Flávio Aguiar

Bolsonaro: a opacidade mais transparente do mundo

Esse governo é um poço sem fundo de perguntas sem respostas e sobre ele paira um cheiro de podridão

Marcos Corrêa/PR
Marcos Corrêa/PR
Há praticamente um ano e meio no poder, Jair Bolsonaro comanda a falta de governo no Brasil: um poço de mentiras, falsas verdades e desmentidos

Nunca um governo foi tão opaco, “instransparente”. E nunca uma opacidade foi tão transparente. Tudo é mistério, negação, negaceio no governo Bolsonaro. E nunca foi tão claro que, como na Dinamarca de Hamlet, há algo de podre dentro, fora e nos arredores do Palácio do Planalto. Algo, não: tudo.

O último negaceio envolve o já famoso e esperado vídeo da fatídica reunião ministerial de 22 de abril. Virá a público? Não virá? Se vier, virá editado? Em pedacinhos? Em pedações?

Mas já se sabe que se trata de uma missa fúnebre da decência, do decoro, das boas maneiras, da língua portuguesa, de tudo, enfim, que os membros do governo desprezam quase em uníssono. Os comentários de quem conhece o conteúdo do vídeo, seja porque estava lá ou porque o viu depois, são eloquentes: “insanidade”, “insensatez”, “parece um bordel”, o que não deixa de ser injusto em relação aos bordeis.

Ficam dúvidas no ar: qual terá sido o comportamento da Musa do Veneno? Do Mourão? Porque a propósito do comportamento do presidente, do Weintraub, da Damares, do Guedes, além de outros, não há quaisquer dúvidas: foi de deplorável para pior.

E há a questão da PF (que virou Prato Feito) do Rio. Do Flávio e do Queiroz. Do condomínio no Rio. Do porteiro do condomínio. Do telefonema no condomínio. Da visita no condomínio. De quem respondeu ao telefonema do porteiro. De quem sabia o quê no condomínio. Do cartão corporativo da Presidência, cujo extrato ninguém sabe, ninguém viu, ninguém pode saber nem ver.

E há a medida provisória inocentando erros durante a pandemia. E há a questão dos misteriosos exames de coronavírus do presidente, com nomes falsos e pelo menos um deles sem qualquer identificação possível. E a insistência em escondê-los, que prossegue, com a recusa de entrega-los à Câmara de Deputados.

E há a questão do papel do Moro em tudo isto. O denunciante que foi cúmplice. O dedo duro que acusa primeiro para que se busquem as provas depois. Proporá ele uma delação premiada para se esquivar?

E há a fraude e as fake news na eleição. E o papel da PF nela. O do Moro é sabido. E foi recompensado, embora depois defenestrado.

E o assassinato do ex-cúmplice e amigo, Adriano da Nóbrega, na Bahia.

E a suspeita de que o produtor de cloroquina é favorecido pela propaganda de Bolsonaro, já que é amigo deste.

E há outros mistérios colaterais: onde foi parar a inteligência de Ernesto Araujo? A ojeriza dele, do Weintraub, do Dudu Hambúrguer e de outros pela China será somente ideologia cega, apenas servilismo a Washington, ou haveria outros interesses por detrás?

Em resumo, o governo Bolsonaro é um poço sem fundo de perguntas sem respostas. A única certeza é a de que tudo o que ele alega não é verdadeiro. E que em tudo paira um nauseabundo cheiro de podridão. Misturado com cloroquina.