Em SP, ativistas pró-Dilma criticam ‘obscurantismo’ da campanha

Frei Betto e o padre Júlio Lancelotti criticaram uso indevido da religião no período eleitoral

Juristas e intelectuais em ato de apoio à candidatura de Dilma Rousseff, no Tuca, em São Paulo (Foto: Geraldo Lazzari)

São Paulo – Aberto em 1965 e tendo como marco de estreia a apresentação de “Morte e Vida Severina”, o Teatro da Universidade Católica (Tuca), da PUC de São Paulo, foi lembrado na noite de terça-feira (19) como local de resistência à ditadura. Na visão de várias participantes do ato pró Dilma Rousseff, o velho Tuca foi mais uma vez cenário de manifestações contra o que consideram ser o obscurantismo.

“Lamento que numa campanha presidencial temas que são importantes, mas não prioritários, como aborto e religião, tenham se destacado. Lamento que bispos panfletários estejam falando tantas mentiras. Felizmente, eles não falam em nome da Igreja e da CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil)”, afirmou o escritor e religioso Frei Betto. Para ele, a América Latina vive uma “primavera democrática” e talvez esteja vivendo sua última chance de fazer reformas estruturais por vias pacíficas.

Para a senadora eleita por São Paulo, Marta Suplicy, esta foi uma das campanhas eleitorais mais “sórdidas” do país. “Talvez 1989 tenha chegado nesse nível. Mas esta dói mais, porque é uma mulher que está sendo desrespeitada e desqualificada”, afirmou. Para ela, certos acontecimentos da campanha fazem o Brasil se tornar “um país de aiatolás, de Idade Média, contra tudo que lutamos”. A mesma visão tem o deputado eleito Gabriel Chalita: “Assistimos a uma das mais feias eleições, com uma política de submundo, de subsolo”.

O padre Júlio Lancelotti, bastante aplaudido, lembrou que naquele local ele celebrou a missa de corpo presente do educador Paulo Freire, que morreu em 1997. E destacou a diferença entre o atual governo e o de Serra em São Paulo, “aquele que tem a visão de que o povo de rua não é cidadão”. E também lamentou o uso indevido da religião na campanha eleitoral. “A religião é para libertar, não para aprisionar. A Igreja não tem a tutela da consciência do povo. O povo quer liberdade de consciência. A missão da Igreja é lavar os pés dos pobres e não dominar a consciência dos ricos.”

O senador Eduardo Suplicy também criticou os golpes baixos da campanha, revelando que seu filho André recebeu um e-mail de um advogado com um suposto artigo de Frei Betto, enumerando 13 motivos para não votar em Dilma. “Eu não vou citar aqui os 1.300 motivos pelos quais votarei em Dilma”, comentaria Frei Betto pouco depois. Suplicy disse ter encaminhado a mensagem para as representações estadual e nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

A viúva de Paulo Freire, Ana Maria, a Nita, declarou que o educador estava ali presente, “com o Brasil, com a Justiça e a democracia”. E lembrou as origens da pedagogia desenvolvida por Paulo Freire ainda nos anos 1940, nos contatos com operários. “Paulo foi percebendo que aqueles homens não falavam porque lhes eram impostas as respostas prontas”, disse Anita. Ela se disse emocionada com a disposição de Oscar Niemeyer, que aos 102 anos participou, na segunda-feira (18), de um ato de apoio a Dilma realizado no Rio de Janeiro. “Paulo estaria hoje aqui com seus 89 anos, dizendo: Dilma, você é a nossa presidenta”.

O candidato a vice-presidente na chapa de Dilma, Michel Temer (PMDB), lembrou de seus tempos de professor de Direito Constitucional na PUC. E a própria candidata, em vídeo, destacou a importância histórica do Tuca, sem deixar de mencionar os incêndios – “criminosos” – ocorridos no local em 1984. Houve também quem lembrasse da invasão da PUC pela polícia, ocorrida em 1977. Muitos dos ocupantes das 672 cadeiras do teatro, mais outras centenas de pessoas, que lotavam os corredores e o saguão principal, provavelmente viveram aqueles tempos.