Entrevista

Manifestações são ‘respeitáveis’, mas sem ‘kit de destruição’, diz Vicentinho

Líder do PT na Câmara diz que lei tem de ser cuidadosa para não colocar no mesmo nível 'militante que se exasperou' e 'aquele que vai programado'

vicentinho.com / reprodução

Vicentinho: ‘Conviver com a democracia pressupõe greve, negociar, lutar. Se não concordarmos, é ditadura’

São Paulo – Para um sindicalista de larga trajetória de reivindicações, inclusive durante a ditadura civil militar, manifestações não assustam. Ao contrário: são respeitáveis. É esse sentimento que norteia o deputado federal Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho (PT-SP), líder da bancada do PT na Câmara desde fevereiro, às vésperas da Copa do Mundo no Brasil, quando a convivência com protestos é quase diária.

Em entrevista exclusiva concedida ontem (26) à RBA, o parlamentar, que tem a missão de coordenar 89 deputados da bancada petista e travar duros embates em um ano eleitoral, falou de discussões nacionais, como as manifestações de rua contra a Copa, as ameaças de greve durante o mundial de seleções e a polêmica da preparação, pelo governo federal, de legislação para coibir violência nos protestos. “Às vezes, movimentos muito pacíficos são atrapalhados quando alguém vem programado com um kit de destruição”, afirma.

Ele também abordou as dificuldades de aprovação de projetos ligados à pauta trabalhista que tramitam no Congresso Nacional, como o da jornada de 40 horas semanais. Para a proposta, Vicentinho não acredita na conquista para 2014 se não houver mobilização do trabalhador. “O trabalhador, na hora de votar, não pode votar no algoz”, argumenta.

Confira a entrevista:

Como vê o movimento sindical, manifestações e reivindicações às vésperas da Copa do Mundo? Tem muita gente preocupada com a possibilidade de greves neste momento.

Sou sindicalista e metalúrgico, estou deputado. Quem não ficou feliz quando o presidente Lula, concorrendo com vários países, conquistou o direito à Copa do Mundo no Brasil e depois o direito à Olimpíada? É uma prova de respeito que o mundo dá ao Brasil e esse respeito devemos aproveitar. Primeiro, acolhendo bem os turistas que virão ao Brasil.

Sobre as manifestações, não acho inteligente, por exemplo, a manifestação Não Vai Ter Copa, porque vai ter. Não tem jeito.

Em segundo lugar, respeito qualquer manifestação que possa ocorrer em defesa da melhoria das condições de vida e do trabalho. É natural, de forma pacífica, desmascarados, como fazíamos nos anos 1980. Nenhum de nós se mascarava.

Um dia desses, na época da discussão do voto aberto, apareceram mascarados para falar comigo. Eu falei: “rapaz, você pede voto aberto mascarado?” As manifestações são movimentos respeitáveis. O que não vamos concordar é com a história de mascarado quebrar patrimônio e arriscar a vida das pessoas.

A juventude de hoje não viveu o que nós vivemos, uma inflação a 80% ao mês, a crise do desemprego do neoliberalismo de Fernando Henrique Cardoso, do PSDB.

A presidenta Dilma disse, meses atrás, que iria endurecer a legislação para coibir violência em protesto, mas isso não aconteceu. O que o Estado, governos estaduais ou federal, deve fazer para garantir a segurança diante da ameaça de protestos violentos durante a Copa?

Em reuniões com o sindicato e lá em Brasília, com a federação, temos feito importantes ações em relação aos profissionais atingidos em eventos violentos, sobretudo fotógrafos e cinegrafistas. Tramita internamente, no Ministério da Justiça, a elaboração desse projeto, que poderá ir ao Congresso a qualquer momento.

Às vezes, movimentos muito pacíficos são atrapalhados quando alguém vem programado com um kit de destruição. Esses não são manifestantes exaltados, vêm com o firme propósito de agredir. É desses que queremos falar (na lei). A lei tem que tomar cuidado para não condenar um militante que se exasperou comparando com aquele que vai programado. Temos que tomar cuidado para que um projeto como esse não criminalize os movimentos, mas proteja a vida e separe o joio do trigo.

É preciso elaborar uma lei, mas também que tenhamos eficácia para assegurar o direito à manifestação e impedir essas ações. Não posso ficar falando muita coisa, mas, com certeza, a estrutura para a Copa do Mundo está muito bem feita. Vai trabalhar preventivamente antes de mais nada. Ocorrerão manifestações, que são um direito, mas, nos espaços em que o povo estiver para assistir aos jogos, não haverá nada.

E a questão da Polícia Federal? Estão aproveitando o momento de reivindicar, que é legítimo.

Reconheço que há uma série de insatisfações no serviço público. No caso da PF, estive reunido com eles recentemente. Na minha opinião, cometeram um erro. Quando houve uma proposta de negociação que incluía a aplicação da proposta dos 15%, foram os únicos que não aceitaram, todo segmento público aceitou. Eles podiam ter aceitado e depois negociar por mais.

Na PF, existem alguns problemas. Por exemplo, a relação entre o agente e o delegado. Há uma grande insatisfação. As questões dos inquéritos: o agente faz o inquérito, mas a propaganda é o delegado quem faz. Os agentes querem ter a oportunidade de dialogar mais com o ministério, mas não via delegados. Tenho o compromisso de fazer um diálogo com o ministro (da Justiça) José Eduardo Cardozo para tentar melhorar essa relação.

Antes de começar a Copa?

Antes de começar a Copa ou durante. Não tem prazo. Acredito na responsabilidade, no patriotismo da Polícia Federal, num momento em que todo o Brasil deveria se unir para fazer com que a Copa seja um sucesso.

De qualquer forma, a data-base deles sempre foi em maio.

Mas temos que conviver com a democracia, que pressupõe fazer greve, negociar, lutar. Se não concordarmos com isso, é ditadura.

Os trabalhadores querem saber das questões como a terceirização, Convenção 151 (direito de greve e negociação coletiva no setor público), ratificação da Convenção 189 (sobre trabalho doméstico), ambas da OIT. Como estão esses debates?

Sou o autor das 40 horas semanais. Consegui fazer com que meu relatório fosse aprovado na CCJ, na comissão especial e está pronto para a pauta. É preciso que o movimento sindical se empenhe na pressão, porque os deputados ligados a empresários e fazendeiros não deixam projetos dos trabalhadores serem aprovados porque são maioria. Mas se o povo acompanha, eles podem inclusive não ser mais eleitos. Lá dentro (na Câmara) existe um conflito de classes. Estamos lutando há 16 anos pela jornada de 40 horas.

Sai este ano?

Acho difícil, se não houver mobilização. Se depender dos deputados nessas questões patronais… Por isso o trabalhador, na hora de votar, não pode votar no algoz.

Qual o papel da bancada na discussão do plebiscito da reforma política e Constituinte exclusiva?

Tem uma reforma que não queremos porque não muda o fundamental, que é acabar o financiamento privado de campanha. Enquanto as campanhas forem sustentadas por grupos econômicos, muitos deputados vão entrar comprometidos com esses grupos. Daí os lobbies, inclusive no caso da Petrobras. Criamos um projeto de decreto legislativo, cabe ao parlamento brasileiro a introdução do plebiscito. Teremos eventos esta semana em Brasília.

Para se mudar fundamentalmente a relação política no Brasil é preciso acabar com o financiamento privado. Vai diminuir o grau de corrupção no Brasil.

O presidente do PT tem falado também na reforma do capítulo da Constituição sobre meios de comunicação. Qual a expectativa no Congresso?

O presidente Rui Falcão tem toda a razão. A Constituição assegura que os meios de comunicação como concessão pública devem servir de eco para a sociedade, mas, lamentavelmente, vocês veem o que acontece. Uma televisão consegue desconstruir notícias boas como a do pleno emprego. O que tem de gente torcendo para o Brasil não ser campeão, para a inflação subir, para que o Brasil não dê certo. É a grande mídia.

A revista Veja virou um folhetim, um panfleto da direita no país, funciona dessa forma. A mídia tem que ser um instrumento aberto para toda a comunidade. Quando vai acontecer? Não sei. O poder deles é muito grande. Mas água mole em pedra dura tanto bate até que fura.

A CPI da Petrobras vai sair mesmo? O que o senhor tem a dizer das críticas da oposição de que o PT tem criado empecilhos à criação da CPI?

A CPI da Petrobras, que foi uma iniciativa da oposição, não está saindo porque eles não querem. Ela está no Senado. Nós propusemos uma CPMI que inclui a Petrobras, mas também questões do Metrô, da Alstom, a denúncia de que os governos do PSDB se envolveram numa corrupção brutal, tanto que já existem números, pessoas sendo indiciadas e denúncias feitas de fora do país com muitos documentos.

Existe a CPI da Petrobras criada por uma liminar da ministra do STF (Rosa Weber). A oposição, que quis essa liminar, não indicou nome e não quer mais a CPI. O que eles querem é uma CPMI da Petrobras. Não criamos nenhum empecilho. Já indicamos os nossos nomes dentro do prazo legal, Marco Maia (RS) para relator e Sibá Machado (AC) para titular, Afonso Florence (BA) e Iriny Lopes (ES) como suplentes.

A outra CPI, mais ampla, é exatamente igual para a Petrobras, mas acrescenta o Metrô. Serão duas CPMIs, e vamos participar das duas sem nenhum problema.