O inimigo n* 1 de François Hollande.

Tornou-se lugar comum na esquerda afirmar que “é necessário derrotar Angela Merkel”. Tenho dúvidas. Não porque duvide do perfil conservador da chanceler alemã. Acontece que ela é apenas a ponta […]

Tornou-se lugar comum na esquerda afirmar que “é necessário derrotar Angela Merkel”.

Tenho dúvidas. Não porque duvide do perfil conservador da chanceler alemã. Acontece que ela é apenas a ponta do iceberg.

Em sua campanha, François Hollande disse que seu inimigo principal eram os bancos, o sistema financeiro. Ele está certo.

Mas esse “sistema” – ainda que impessoal – tem rosto. Ou melhor, rostos.

Em geral são simpáticos, afáveis, gentis, jovens ou de meia idade, mas no seu campo são mais duros do que zagueiro de várzea e mais ortodoxos do que rótulo de Maizena, cokmo diria o Analista de Bagé.

Tomo um exemplo: Jens Weidmann, diretor do Bundesbank, o Banco Central Alemão.

Weidmann veio a campo neste fim de semana alertar os demais bancos que eles devem evitar se comprometer mais com a Grécia antes das novas eleições marcadas para 17 de junho. E os gregos devem escolher: ou ficar na zona do euro e engolir o pão que o Banco Central Europeu amassou, ou se afogarem por conta própria. Aquilo que antes era uma tragédia impensável, virou agora uma ameaça à soberania de um povo.

Algo de pessoal nisso? Nem pensar. Jens Weidmann tem 44 anos, e é o típico economista de “nova geração”. Formado no meio ultra-conservador das faculdades de economia e administração da Alemanha, pertence a uma geração e a uma formação para a qual o mais importante é o figurino, não o usuário. Se o colarinho está muito apertado e ameaça sufocar o usuário, dane-se este: o importante é manter o figurino.

“Obedecer as regras das políticas monetárias voltadas para a estabilidade, muitas das quais estão inscritas no tratado da União Européia, não é uma obsessão legalista: é a chave para a aceitação da união monetária dos cidadãos europeus”, escreveu ele recentemente no Financial Times (07/05/2012). Diz ele ainda que não obedecer a essas limitações seria “ignorar as lições da crise financeira”.

Para ele o pior seria diminuir muito as taxas de juros, combinando isso com uma intervenção no mercado financeiro. Através de uma política de “simetria constante”, evitando mudanças sazonais, o sistema financeiro como um todo induziria os sistemas financeiros a reformar seus “business models”. É necessário incentivar a retenção de ganhos para acrescer o capital.

Nesse quadro, continua, “alguns políticos podem sofrer a tentação de negar medidas impopulares e tentar resolver os problemas através de uma acomodação monetária. Cabe aos que definem as políticas monetárias resistir a tais pressões”.

Ou seja: são os heróis solitários dos gabinetes dos mundos financeiros que devem – e só eles – moldar o futuro.

Todo esse manancial ortodoxo é o resultado de um meio ambiente de formação que sufoca alternativas, abafa a imaginação e, ao fim e ao cabo, destrói a inteligência.

Por isso, embora o Banco Central Alemão tenha sua diretoria executiva nomeada pelo governo (50% pelo presidente, 50% peloo Conselho da República), onde o peso da (do) chanceler é evidente, fica a dúvida de quem pertence a quem.

A luta é para derrotar gente como Weidmann, não apenas Merkel. Até porque esta tem um instinto de sobrevivência notável e, dentro de certos limites, irá para onde o vento sopre.

Desde que sopre, é claro.