Produção fake

Publicitário diz ter sido pago para fazer pergunta a Bolsonaro sobre a TV Globo

Publicitário Beto Viana afirma que foi contratado pelo site bolsonarista ‘Foco do Brasil’ para fingir ser apoiador do presidente e fazer pergunta que o levasse a ser ovacionado

Reprodução / YouTube
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Beto Viana (à dir.) pergunta a Bolsonaro o que ele achou da entrevista de Mandetta à Globo

São Paulo – Mais uma das construções fake do governo Bolsonaro veio à tona nesta terça-feira (20). Um publicitário confessou, em entrevista, que foi pago por um site bolsonarista para atuar com uma pergunta no cercadinho do Palácio da Alvorada, onde o presidente conversa com a imprensa e a população. No dia 13 de abril de 2020, início da pandemia que já matou mais de 685 mil pessoas no país, o presidente disse uma frase que tinha como alvo a TV Globo e o seu então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que seria demitido três dias depois.

Questionado se teria assistido na véspera a entrevista de Mandetta ao programa Fantástico, Bolsonaro respondeu de pronto: “Eu não assisto a Globo”.

A cena — gravada por várias pessoas e imediatamente veiculada nas redes, onde viralizou — foi previamente combinada entre o governo federal e o site bolsonarista Foco do Brasil, afirma o publicitário Beto Viana.Naquele dia, ele figurava como apoiador do presidente e foi o responsável por fazer a pergunta.

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Agora, em entrevista aos jornalistas Gabriela Biló e Ranier Bragon, da Folha de S.Paulo, Viana diz que havia sido indicado por um amigo e contratado, por telefone, por uma pessoa de nome Anderson, do Foco do Brasil, canal bolsonarista criado por Anderson Azevedo Rossi, com 2,9 milhões de inscritos no Youtube.

Aquela segunda-feira, 13 de abril, era o seu primeiro dia de trabalho. Ele relata que Anderson o questionou se ele tinha coragem de fazer uma pergunta ao presidente.

“Aí ele falou: ‘Eu vou mandar a pergunta aí no WhatsApp e você faz essa pergunta pra ele. Se qualquer outro apoiador for falar com o presidente, você corta porque o presidente está esperando essa pergunta sua. Aí ele mandou o texto do jeitinho que era pra eu falar.”

Mensagens de WhatsApp armazenadas no telefone de Viana mostram que, às 8h26 daquele dia, o contato de nome “Anderson Foco do Brasil” mandou mensagens com o texto literal do questionamento e, posteriormente, orientou-o a sempre se fingir de apoiador e buscar não levantar suspeitas de outros repórteres que fazem a cobertura jornalística no local.

Vídeo postado nas redes sociais de Bolsonaro naquele dia mostra a comitiva presidencial parando perto do “cercadinho” — como é chamado esse ponto de entrevistas e conversas com apoiadores —, momento em que o Bolsonaro sai do carro e vai na direção do pequeno grupo que o aguardava.

Viana aparece nas imagens de camisa florida e, assim que vê uma oportunidade, faz a pergunta, repetindo o texto que havia recebido no telefone celular.

“Eu não assisto a Globo”, diz Bolsonaro prontamente, sendo ovacionado pelas pessoas no “cercadinho”. Antes de entrar no carro, o presidente repete a frase, “para toda a imprensa”, e olha diretamente para o auxiliar que está gravando a cena.

Confira ao vídeo

“Eu fiquei até meio sem graça porque imaginei que ele ia falar alguma coisa, falar da entrevista e tal, porque, no meu ponto [de vista], seria uma pergunta de imprensa, mas era uma pergunta para ele poder ‘mitar’. Aí ele ‘mitou”’, diz Viana.

Naquele mesmo dia, às 10h, o fotógrafo recebeu uma TED de R$ 1.100 transferido da conta da “Folha do Brasil Negócios Digitais”, antigo nome do Foco do Brasil. Segundo ele, a informação foi a de que era um adiantamento de seu salário mensal, de R$ 2.000.


Com informações da Folha de S.Paulo