Agenda positiva

Interlocução no Congresso e consulta ao TSE desafiam governo em agenda positiva

Enquanto correm contra o tempo para garantir resposta do Judiciário sobre validade de plebiscito, Dilma e ministros tentam superar rusgas e mostrar à base aliada que pacto não foi imposto

Nelson Bastian/Agência Câmara

Da maneira como está, unilateral, é impossível, diz um integrante da coalizão de Dilma

Brasília – Numa quarta-feira (26) repleta de manifestações no país, jogo do Brasil e posse do jurista Luiz Roberto Barroso como ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o Palácio do Planalto e o Congresso tratam de correr contra o tempo. Os objetivos são dois: do lado do Legislativo, votar o quanto antes a pauta positiva de matérias pendentes definida no início da semana. Por parte do Executivo, acertar a organização do plebiscito para escolha popular sobre os temas que nortearão uma reforma política no país. Como a intenção é fazer as novas regras valerem para 2014, é justamente qualquer possibilidade de atraso o maior fator inimigo, tanto do governo como da base aliada.

A expectativa dos parlamentares da base é de fazer com que o plebiscito seja realizado, no máximo, até o final de agosto, mais tardar início de setembro, conforme deixaram claro. Isso porque, para que as novas regras venham a ser adotadas pelas eleições de 2014, devem ser vigentes na forma de lei a partir de 5 de outubro. Para saber se isso é possível, em termos operacionais, é preciso ainda que a consulta formalizada junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) saia, no mais tardar, até sexta-feira (28).

Também é necessário que haja consenso sobre as perguntas a serem feitas, tempo hábil para a veiculação de propaganda obrigatória, para reuniões com todos os setores da sociedade civil organizada e recebimento, por estes, das pautas e propostas a serem sugeridas, conforme explicaram servidores do Tribunal. “O TSE precisa dar seu parecer rapidamente porque há um problema logístico e operacional para poder construir todos os procedimentos. Temos um sistema fácil de ser planejado. Mas precisamos correr para implementar essa estrutura”, disse o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, que tem atuado como uma espécie de interlocutor da presidenta Dilma Rousseff em relação ao tema, nos últimos dias.

Mercadante afirmou que todos os partidos serão convidados formalmente a apresentar suas propostas para a presidenta. “A intenção é fazer com que as mudanças já passem a valer para o próximo ano, mas é preciso verificar se operacionalmente há essa possibilidade. O plebiscito dará ao país a oportunidade de eleger as principais questões que devem orientar a reforma”, colocou.

Minuta das perguntas

Coube ao deputado Henrique Fontana (PT-RS) o pedido informal – que deve ser formalizado nos próximos dias – de formular a minuta das perguntas para o plebiscito a serem discutidas e votadas pelo Congresso. Fontana é relator da proposta de reforma política – que entrou na pauta do plenário da Câmara em abril passado, mas não chegou a ser votada. “Existem duas possibilidades. A primeira é votar imediatamente a reforma política a partir do relatório já apresentado. A segunda é fazer um plebiscito com seis a oito temas estruturais e, a partir do resultado, apresentar matéria e apreciá-la em tempo ágil”, acentuou.

Na opinião do deputado, devem ser incluídas entre as perguntas se o financiamento de campanha será público ou não, questões sobre o modelo eleitoral e a forma de votar, fidelidade partidária, realização de eleições gerais numa única data – tanto presidente, governadores e deputados, como também prefeitos e vereadores e a forma como deverão ser estabelecidas as coligações.

Referendo

Na opinião de Fontana, que mergulhou fundo no assunto desde que relatou o projeto da reforma política, também há a possibilidade de vir a ser realizado um referendo, no qual seriam colocadas várias propostas para serem votadas e submetidas à aprovação – se for o caso da matéria, ao ser apresentada dessa forma, ser apreciada com mais celeridade e da maneira como almeja a população.  

A diferença entre plebiscito e referendo é que plebiscito é convocado antes da criação de determinada norma ou ato legislativo para o povo aprovar ou não. Já o referendo é convocado após a edição da norma e cabe à população, ratificá-la ou não. Entre os parlamentares de um modo geral, no entanto, é consolidada a ideia de que não há mais clima para referendo, diante das declarações e entendimentos mantidos nos últimos dias.

Em entrevista no início da manhã, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), afirmou que, no encontro da última terça-feira com a presidenta Dilma Rousseff ficou acertado que o Planalto encaminhará ao Congresso as sugestões que considera mais importantes para os sistemas político e eleitoral brasileiros. Essas propostas serão analisadas juntamente com as matérias sobre o tema já em tramitação e consolidadas. A partir daí, as perguntas serão formalizadas para apresentação e consulta popular. “Após a manifestação popular, traremos o resultado para esta Casa e formularemos o projeto de reforma política”, acentuou.

Um dos principais pontos que está sendo questionado é a questão do recesso parlamentar. Os regimentos da Câmara e do Senado estabelecem que as atividades ficam suspensas nos períodos de 18 a 31 de julho e de 23 de setembro a 1º de fevereiro, mas, para que o recesso aconteça de fato, é preciso que os parlamentares votem, antes, o projeto de Lei de Direitrizes Orçamentárias (LDO), que norteia o orçamento da União para o próximo ano e está em plena fase de tramitação.

O recesso também pode ser solicitado pela presidência da República e pelo próprio presidente do Congresso – no caso o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), mas, apesar do anúncio de Calheiros ontem sobre o assunto, até o final da tarde não estava consolidada nenhuma solicitação formal neste sentido.

Sem interlocução

Nos bastidores da Câmara e do Senado, no entanto, recesso é discussão pequena diante do grande pepino a ser descascado pelos líderes do governo: a insatisfação dos parlamentares dos partidos aliados – principalmente o próprio PT e PMDB – de não terem tomado conhecimento com antecedência das medidas anunciadas pela presidenta Dilma, numa reclamação que está se tornando corriqueira.

“A base está disposta a cooperar e até concorda com a questão do plebiscito, depois que foram ampliadas as conversações e que foi deixada para trás a ideia de constituinte exclusiva, até porque a população está pedindo por isso. Mas não achamos possível que esse relacionamento entre governo e Congresso, de caráter tão unilateral, tenha continuidade”, disse um político que preferiu não se identificar, presidente de um dos partidos da base aliada.

Para o líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE), que tem atuado como bombeiro e afirmado sucessivamente não existir crise entre os partidos da base, qualquer ânimo mais acirrado tenderá a ser apaziguado. Guimarães chamou a ideia do plebiscito sobre a reforma política “um gol de placa”. Mais comedido, o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), preferiu evitar comentários sobre os parlamentares. Enfatizou que o povo já deu um recado mais do que evidente nas ruas. “A população já deixou mais que evidente que quer participar do processo e essa será nossa orientação”, frisou, em tom diplomático.

O mesmo tom foi incutido no Senado pelo líder do PT na Casa, Wellington Dias (PI). “É preciso ouvir para valer os manifestantes que têm tomado as ruas do Brasil nos últimos dias”, acentuou o senador.

A oposição, por sua vez, intensificou as discussões sobre o manifesto divulgado na última terça-feira com propostas a serem sugeridas ao governo e ao Congresso. Com o título “Os brasileiros querem um Brasil diferente”, o documento é assinado por representantes do DEM, PSDB e MD (antigo PPS). Acentua que a agenda divulgada pela presidenta Dilma apresenta discursos “vazios e promessas não cumpridas em dez anos de governo” e pede: a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os gastos da Copa do Mundo, a realização de auditorias nas despesas do Executivo no evento, e ações de combate à corrupção e gestão pública.

Projetos votados

Por outro lado, ao mesmo tempo em que esquentam a discussão em torno dos pactos de Dilma e do plebiscito, Congresso e Câmara dão duro para mostrar à população que está tratando de fazer a sua parte. Durante a manhã, o grande destaque foi a aprovação, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, do projeto que institui o voto aberto para decisão sobre cassação de parlamentar. Considerada polêmica, a matéria foi aprovada no Senado em julho de 2012 e estava aguardando apreciação pela CCJ. Será encaminhada agora para o plenário da Casa. “Foi uma vitória pela transparência do Legislativo”, destacou o presidente da comissão, Décio Lima (PT-SC).

No Senado, foi aprovado no início da noite, pelo plenário, em votação simbólica, projeto que transforma a corrupção ativa e passiva em crime hediondo. Com isso, esse delito passa a ser considerado tão grave quanto homicídio qualificado e estupro, por exemplo. Na prática, as penas serão mais severas: de 2 a 12 anos passarão a ser de 4 a 12 anos de prisão. “Temos que admitir que o Senado trabalha mais rápido em função dos protestos”, comemorou o autor da matéria, senador Pedro Taques (PDT-MT).