MP vê ‘escândalo total’ e prejuízos aos cofres em reforma do Metrô de São Paulo
Para Ministério Público, licitações para reforma de 98 trens do Metrô paulista têm indícios de irregularidade: sempre uma única empresa se candidatava a ganhar
Publicado 03/12/2013 - 23h55
São Paulo – O Ministério Público (MP) do Estado de São Paulo pediu hoje (3) a suspensão imediata de dez contratos de reforma de 98 trens do Metrô de São Paulo. Os contratos totalizam R$ 2,5 bilhões. De acordo com o MP, os contratos estão com vício de ilegalidade. A recomendação administrativa foi entregue ao Metrô, que tem 30 dias para apresentar providências. Os contratos foram assinados entre os anos de 2008 e de 2010.
O termo “vício de ilegalidade” pode ser explicado por pelo menos dois aspectos: valor incompatível com a realidade de mercado e falha ou ausência de execução do serviço combinado. O primeiro aspecto foi observado pelo promotor do caso, Marcelo Camargo Milani, por comparação: “Uma das empresas envolvidas na licitação, e que também trabalha na reforma dos trens, recentemente fechou um contrato com o Metrô de Nova York. E os trens novos lá de Nova York vão ter um preço menor do que os trens reformados aqui”.
“Para nós isso é um prejuízo ao erário evidente. Eu reputo que isso é um escândalo total e um prejuízo absurdo para os cofres públicos. É por isso que estamos propondo essa suspensão ao Metrô”, acrescentou o promotor.
A segunda evidência de ilicitude vem sendo notada pelos milhares de usuários, potenciais vítimas das falhas que podem acabar em acidentes como os registrados nos últimos dois anos. O tema tem sido objeto de reportagens feitas em parceria entre a RBA e o site Outras Palavras – por Tadeu Breda e Vinícius Gomes.
Leia as reportagens:
- Metrô de São Paulo admite: trens abriram portas em movimento
- Novos, trens fornecidos por cartel, registram mais falhas que antigos
- Metrô de SP esconde informações em apuração sobre descarrilamento
- Em crise de manutenção, Metrô de SP põe trens com falhas para circular
No último dia 12 de novembro, dez dias depois de duas ocorrências de aberturas de portas com trens em movimento na Linha 3-Vermelha, a direção do Metrô admitiu em nota enviada à reportagem da RBA os incidentes que a companhia vinha ocultando. As falhas, consideradas “normais” pela empresa, envolveram composições recém-reformadas pelo consórcio MTTrens e pertencentes a uma frota recordista em problemas.
Os sinais de que as irregularidades nas concorrências e contratos do metrô paulista vêm sendo detectados por usuários, e são os próprios funcionários da Linha 3-Vermelha que procuram organizar um levantamento, ainda impreciso, dos problemas. Algumas composições novas chegam a registrar mais defeitos que as antigas. Os dados são preliminares e não oficiais, uma vez que a Companhia do Metropolitano (Metrô), ligada ao governo do estado, dificulta o acesso a estatísticas oficiais.
Em outro acidente na Linha 3-Vermelha, no dia 5 de agosto, os funcionários não conseguiram obter explicações da companhia sobre um descarrilamento ocorrido próximo à estação Palmeiras-Barra Funda, na zona oeste. Requisições amparadas pela legislação foram repetidamente ignoradas.
Nova tentativa
Alguns incidentes listados na ação do Ministério Público podem ajudar a furar o bloqueio da desinformação e falta de transparência. De acordo com o MP, três trens reformados já entregues ao Metrô, e já em funcionamento, foram pivôs em acidentes nos últimos anos: em 1º de dezembro de 2012 (quando um trem andou sozinho na estação Jabaquara e colidiu com outro); o do descarrilamento de 5 de agosto, depois verificado ter sido por um problema em uma peça; e em 16 de maio de 2013, (quando ocorreu, na linha 3 Vermelha, a colisão entre dois trens).
“Três acidentes em trens reformados do Metrô. É mais um indicativo no sentido de que essa reforma tem sido danosa para o metrô e para os cofres públicos de maneira geral”, disse o promotor.
Segundo o MP, os contratos de reforma dos 98 trens do Metrô de paulista têm indícios de que houve irregularidade nas licitações para a escolha das empresas que fariam o serviço: nos contratos, sempre uma única empresa se candidatava a ganhar a licitação. “Nos contratos principais não houve competitividade, ou seja, nas licitações apresentadas contaram apenas com um concorrente e uma proposta, que é a vencedora”, destacou o promotor.
O MP ressalta ainda que há indicativos que não houve vantagem para o erário na decisão pela reforma em vez da compra de novos trens. Também há indícios de que houve o fracionamento, em dez contratos, da contratação do serviço na tentativa de esconder o valor total do contrato.
“A questão é de se saber por que reformar um trem de 40 anos, qual a razão disso. Todas as outras grandes cidades que têm trem, o trem não dura todo esse tempo. É material de sucata. Você faz um novo. Não existe fora da cidade de São Paulo nenhum outro caso de reforma de trem”, disse o promotor.
Com informações de Bruno Bocchini, da Agência Brasil