‘Conclusão está calcada em documentos da própria ditadura’, diz Fonteles sobre morte de Rubens Paiva

Coordenador da Comissão da Verdade diz que próximo passo será localizar e interrogar personagens envolvidos na morte do ex-deputado, cujo paradeiro permanece desconhecido

São Paulo – “Foi um trabalho fortemente calcado em documentos produzidos pelo próprio Estado ditatorial militar”, definiu hoje (4) o coordenador da Comissão Nacional da Verdade (CNV), Cláudio Fonteles, o estudo de sua autoria que pretende desmontar a versão oficial sobre a morte de Rubens Paiva. O ex-deputado desapareceu em 20 de janeiro de 1971 após ter sido preso por agentes do Centro de Informações de Segurança na Aeronáutica (Cisa) em sua casa, no Rio de Janeiro, e levado à sede carioca do DOI-Codi, órgão de repressão política e centro de torturas do Exército.

Após se debruçar sobre evidências oficiais encontradas no Arquivo Nacional, Fonteles chegou à conclusão de que Rubens Paiva foi assassinado dentro das dependências militares. “Tudo o que apresento possui provas documentais assinadas pelos próprios serviços secretos da ditadura. Por isso é que concluo que ele foi morto no DOI-Codi.”

Ao divulgar o estudo antes do término dos trabalhos da CNV, que devem ser encerrados apenas em maio de 2014, Cláudio Fonteles dá continuidade às revelações que vem fazendo paulatinamente, e que se originam das pesquisas que realiza no Arquivo Nacional. “Já escrevi mais de 100 páginas, sobre vários casos, e todas estão disponíveis no site da Comissão Nacional da Verdade.” A intenção, diz, é estabelecer um diálogo com a sociedade.

“A divulgação se encaixa dentro da filosofia que nos anima. Acreditamos que a CNV, sozinha, não vai a lugar nenhum. Os textos são apresentados em meu nome para criar um grande debate em torno do tema. Assim, as pessoas se envolvem.” E a participação da cidadania será essencial para a próxima etapa do caso Rubens Paiva, complementa Fonteles, adiantando que a Comissão da Verdade está de portas abertas para receber denúncias ou documentos ainda não revelados, e que podem levar à identificação dos algozes de Rubens Paiva ou ao paradeiro de seu corpo. “Não precisa dizer o nome, basta mandar pra gente aqui na CNV, entregar na portaria.”

Convocações

Além da colaboração da sociedade, outra maneira de estabelecer a verdade sobre o episódio seria por meio de interrogatórios. “O próximo passo será inquirir os personagens que cito na documentação, saber se ainda estão vivos e convocá-los para uma oitiva”, prevê Cláudio Fonteles, que conversou com a RBA por telefone hoje após uma coletiva de imprensa concedida na sede da CNV, no Centro Cultural Banco do Brasil, em Brasília.

O coordenador do grupo também falou sobre as relações que vem mantendo com as forças armadas. “A colaboração está bem”, frisou. “Estamos em processo de diálogo bastante forte. Ninguém tem nada contra as forças armas ou a polícia. São instituições fundamentais para o sistema democrático e que não podem ser manchadas pela ação que alguns maus servidores tomaram no passado.”

Fonteles aponta que uma nova leva de documentos da época da ditadura deve ser desclassificada pelas forças armadas até o final de fevereiro e enviadas ao Arquivo Nacional para pesquisa. “Hoje os quadros militares apontam no sentido da profissionalização e não da intervenção nas querelas político-partidárias do país.”

Finalmente, o coordenador da CNV falou sobre o estado de saúde de seu antecessor no cargo, o ministro do Superior Tribunal de Justiça Gilson Dipp, que se afastou das investigações em 5 de outubro e desde então se encontra internado no Hospital Albert Einsten, em São Paulo. “Conversei com sua esposa na última quinta-feira (31) e ela apresenta notícias muito boas de sua recuperação. Dipp teria alta no final de fevereiro. Tomara que sim.”