Difamação deve deixar de ser crime, diz relator da ONU sobre liberdade de expressão

São Paulo – “Para mim, difamação sequer deveria ser um delito”, defendeu ontem (14) o relator especial das Nações Unidas para Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião […]

São Paulo – “Para mim, difamação sequer deveria ser um delito”, defendeu ontem (14) o relator especial das Nações Unidas para Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão, Frank de la Rue, durante conversa com organizações da sociedade civil em São Paulo. “Deveríamos despenalizar a difamação e convertê-la apenas em ação civil. E os funcionários públicos jamais deveriam poder utilizá-la para silenciar as críticas, mesmo que sejam críticas mal intencionadas e grosseiras.”

As declarações de Frank de la Rue, guatemalteco que ocupa a Relatoria Especial da ONU desde 2008, vieram junto com críticas ao presidente do Equador, Rafael Correa, que no final de 2010 processou judicialmente, por difamação, um articulista do diário El Universo, maior jornal do país, e seus diretores. Emilio Palacio havia acusado o mandatário de crimes de lesa-humanidade ao deixar-se resgatar por tropas de elite do Exército equatoriano dentro de um hospital de Quito. Correa recebia atendimento médico após ser agredido por policiais amotinados que, armados, não estavam permitindo que o presidente deixasse o local.

“Recorrer ao processo judicial não é forma de uma figura pública responder às críticas”, continua o relator. “A resposta deve vir com argumentos, nunca com censura. A liberdade de expressão e a comunicação são as melhores alternativas, sempre.” No caso equatoriano, Rafael Correa venceu a ação. Emilio Palacio e os diretores do El Universo foram obrigados a pagar uma indenização de US$ 40 milhões – compromisso com o qual obviamente não puderam honrar. Mais tarde, o presidente perdoaria a dívida. Atualmente, o jornalista se encontra exilado nos Estados Unidos. “Os meios de comunicação podem ter posições editorais de qualquer natureza e, ainda assim, devem ser respeitados”, insistiu De la Rue.

De acordo com a legislação brasileira, a difamação é uma modalidade de crime contra a honra e, como tal, está prevista no Código Penal. Também é uma figura jurídica reconhecida pelo Código de Processo Civil. Isso significa que as denúncias de difamação podem ter curso em duas vias – criminal e civil – e redundar em dois tipos de condenção: prisão e indenizações. No país, a proposta de Frank de la Rue não impediria que jornalistas, colunistas ou quem quer que seja fosse processado por difamação. Porém, evitaria que alguém condenado como “difamador” fosse para a cadeia. As indenizações continuariam. Na impossibilidade de pagá-las, o réu perderia seus bens.