Base aliada

Para governadores do PMDB, ajuste no ibope dos outros é refresco

Durante jantar, peemedebistas dizem que anúncios como aumento de tributos e corte de despesas devem partir do próprio Planalto e não vão dividir desgaste de novas medidas impopulares

Valter Campanato/Agência Brasil

Jantar no Jaburu: apesar das tentativas do Planalto de aproximação, relação entre governo e peemedebistas é de algodão entre cristais

Brasília – O jantar realizado na residência oficial do vice-presidente Michel Temer com governadores e parlamentares do PMDB mostrou o quanto estão complicadas as relações do partido com o governo. Há poucos meses, vários governadores do Nordeste e de legendas diversas lançaram manifesto de apoio à presidenta Dilma Rousseff. Mas ontem (8), seis governadores peemedebistas cobraram do Executivo saídas para conter a crise nos seus estados, sugerindo de corte de gastos a aumento de impostos. Mas lavaram as mãos. Ao lado de deputados e senadores, cobraram que eventuais medidas impopulares terão de ficar na conta do próprio governo federal, e não do Congresso nem dos estados.

Segundo um dos senadores presentes ao encontro, foi um recado claro de que o PMDB não está interessado em encampar maiores apoios a medidas a serem adotadas pelo Executivo neste momento e que está mais rígido do que nunca na aliança com o PT. O partido mostrou que, apesar das tentativas das últimas semanas pelo Palácio do Planalto de aproximação, a relação entre governo e peemedebistas continua sendo de “algodão entre cristais”, conforme definiu esse parlamentar.

Participaram do jantar os governadores peemedebistas Luiz Fernando Pezão (RJ), José Ivo Sartori (RS), Paulo Hartung (ES), Renan Filho (AL), Marcelo Miranda (TO) e Confúcio Moura (RO). Além deles, o encontro contou com as presenças dos presidentes da Câmara e do Senado, Eduardo Cunha (RJ) e Renan Calheiros (AL). Assim como os líderes do PMDB nas duas Casas, deputado Leonardo Picciani (RJ) e senador Eunício Oliveira (CE); o senador Romero Jucá (RR) e os ministros Kátia Abreu (Agricultura), Elizeu Padilha (Aviação Civil) e Helder Barbalho (Pesca).

Divisão de responsabilidade

Um dos momentos mais tensos do encontro, de acordo com um ministro presente, foi a afirmação feita pelo senador Eunício Oliveira de que a presidenta Dilma Rousseff estaria “tentando dividir a responsabilidade da crise econômica com os partidos e o Congresso”, diante da baixa popularidade do governo. Eunício chegou a dizer que considera ser função da própria presidenta anunciar qualquer aumento de tributos, caso isso seja mesmo definido pela equipe econômica.

Também Renan Calheiros lembrou a sua antiga sugestão de corte de ministérios, ao ressaltar que considera importante o corte de despesas, a extinção de cargos em comissão e redução do número de pastas ministeriais. “Primeiro o dever de casa, que é este. Depois é que deve vir a discussão sobre o que há de se fazer com o déficit fiscal”, chegou a afirmar o senador.

Michel Temer, pouco antes do jantar, teve encontro com a própria Dilma e desistiu de defender a ideia de aumento da Cide, contribuição cobrada sobre a venda de combustíveis. Para os governadores, no entanto, o vice voltou a argumentar que “é preciso evitar remédios amargos” – numa posição oposta à pregada pela presidenta – e deu a entender que o aumento de tributos “só deve acontecer em última hipótese”.

Respostas pedidas

Ao final, Eunício Oliveira contou que os governadores citaram detalhes sobre as dificuldades observadas nos seus estados e pediram ajuda, mas reiterou que houve consenso no sentido de que as medidas para combater a situação devem sair do próprio Executivo.

“Dissemos (aos governadores) que o Congresso entregou ao governo todas as respostas que foram pedidas em relação ao ajuste fiscal e que, neste momento, é difícil discutir aumento da carga tributária. Aceitamos discutir propostas do governo, mas o Congresso não vai tomar essa iniciativa. Se o governo encaminhar medidas, vamos discutir, mas há muita dificuldade de propor aumento de imposto neste momento”, acentuou.

Entre os governadores, as críticas não foram menos intensas. “Há um vazio de liderança para guiar o Brasil para fora da crise. Temos de construir uma solução”, queixou-se o governador de Alagoas, Renan Filho. “Precisamos de uma pauta para tirar o país e os estados dessa situação difícil. Precisamos evitar o efeito dominó”, afirmou o governador de Rondônia, Confúcio Moura, ao deixar o Palácio do Jaburu.

Gestos do PMDB empurram Dilma a sair da retranca

O governo entra assim em mais um lance do jogo político que permeia a crise. Cansado de ser coadjuvante e expressando um desejo latente de protagonismos em uma chapa presidencial em 2018, o PMDB – sob a liderança de Eduardo Cunha – alimentou um ímpeto golpista no primeiro semestre. Com Cunha nas cordas da Lava Jato, o ímpeto arrefeceu. Nenhum jurista sério vê condições legítimas de sacar Dilma do Planalto.

A presidenta iniciou o segundo semestre em busca de pacificação com a base aliada e de aproximação com a base social. Fez alguns gols, mas a dimensão do aperto econômico não ajuda. Ao observar, na semana passada, a dificuldade de um mandatário se sustentar politicamente com taxa de popularidade em um dígito, Michel Temer não disse mais que o óbvio para, na sequência, se justificar mal interpretado e renovar juras de fidelidade.

Depois do jantar de ontem, o PMDB deu mostras de que, para o momento, sem abandonar de vez as alternativas de golpe paraguaio ainda ao alcance, o melhor é deixar que o governo se complique sozinho com suas decisões econômicas. Que a popularidade abaixo de um dígito seja eterna enquanto dure. E que ajuste fiscal no ibope dos outros é refresco.

Mais do que nunca, a bola está com Dilma. Na retranca, não vai reverter a crise de governabilidade, tampouco a de popularidade. A presidenta recebe mais sinais de que precisa mergulhar na política, liderar o resgate da agenda com que derrotou seus adversários e vislumbrar um horizonte mais próximo do crescimento, em meio ao nevoeiro recessivo do ajuste fiscal. Cair na tentação de mandar a conta do déficit para a classe média e os consumidores é tudo o que o PMDB, a oposição e o partido da mídia querem agora. Claro, o “mercado” também.

* Com Agências