Golpista

Se Anderson Torres não retornar até segunda, governo vai pedir extradição. Leia íntegra da minuta golpista

Situação do ex-ministro de Bolsonaro ficou delicada após a descoberta da minuta de decreto que previa um golpe de caráter militar contra TSE para anular o resultado da eleição

Marcos Corrêa/PR
Marcos Corrêa/PR
"Tudo seria levado para ser triturado oportunamente no MJSP", escreveu ex-ministro

São Paulo – O retorno ao Brasil do ex-secretário de Segurança do Distrito Federal, Anderson Torres, também ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, era inicialmente esperado para esta sexta-feira (13). Ele desembarcaria para chegar ao Brasil e se entregar à Polícia Federal (PF), após a decretação de sua prisão preventiva pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, por “omissão dolosa e criminosa” diante dos ataques terroristas em Brasília no último domingo (8).

Mas não se sabe mais se o desembarque será mesmo hoje, com a súbita revelação na quinta-feira (12) da minuta de um decreto descoberto pela Polícia Federal na casa do próprio Torres, em última instância assinado pelo então presidente da República, que previa intervenção no Tribunal Superior Eleitoral (leia a íntegra abaixo). A intenção era que Corte passasse a ser controlada por uma junta militar e o processo que elegeu Luiz Inácio Lula da Silva seria anulado.

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O ministro da Justiça, Flávio Dino, declarou hoje que, se o ex-ministro de Bolsonaro não se apresentar até segunda-feira (16), o governo adotará medida drástica. “Nós desejamos que ocorra, porque isso vai possibilitar o andamento das apurações. Caso a apresentação não se confirme, por intermédio dos mecanismos internacionais, vamos deflagrar na próxima semana os procedimentos voltados à extradição, uma vez que há ordem de prisão”, disse.

Tentando despistar

Antes de o documento ser revelado, Lauro Jardim, em O Globo, informou que Torres tinha iniciado sua viagem de volta ao Brasil, a partir de Orlando (Flórida), mas não em voo da rota Orlando-São Paulo ou Orlando-Brasília. Teria optado por voltar a partir de um aeroporto menos visado, onde chegaria de carro, para evitar exposição, segundo o colunista.

A situação do ex-ministro de Bolsonaro ficou muito delicada. Exige que ele revele quem escreveu o documento, já que até agora, na série de postagens no Twitter, ele parece apenas querer despistar. A armação de uma conspiração bate às portas da mansão nos Estados Unidos em que Bolsonaro está hospedado.

“Havia em minha casa uma pilha de documentos para descarte, onde muito provavelmente o material descrito na reportagem foi encontrado. Tudo seria levado para ser triturado oportunamente no MJSP. O citado documento foi apanhado quando eu não estava lá…”, justificou, acrescentando que o papel foi “vazado fora de contexto, ajudando a alimentar narrativas falaciosas contra mim”.

O documento é inconstitucional a partir da premissa, o de decretar “o Estado de Defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral, em Brasília, Distrito Federal”. Não há previsão na Constituição de um Estado de Defesa na sede de um órgão de outro poder da República, no caso, o Judiciário.

Leia a íntegra da minuta que revelava, na prática, a decretação de um golpe de Estado de caráter militar.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso de suas atribuições que lhe conferem os artigos 84, inciso IX, 136, 140 e 141 da Constituição,

DECRETA: Art. 1° Fica decretado, com fundamento nos arts. 136, 140, 141 e 84, inciso IX, da Constituição Federal, o Estado de Defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral, em Brasília, Distrito Federal, com o objetivo de garantir a preservação ou o pronto restabelecimento da lisura e correção do processo eleitoral presidencial do ano de 2022, no que pertine à sua conformidade e legalidade, as quais, uma vez descumpridas ou não observadas, representam grave ameaça à ordem pública e a paz social.

§1°. Fica estipulado o prazo de 30 (trinta) dias para cumprimento da ordem estabelecida no caput, a partir da data de publicação deste Decreto, podendo ser prorrogado uma única vez, por igual período.

§2°. Entende-se como sede do Tribunal Superior Eleitoral todas as dependências onde houve tramitação de documentos, petições e decisões acerca do processo eleitoral presidencial de 2022, bem como o tratamento de dados telemáticos específicos de registro, contabilização e apuração dos votos coletados por urnas eletrônicas em todas as zonas e seções disponibilizadas em território nacional e no exterior.

§3°. Verificada a existência de indícios materiais que interfiram no objetivo previsto no caput do art. 1° a medida poderá ser estendida às sedes dos Tribunais Regionais Eleitorais.

Art. 2° Na vigência do Estado de Defesa ficam suspensos os seguintes direitos:

I – sigilo de correspondência e de comunicação telemática e telefônica dos membros do Tribunal do Superior Eleitoral, durante o período que compreende o processo eleitoral até a diplomação do presidente e vice-presidente eleitos, ocorrida no dia 12.12.2022.

II – de acesso às dependências do Tribunal Superior Eleitoral e demais unidades, em caso de necessidade, conforme previsão contida no §3º. do art. 1°.

§ 1°. Durante o Estado de Defesa, o acesso às dependências do Tribunal Superior Eleitoral será regulamentado por ato do Presidente da Comissão de Regularidade Eleitoral, assim como a convocação de servidores públicos e colaboradores que possam contribuir com conhecimento técnico.

Art. 3° Na vigência do Estado de Defesa:

I – Qualquer decisão judicial direcionada a impedir ou retardar os trabalhos da Comissão de Regularidade Eleitoral terá seus efeitos suspensos até a finalização do prazo estipulado no § 1°, art. 19,

II – a prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será por este comunicada imediatamente ao juiz competente, que poderá promover o relaxamento, em caso de comprovada ilegalidade, facultado ao preso o requerimento de exame de corpo de delito à autoridade policial competente;

III – a comunicação será acompanhada de declaração, pela autoridade, do estado físico e mental do detido no momento de sua autuação;

IV – a prisão ou detenção de qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada pelo Poder Judiciário;

V – é vedada a incomunicabilidade do preso.

Parágrafo único. O Presidente da Comissão de Regularidade Eleitoral constituirse-á como executor da medida prevista no inciso I, do §3° do art. 136, da Constituição Federal.

Art. 4º A apuração da conformidade e legalidade do processo eleitoral será conduzida pela Comissão de Regularidade Eleitoral a ser constituída após a publicação deste Decreto, que apresentará relatório finai consolidaria conclusivo acerca do objetivo previsto no caput do art. 19.

Art. 5° A Comissão de Regularidade Eleitoral será composta por:

1 – 08 (oito) membros do Ministério da Defesa, incluindo a Presidência;

II – 02 (dois) membros do Ministério Público Federal;

III – 02 (dois) membros da Polícia Federal, ocupantes do cargo de Perito Criminal Federal;

IV – 01 (um) membro do Senado Federal;

V – 01(um) membro da Câmara dos Deputados;

VI – 01(um) membro do Tribunal de Contas da União;

VII – 01 (um) membro da Advocacia Geral da União; e,

VIII – 01 (um) membro da Controladoria Geral da União.

Parágrafo único. À exceção das autoridades constantes do inciso I, cuja indicação caberá ao Ministro da Defesa, as indicações dos membros dos órgãos e instituições que integrarão a Comissão de Regularidade Eleitoral deverão ser feitas em até 24 (vinte e quatro) horas após a publicação deste Decreto no Diário Oficial da União, devendo as designações serem formalizadas em ato do Presidente da Comissão de Regularidade Eleitoral.

Art. 6°. Serão convidados a participar do processo de análise do objeto deste Decreto, quando da apresentação do relatório final consolidado, as seguintes entidades:

I – 01 (um) Integrante da Ordem dos Advogados do Brasil

II – 01 (um) representante da Organização das Nações Unidas no Brasil

III – 01 (um) representante da Organização dos Estados Americanos no Brasil (Avaliar a pertinência da manutenção deste dispositivo na proposta)

Art. 70. O relatório consolidado final será apresentado ao Presidente da República e aos Presidentes do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, e deverá conter, obrigatoriamente:

I – apresentação do objeto em apuração

II – a metodologia utilizada nos trabalhos

III – as contribuições técnicas recebidas

IV – as eventuais manifestações dos membros componentes

V – as medidas aplicadas durante o Estado de Defesa, com as devidas justificativas

VI – o material probatório analisado

VII – a relação nominal de eventuais envolvidos e os desvios de conduta ou atos criminosos verificados, de forma individualizada.

Parágrafo único. A íntegra do relatório final consolidado será publicada no Diário Oficial da União.

Art. 8° Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, de de 2022. 201° ano da Independência 134º ano da República

Jair Messias Bolsonaro

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