PRONUNCIAMENTO

Temer se diz ‘vítima política’, critica Janot e tenta se isolar de Rocha Loures

Na avaliação de parlamentares, presidente demonstrou fragilidade ao procurar passar a imagem de que denúncia é contra Presidência da República e não contra ele, diante de todos os fatos apurados

Lula Marques / AGPT

Temer durante pronunciamento: estratégia equivocada na tentativa de se afastar de Rocha Loures

Brasília e São Paulo – O presidente Michel Temer adotou tom enfático, mas pouco explicativo, para se defender e para justificar o pedido feito ontem (26) pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contra ele – de indiciamento em ação penal pelo crime de corrupção passiva. Temer disse que estava sendo vítima de ódio e de ataques políticos de seus opositores e que o ataque não era exatamente contra ele, mas atingia institucionalmente a presidência da República, o que pegou mal para a sua imagem e foi considerado sinal de fragilidade por parte da oposição, diante de todos os fatos já apurados.

Três fatores, entretanto, marcaram a fala do presidente. O primeiro foi a presença no Palácio do Planalto apenas de parlamentares considerados do chamado baixo clero, ao lado de ministros do Executivo – o que deixou nítida a situação de incerteza dos apoios ao governo. O pronunciamento foi atrasado por quase duas horas, para que chegassem deputados e senadores em quantidade suficiente e, embora o presidente tenha agradecido e confirmado que “se isto fosse uma sessão da Câmara teríamos quórum”, a ausência de líderes de bancadas da base aliada foi vista como negativa.

O segundo fator foi a ausência, também, do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que para muitos soou como um esvaziamento do apoio ao presidente (hoje, o deputado é o principal nome para suceder Temer na presidência). O terceiro foi a tentativa de Temer de, mais uma vez, isolar a denúncia contra o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, seu assessor direto, da denúncia contra ele próprio e buscar um distanciamento do aliado de longos tempos.

O presidente destacou que “se uma pessoa é fotografada ao meu lado e é flagrada cometendo um crime, eu também passo a ser criminoso”, numa referência a Loures. No pedido encaminhado ontem ao Supremo Tribunal Federal (STF), Janot solicitou a abertura de processos contra os dois: Temer e Loures. A fala mostrou que a defesa do presidente pretende repetir à exaustão a estratégia adotada desde o início da divulgação dos áudios que flagraram conversa comprometedora entre ele (Temer) e o empresário Joesley Batista, nos quais os dois discutem pagamento de propina: negar  proximidade com o ex-deputado.

Para integrantes do Judiciário, nada é mais equivocado nesta estratégia, uma vez que Rocha Loures chegou a trabalhar no Palácio do Planalto e sempre foi visto como uma das pessoas mais próximas do governante do país, muito antes dele assumir a presidência da República.

Ataques a Janot

No pronunciamento, Temer ainda fez o que todos esperavam: partiu para o ataque direto ao procurador-geral da República. Afirmou que não vê fundamento jurídico no pedido protocolado contra ele e destacou saber do que está falando, procurando lembrar seu passado como constitucionalista. “Sou da área jurídica, todos sabem. Atuei durante 40 anos como advogado e esse tipo de pedido não tem fundamentação jurídica, mas do ponto de vista político o considero um ataque injurioso e difamante à minha vida pessoal”.

O presidente questionou onde estão as provas concretas de recebimento desses valores e disse que o Código Penal foi reinventado no país, nos últimos tempos, para acréscimo do que chamou de “denúncia por ilação”.

Sobre Joesley Batista, disse que o recebeu no Palácio do Jaburu por saber que se tratava do maior produtor de proteína animal do país e não por partilhar de algum conluio com o empresário. “O fruto dessa conversa consiste numa prova ilícita. Foi o desespero de tentar escapar da cadeia de qualquer forma o que levou o senhor Joesley e seus capangas a armar tudo isso”, acusou.

O fatiamento da denúncia em vários pedidos de abertura de processos contra ele por Janot ao STF foi qualificado por Temer pretexto para que sejam criados fatos semanais contra o seu governo. Em sua fala, afirmou que “querem parar o Congresso Nacional e atingir a presidência da República”. “Quando atacam a presidência, precisam de cautela. A denúncia deveria vir por coleta de provas concretas de crime. É um atentado contra o país”, acrescentou.

O pronunciamento de Temer não foi comentado por Rodrigo Janot, mas foi visto por muitos parlamentares como sinal de que o Palácio do Planalto está acuado. Para o decano dos deputados, o ex-ministro Miro Teixeira (Rede-RJ), a situação é gravíssima. “Nunca vimos isso no país. É uma situação completamente diferente e bem pior da que foi observada nos processos de impeachment de Fernando Collor e Dilma Rousseff. O Congresso precisa agir”, destacou Teixeira.

“Não adianta nos iludirmos com o discurso que o governo procura plantar de que precisamos continuar atuando no país como se tudo estivesse em plena normalidade. Esse é o discurso deles, mas o que sabemos é que o país está asfixiado e o Congresso precisa agir, sob pena de ser acusado de conivência com tudo o que está acontecendo e de fazer obstrução de Justiça”, disse mais cedo o senador Jorge Viana (PT-AC).