Marta Suplicy vê conquistas das mulheres em ritmo mais lento que o desejado

Marta: transformações vagarosas (Foto: Agência Senado/Arquivo) São Paulo – A vice-presidenta do Senado, Marta Suplicy (PT-SP), incorpora há tempos o lema repetido inúmeras vezes durante a campanha presidencial que levou […]

Marta: transformações vagarosas (Foto: Agência Senado/Arquivo)


São Paulo – A vice-presidenta do Senado, Marta Suplicy (PT-SP), incorpora há tempos o lema repetido inúmeras vezes durante a campanha presidencial que levou Dilma Rousseff a suceder o presidente Lula em 2010: “mulher pode.” No entanto – e apesar de reconhecer os avanços conquistados pelas mulheres pelo reconhecimento de seus direitos – ela mantém o foco na necessidade de ampliar a luta, sob risco de retrocesso.

Ela diz que, numa sociedade em que predomina a presença masculina nos cargos de decisão, políticas e práticas que levem em conta a condição de desigualdade vivida pelas mulheres tendem a ser instauradas em ritmo muito lento. Mais lento, aliás, do que a própria Marta imaginava, quando passou a ser figura pública e destacada, já há três décadas.

Leia a seguir, a entrevista da senadora à Rede Brasil Atual:

Que perspectiva, do ponto de vista da defesa dos direitos das mulheres, se tem com duas mulheres nas vice-presidências da Câmara e do Senado?

Termos uma mulher na vice-presidência da Câmara (Rose de Freitas/PMDB-ES) e outra na vice-presidência do Senado, não tenho nenhuma dúvida, tem tudo a ver com termos eleito a primeira mulher para a Presidência da República.

Há quantos anos existe o Congresso, sem nunca ter tido uma mulher na Mesa Diretora da Câmara, nem do Senado. Mesmo que sejamos muito poucas, uns 10% [do Congresso], a própria questão de gênero implicaria em ter uma presença feminina [maior nas duas casas]. Afinal, somos 50% da população.

Mas acredito que agora, mesmo sendo menos numerosas, os atos, as ações, a percepção da necessidade de se ter uma mulher nesse ambiente até então de poder masculino ficou muito evidente. Acho que ninguém mais tem vontade de ver uma mesa, em qualquer tipo de reunião, onde não se tenha uma mulher presente. Isso tende a ocorrer cada vez menos.

Na hora em que você leva uma mulher para a Presidência da República mostra que o país está preparado para as mulheres ocuparem cargos de poder. Não vou dizer que vá depender de nós mesmas, porque não seria verdade. São questões que vamos ter que enfrentar.

Ao mesmo tempo, penso nas meninas e nas jovens – que nunca viram uma mulher desempenhando uma função no poder – terem agora uma presidenta. Isso incorpora nelas uma frase que a Dilma dizia na campanha: “mulher pode”.

Na hora em que você vê no cargo máximo da República uma mulher, não vai passar na cabeça das meninas que elas não podem ocupar qualquer espaço. Parece simplório, mas não é, porque acaba introjetando que você não tem mais um teto, um limite.

Em relação à reforma política, é possível introduzir mecanismos que garantam mais participação das mulheres no Legislativo?

Acho que sim. Tanto que os homens na política estão ficando um pouco mais constrangidos de fechar espaços, porque passam a ser cobrados. Por que não tem uma mulher na chapa? Onde estão as mulheres? Tudo isso acaba mudando a cultura. Se fosse ver, algum tempo atrás talvez não fosse esperado, ninguém estaria cobrando nada. Mas, a partir da Presidência da República com uma mulher, vão passar a cobrar [a presença feminina nesses espaços políticos].

Pensando em termos de leis e políticas públicas voltadas à promoção da igualdade de gênero. Essa transformação, tende a favorecer essas políticas públicas?

Nada é rápido, mas tudo ajuda. A presença da mulher na Presidência, na Mesa Diretora, com mais gente se interessando, claro que vai ajudar. Agora, por que não temos hoje o preenchimento das cotas partidárias? Primeiro porque não tem punição para os partidos. Eles dizem que a mulher não se interessa. Em parte, é verdade, porque elas têm menos recursos. Se vai ser deputada federal e tem criança pequena, é muito difícil levar filhos e marido [para Brasília], o que não ocorre com o homem.

Então, a questão cultural e social já é mais complicada para a candidatura feminina. Agora, você acresce a isso o dia a dia difícil de uma vida política, em que muitas vezes não se tem hora para chegar [em casa], tem reunião no fim de semana, tem marido cobrando, filho querendo atenção. A mulher tem muita dificuldade [para lidar com esses afazeres].

Se você acrescenta a isso também a questão de financiamento – e está mais que provado que mulher tem muito menos recursos para fazer campanha do que homem -, temos um problema sério. Então, o financiamento de campanha pode sim ajudar as mulheres.

E a cobrança da sociedade civil, que a gente acha que vai aumentar, também ajuda. Mas nada é rápido. Essas coisas, aliás, estão sendo muito mais vagarosas do que eu imaginava na época em que fazia o TV Mulher [Rede Globo], 30 anos atrás.