No RS, Michel Temer tenta driblar constrangimento com PMDB gaúcho

(Foto: Sul21) Porto Alegre – Poucas vezes a visita de um correligionário foi tratada com tanto cuidado dentro de um partido político. A presença de Michel Temer, presidente nacional do […]

(Foto: Sul21)

Porto Alegre – Poucas vezes a visita de um correligionário foi tratada com tanto cuidado dentro de um partido político. A presença de Michel Temer, presidente nacional do PMDB e vice na chapa de Dilma Rousseff (PT) à Presidência da República, motivou reações que oscilaram da euforia ao constrangimento. A preferência da maioria das lideranças peemedebistas pela candidatura nacional de José Serra (PSDB) transformou a atuação de Temer como vice de Dilma em um incômodo. Esta sensação foi acentuada pela mobilização da base gaúcha do partido: prefeitos e vereadores do PMDB resolveram alinhar-se à decisão nacional de concorrer ao lado do PT pela presidência.

A cúpula gaúcha conseguiu adiar a visita de Temer, mas não foi capaz de evitá-la. Para diminuir o impacto da visita indesejada, tratou de dividir a agenda em duas, tentando dar ao encontro o caráter de apoio a José Fogaça (PMDB) na campanha pelo Piratini. O resultado foi uma passagem acidentada por Porto Alegre, com três eventos distintos em pouco mais de três horas e um revezamento de aparições públicas com conversas a portas fechadas.

Coletiva começa com atraso

A coletiva de Michel Temer no Hotel Embaixador começou com cerca de meia hora de atraso. O vice de Dilma chegou pouco depois do meio dia, acompanhado de uma pequena delegação. Junto com Temer, vieram o seu coordenador de campanha, Moreira Franco, o presidente do PMDB catarinense, João Mattos, e seu vice, Paulo Afonso Vieira. Representando a candidatura de Fogaça ao Piratini, compareceu o candidato a vice, Pompeu de Mattos (PDT), enquanto o deputado Eliseu Padilha (PMDB) representava as lideranças regionais do partido.

Durante a coletiva, ficou claro o esforço de Michel Temer em não criar pontos de atrito com a cúpula regional do partido. “A neutralidade (do PMDB gaúcho na eleição nacional) já é um grande passo, especialmente levando em conta o clima de disputa natural no estado. Para nós (do PMDB nacional), é uma conquista”, declarou. O deputado Eliseu Padilha aproveitou o momento para defender a posição do PMDB gaúcho. “Nossa posição de neutralidade é fruto de uma vasta negociação. Não houve interferências. Nossos militantes estão liberados para escolher em quem querem votar na eleição para presidente”.

Mesmo assim, Temer não se furtou em defender a candidatura de Dilma Rousseff. “O eleitorado está entusiasmado com nossa campanha”, comemorou. “Nosso sucesso é um reconhecimento aos pontos extremamente positivos do governo Lula. Temos que manter o foco, só poderemos falar em eleição depois de 3 de outubro. Mas tenho certeza que a candidatura de Dilma terá uma expressiva vitória, inclusive aqui no Rio Grande do Sul”.

O plano de campanha de Temer prevê associar, gradualmente, a sua imagem a de Dilma, nas próximas semanas, o que deve culminar em algumas aparições nos programas de TV da candidata petista. Segundo Temer, o distanciamento entre ele e Dilma não teve motivação em eventuais constrangimentos regionais, sendo apenas parte de uma estratégia para garantir a presença da coligação em um número maior de localidades. “Na próxima semana, devo aparecer em alguns comícios de Dilma”, garantiu.

Cenário preparado

Enquanto Temer e sua comitiva se preparavam para deixar o Hotel Embaixador, as lideranças peemedebistas do estado aguardavam na sede política da campanha de Fogaça, na rua Barão de Ubá. A movimentação de carros e engravatados chamava a atenção na rua residencial, com moradores espiando de janelas e sacadas. Ao pé da escada que leva à entrada da sede, o deputado Mendes Ribeiro Filho (PMDB), coordenador da campanha de Fogaça e notório apoiador de Temer e Dilma, aguardava,  sem tomar conhecimento da garoa fina que caía. Mais atrás, o senador Pedro Simon, o candidato ao Senado, Germano Rigotto (PMDB), e o próprio Fogaça aguardavam debaixo da cobertura, preferindo não encarar a chuva.

A recepção a Temer foi cordial, simples e protocolar. O abraço mais caloroso foi o de Rigotto; os cumprimentos de Simon foram mais simples e diretos, sem sorrisos. Fogaça ficou parado, observando a cena. Os peemedebistas foram se alinhando para as fotos de praxe, e o abraço esperado entre Fogaça e Temer acabou sendo esquecido.

Pompeo de Mattos e José Fogaça trataram de ensinar o aperto de mão gaudério para o visitante, motivando risos pouco empolgados nos presentes. “Eu pegava na mão”, sugeriu um dos fotógrafos para os políticos que posavam lado a lado. Desajeitados, Simon e Temer deram as mãos, mantendo os braços na altura da cintura. “Levanta, levanta, é melhor”, sugeriram alguns dos jornalistas presentes. O gesto de união rendeu uma chuva de cliques das máquinas fotográficas, mas a expressão dos envolvidos deixava claro o desconforto com a situação.

Poucos sorrisos

Depois da recepção, as lideranças gaúchas levaram Temer até uma sala de reuniões. Uma pequena brecha foi aberta para que os fotógrafos e cinegrafistas pudessem fazer imagens. Logo depois, as portas foram fechadas, e os jornalistas convidados a aguardar em uma sala contígua. Do que foi discutido na reunião, os repórteres ouviriam apenas os ecos.

“Estamos em um labirinto”, comentou um dos nomes fortes da campanha de Fogaça. “Temos que articular tudo com cuidado. Se correr o bicho pega, se ficar…” A frase não concluída dava o tom de insegurança de toda a coordenação de campanha.

A saída de Michel Temer foi rápida. Na despedida, a cordialidade se manteve pouco expansiva. “Estamos torcendo por você. Pena que eu não voto aqui”, brincou o coordenador de campanha de Temer, Moreira Franco, com as mãos no ombro de José Fogaça. O candidato a governador sorriu, mas não respondeu ao agrado. Enquanto isso, Pedro Simon e Michel Temer trocavam breves palavras. Germano Rigotto fez as despedidas e saiu rapidamente por uma rua lateral. Em rápida conversa com a reportagem do Sul21, confirmou que nem ele nem Fogaça iriam ao almoço no CTG 35. “Não seria conveniente. Por isso mesmo que fizemos o encontro aqui”, comentou.

O único abraço visível entre Fogaça e Temer ocorreu instantes antes do presidente nacional do PMDB embarcar no veículo que o levaria ao almoço com os peemedebistas pró-Dilma. As palavras trocadas entre os dois foram breves e pouco vibrantes. “Sucesso”, desejou Temer. “Bom almoço e boa viagem”, respondeu Fogaça. No encontro entre Fogaça e Temer, os sorrisos ficaram faltando.

Festa no CTG 35

Sorrisos que sobraram no almoço de Temer com seus apoiadores gaúchos, ocorrido no CTG 35. Cartazes da campanha de Fogaça espalhavam-se pelas paredes de madeira, enquanto panfletos e adesivos favoráveis a Dilma descansavam sobre as mesas, ao lado de pratos e talheres. Assessores se esgueiravam entre o grande número de presentes, distribuindo adesivos para os que chegavam. No palco, um único microfone aguardava a chegada da visita ilustre. Na agenda de Michel Temer em Porto Alegre, a parte festiva ficou mesmo para o almoço.

“A presença de todos superou nossas expectativas”, comemorava João Carlos Vieira Gediel, prefeito de Quaraí e principal articulador do movimento de prefeitos pró-Dilma. “Tínhamos reservado 240 lugares. Quando eu parei de contar, já tinham entrado 200, e muita gente ficou de pé”, acrescentou Alaor Pastoriza Ribeiro, prefeito de Arambaré e braço-direito de Gediel no movimento. Segundo informações da portaria do restaurante, 320 pessoas compareceram para o encontro de apoio a Temer.

Se a recepção dada a Temer pelos nomes fortes do PMDB não primou pela expansividade, o mesmo não pode ser dito da calorosa acolhida no CTG 35. Prefeitos, vice-prefeitos, secretários e vereadores: todos queriam seu momento ao lado do vice de Dilma. “Bate de novo, bate de novo”, insistia Pompeo de Mattos cada vez que algum presente posava a seu lado para fotos. Mendes Ribeiro Filho, pouco à vontade no encontro anterior, também estava mais relaxado e sorridente.

Feliz, o prefeito Gediel recebeu Michel Temer no palco com uma fala empolgada. “Esse momento não é vitória de nenhuma pessoa, e sim de toda a base do partido. Se fôssemos convidar todos para subir aqui com a gente, íamos precisar de um tremendo palco”, exclamou, em meio a aplausos. O prefeito de Alegrete, Erasmo Silva, não disfarçou a alegria. “Não basta dizer que as bases são importantes se não respeitarmos o que a base quer. Estamos com Temer desde a primeira hora”, assegurou.

Discurso inflamado

O próprio Temer não economizou adjetivos na hora de elogiar os presentes. “Sou presidente do PMDB há 9 anos, e digo que essa é a recepção mais emocionante que recebi nesse período todo”. Aplausos e gritos de “Temer, Temer” ecoaram em resposta. Sem deixar de lembrar da presença do pedetista Pompeo de Mattos, o vice da chapa de Dilma seguiu reforçando o ânimo dos peemedebistas gaúchos. “O PMDB do Rio Grande do Sul é principiológico, é programático, traz dentro de si o MDB de antigamente. Tenham certeza de que governarei junto com o PMDB gaúcho”, garantiu.

Os elogios de Temer ao governo de Lula foram bem recebidos pelos presentes. “O governo Lula instaurou a democracia do pão sobre a mesa”, garantiu, motivando nova salva de aplausos. No fim de seu discurso, Michel Temer lembrou que a chama, atual símbolo do PMDB, foi criada pelo núcleo gaúcho do partido. “É uma chama que nasceu aqui, e que incendeia a alma e o coração. É essa chama que faz todos vocês virem de longe para apoiar a chapa do partido para a eleição presidencial. Saio daqui inflamado pela chama de todos vocês”, discursou, a voz firme tentando disfarçar a emoção.

O fim do discurso foi o sinal para o balançar de uma série de bandeiras com o nome de Fogaça. Uma delas, empunhada por um apoiador mais distraído, enrolou-se no ventilador de teto, e seguiu tremulando muito depois que os prefeitos e vices deixaram o restaurante, rumo ao encontro com o candidato a governador. “Todo mundo tem que passar no comitê, pessoal”, insistia Mendes Ribeiro Filho, conclamando os prefeitos ao encontro de apoio a Fogaça. Enquanto isso, Temer atendia alguns retardatários. “Precisamos do seu apoio, presidente Temer, senão os líderes nos pressionam a votar no Serra”, deixou escapar um dos peemedebistas presentes, diante do sorriso constrangido do vice de Dilma. Os últimos apertos de mão impediram o “almocinho rápido” de Temer. Pouco antes das 14h30, o visitante rumava ao aeroporto, sem experimentar o churrasco e o buffet de saladas do cardápio.

Apoio às escondidas

O último encontro das lideranças peemedebistas acabou sendo tão invisível quanto o primeiro. Prefeitos e lideranças surgiam repentinamente na área reservada do comitê de Fogaça, acessando o edifício por entradas laterais. José Fogaça chegou às 15h26, junto com Pedro Simon, Germano Rigotto e Mendes Ribeiro Filho. O acesso ao encontro era restrito: mais do que uma demonstração de apoio, tratava-se de uma reunião para acertar os ponteiros da campanha. “A coisa vai demorar. Eles ainda vão lavar a roupa suja”, comentou um dos assessores.

Alguns prefeitos saíram da área restrita, e seus comentários davam eco ao clima da reunião. “Eles acham que, se a Dilma ganha, o Tarso (Genro, candidato do PT ao governo do estado) sai favorecido. Já cansei de dizer para eles (lideranças) que não é nada disso, mas não me escutam”, declarou um dos líderes do movimento pró-Dilma. “Entendo a posição do Fogaça, mas eu não tenho que ficar neutro só por causa disso”, reclamou outro. O evento, que pretendia ser um grande ato pró-Fogaça, acabou restrito à sala de reuniões, e o tom pouco teve de festivo. Cumpridas todas as formalidades, o que resta é a sensação de que a visita de Michel Temer a Porto Alegre ainda vai motivar muitas portas fechadas no PMDB.

Fonte: Sul21