a luta da população trans é por existir, uma vez que a sociedade ainda insiste em invisibilizar corpos transgêneros e travestis.

“O cerne da questão é que nós não somos vistas como pessoas. Adjetivos perversos colocam que nós somos demônios, que precisamos ser exterminadas dessa sociedade. É muito difícil viver em um país em que pessoas trans não são vistas como pessoas”, lamenta a presidenta da Natrape. Além da violência física há ainda o desrespeito aos pronomes de tratamento, como veio a público recentemente em um reality show brasileiro no qual a cantora e atriz Linn da Quebrada não foi respeitada ao não ser chamada pelo pronome feminino. 

Luta pelo existir

Presidenta da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT), Symmy Larrat, avalia que a sociedade tenta impor normas. Ela é categórica ao explicar que não é o órgão sexual que determina quem você é ou aonde pode ir. Para a presidenta da ABGLT, o fato de ter que pedir para que os outros a respeitem e usem o pronome certo está dentro do contexto de uma sociedade opressora.

“A gente tem que parar e partir do princípio que é: uma parte do meu corpo não pode determinar quem eu sou e não pode determinar onde eu posso acessar e onde não posso acessar. No nosso caso, um órgão interno não é o que vai determinar quem eu sou. E é muito opressor quando a cisgeneridade nos obriga a ser e performar o que ela quer que a gente performe. É muito cansativo impor a nós o papel de educar sobre tudo isso”, ressalta Symmy. 

Resistência transcestral

Neste cenário, além da luta pela própria existência, há também a força e a determinação de resistir a todo o preconceito, seja ele velado ou escancarado. Em 18 anos da criação do Dia da Visibilidade Trans, muito foi conquistado pela luta da população trans. Porém, de acordo com a presidenta da ABGLT, ainda é preciso fazer valer o que já foi garantido. “Temos muitas coisas para conquistar. Mas a nossa prioridade é que as nossas lutas já conquistadas aconteçam de fato”, observa.

“Não adianta ter a transfobia criminalizada se eu chego em uma delegacia e não tem um campo para colocar o nome social para eu me identificar como pessoa trans. Ou não ter um campo que tipifique o crime como transfobia. Porque ele está abarcado na lei do racismo e isso se perde no bojo de dados do racismo em geral. Então não tem uma orientação, um procedimento padrão para investigação desse caso e isso é em tudo”, completa. 

Enfrentamento de todes

Lutar por direitos é o que move a sociedade a ter esperança em tempos melhores. Para Samantha Cabral da Natrape, é importante ter representatividade LGBT em todas as esferas do governo. Mas, além disso, é preciso que as pessoas que não fazem parte da população LGBTQIA+ também abracem a causa e lutem lado a lado.

“Precisamos de pessoas que abracem nossas causas, nos fortaleça para que a gente possa aprovar em todos os âmbitos – nacional, estadual e municipal – leis que garantam nossa existência. Nós precisamos de proteção e de políticas afirmativas que nos insiram porque não estamos dentro dos âmbitos sociais essenciais para que possamos ser uma população emancipada. Nós não estamos na escola, na universidade, nas empresas. Então precisamos urgentemente desse movimento não apenas de pessoas trans. Precisamos da construção de políticas públicas efetivas que coloquem as pessoas trans em espaços devidos”, conclui.

Leia mais:

Brasil registrou 140 assassinatos de pessoas trans em 2021

Confira a reportagem


Leia também


Últimas notícias