cinto apertado

Pezão enfrenta cortes no orçamento e crise no primeiro escalão

Contingenciamento de verbas no Rio de Janeiro pode chegar a R$ 8,3 bilhões; na Segurança Pública, impacto nos orçamentos da Polícia Militar e da Polícia Civil incomoda secretário

Clarice Castro/ GERJ

Beltrame: “Já estamos fazendo um exercício muito grande, cortando na carne gratificações, pessoal e veículos”

Rio de Janeiro – Notório apreciador da boa mesa, o governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, se excedeu nas guloseimas – e nos quilos extras – durante a última campanha eleitoral. A cada torresmo, seu quitute preferido, Pezão repetia a amigos, correligionários e repórteres que 2015 seria o ano de “apertar o cinto” e emagrecer. O que seus interlocutores não poderiam supor é que o governador, ao prometer uma futura dieta, estava fazendo uma previsão involuntária sobre o que aconteceria no próprio governo. Definitivamente, apertar o cinto parece ser o lema da atual gestão, que já anunciou cortes no Orçamento que podem chegar a R$ 8,3 bilhões e já começam a causar desgaste político com peças importantes do primeiro escalão estadual.

Segundo a Secretaria de Planejamento e Gestão, o contingenciamento orçamentário tem duas causas principais. Uma delas é a previsão de uma diminuição de R$ 2,7 bilhões na arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), principal tributo estadual. Outra é a queda da arrecadação com os royalties destinados ao estado pela produção de petróleo, estimada em R$ 2 bilhões, decorrência do baixo preço pago pelo barril no mercado internacional. O Orçamento do Estado previsto para 2015, antes do anúncio dos cortes, era de R$ 54 bilhões, mas o cenário mudou depois que foi constatada a perda tributária – a primeira desde o início da crise financeira internacional em 2008.

Os cortes começaram a se desenhar já no dia da posse do governador. Para a aparente surpresa de alguns secretários, Pezão anunciou a redução de 35% no valor das gratificações especiais pagas aos servidores públicos estaduais e o corte de 25% nas despesas das secretarias de governo, incluindo os contratos com fornecedores e prestadores de serviço.

Desde meados de janeiro, a secretária de Planejamento, Claudia Uchôa, vem se reunindo com os demais secretários para detalhar como serão efetuados os cortes em cada pasta. A ideia do governo é liberar mais recursos ao longo do ano, à medida que as secretarias forem executando o orçamento e demonstrando tal necessidade. “O que está sendo feito é um congelamento, uma adequação do orçamento. O corte não está definido”, diz a secretária.

Alguns fundos setoriais que fomentam importantes ações de governo também sofrerão cortes ou “congelamento” este ano. É o caso do Fundo Estadual de Saúde, que pode perder até R$ 500 milhões, e também do Fundo de Conservação Ambiental, que teve R$ 120 milhões contingenciados.

Para tentar recuperar as perdas, o governador anunciou sua intenção de reaver parte dos R$ 66 bilhões inscritos na Dívida Ativa do Estado: “O Judiciário precisa disponibilizar mais juízes para que o Estado possa cobrar seus devedores. Se este problema for resolvido, teremos fôlego para atravessar 2015”, disse Pezão, durante a cerimônia de posse do novo presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

Segurança pública

De todos os furos apertados no cinto do governo fluminense, o que causou mais alvoroço foi o relativo ao setor de Segurança Pública, que se materializará em um corte, estimado pelo governo, de aproximadamente R$ 1,4 bilhão nos orçamentos da Polícia Militar e da Polícia Civil. O anúncio não foi bem recebido pelo secretário José Mariano Beltrame, há oito anos no cargo e considerado o “pai” da política de expansão das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) nas favelas do Rio.

“Já estamos fazendo um exercício muito grande, cortando na carne gratificações, pessoal e veículos. Certos programas e ações não poderão ir adiante se houver contingenciamento orçamentário. O governador tem ciência disso. Nós começamos um trabalho há oito anos e não podemos recuar um centímetro naquilo que avançamos”, disse Beltrame. Segundo fontes da imprensa, a manutenção do orçamento inicialmente previsto para 2015 foi a principal condição colocada pelo secretário de Segurança Pública para continuar à frente da pasta.

Repetida na televisão, a declaração de Beltrame teria irritado Pezão e provocado uma crise entre os dois. Na última quinta-feira (5), o governador publicou no Diário Oficial sua autonomeação como presidente da Comissão Executiva de Monitoramento e Avaliação da Política de Pacificação, posto até então ocupado por Beltrame. Com o decreto, o secretário passa a comandar exclusivamente as partes operacional e estratégica do programa de UPPs, deixando as ações sociais sob o comando direto do governador.

Para sinalizar que a expansão das UPPs não deverá ser afetada pelos cortes no Orçamento de 2015, Pezão anunciou que a contratação de seis mil novos policiais militares prevista este ano está mantida, assim como a realização de novo concurso público para a PM: “É justamente para avançar e aperfeiçoar esse compromisso (com as UPPs) que precisamos adotar uma contenção criativa e inteligente nas finanças públicas”, disse o governador, em nota divulgada à imprensa.

Desfalques

Se José Mariano Beltrame decidir deixar a SSP, como já se especula, não terá sido a primeira vítima da crise dos cortes orçamentários. Também no dia 5, o secretário de Fazenda, Sérgio Ruy Barbosa, apresentou sua demissão, prontamente aceita por Pezão. A saída do secretário começou a ser articulada depois que ele apresentou a jornalistas alguns números sobre os cortes, mas estes foram considerados equivocados pelo governador.

Já o ex-secretário de Obras Hudson Braga, tido por muitos como o braço direito de Pezão, deixou o governo antes mesmo de assumir a Coordenadoria de Infraestrutura, órgão que seria responsável por gerenciar os projetos estratégicos do governo. Não se sabe, entretanto, se a saída de Hudson foi causada pelos cortes orçamentários anunciados pelo governador.