Após artistas em 2006, policiais federais tentam Congresso em 2010

Delegados e agentes buscam colher dividendos políticos de exposição pública gerada por operações; analista lembra que grupo tem vantagem de imagem associada à honestidade

Acusado de abusos na Satiagraha, Protógenes Queiroz definirá entre Câmara ou Senado. O deputado Marcelo Itagiba tentará a reeleição, e Cláudio Avelar terá apoio de outros policiais do DF para ser parlamentar. (Fotos: José Cruz e Gervásio Baptista. ABr)

As chapas ainda estão sendo desenhadas, mas as eleições do próximo ano, no que diz respeito ao Congresso, devem ser marcadas pelos candidatos ligados às operações policiais. Na legislatura anterior, os destaques foram figuras do meio artístico como o estilista Clodovil Hernandez, que se elegeu deputado federal pelo PTC com a terceira maior votação em São Paulo (493.951), e o cantor Frank Aguiar, que angariou 144.797 votos pelo PTB.

Agora, a exposição midiática das operações da Polícia Federal rende dividendos políticos àquelas figuras que conseguiram aparecer frente às câmeras. O caso notório é de Protógenes Queiroz, que comandou a polêmica Operação Satiagraha, investigação que teve como alvo as contas do banqueiro Daniel Dantas. Suspenso de suas atividades e com possibilidade de ser expulso da corporação por supostas irregularidades na condução do caso, o delegado hesitou durante meses sobre qual partido ingressar, até aderir ao PC do B no início de setembro.

Presidente do Sindicato dos Policiais Federais no Distrito Federal, o agente Cláudio Avelar deve postular candidatura a deputado também pelo PC do B. José Pinto de Luna, ex-superintendente da Polícia Federal em Alagoas, assinou nesta sexta-feira (11) com o PT tendo a incumbência de melhorar a presença do partido no estado – atualmente, a sigla tem apenas dois deputados na Assembleia Legislativa e jamais conseguiu mandar alguém para Brasília. Luna, famoso pela Operação Taturana, que levou presos alguns dos parlamentares do estado, pode concorrer a uma vaga no Senado contra Renan Calheiros (PMDB) e Heloísa Helena (PSOL).

Leonardo Barreto, cientista político da Universidade de Brasília, não tem dúvidas de que esses candidatos largam com duas vantagens: são mais conhecidos e têm a imagem pessoal associada à honestidade. Ele destaca que as candidaturas nascem da grande presença midiática com a qual contaram os integrantes da Polícia Federal nos últimos anos, “e essa exposição pública por sua vez deriva de um fenômeno que é novo, de certa maneira, que é a investigação e a prisão de autoridades”.

Walter Sorrentino, secretário de Organização do PC do B, considera que há uma explicação complementar, que é o que ele define como “retomada de horizontes” no Brasil durante o governo Lula. “Mostrou que o país pode muito. Acho que um período assim desperta num segmento muito mais vasto do povo a intenção de participar da vida pública”, pondera.

Defensora da candidatura de Cláudio Avelar, a Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) não demonstra a mesma satisfação com a campanha de Protógenes Queiroz. O presidente da Fenapef, Marcos Wink, pensa que o êxito das operações da Polícia Federal tem sido atribuído exclusivamente ao chefe das ações, “que às vezes é a pessoa que menos trabalhou na operação. Tem que aparecer a instituição, não a pessoa”.

Dizendo-se otimista com a possibilidade de que mais agentes da Polícia Federal ganhem posições no Congresso, o deputado Marcelo Itagiba, ex-diretor de Inteligência da PF, entende que cabe à própria instituição a apuração por eventuais abusos cometidos por Protógenes e defende punições. “Pelo que ficou apurado, cometeu abusos e excessos que a lei não lhe autorizava a cometer, e não podemos viver de que os fins justificam os meios empregados”, afirma.

Não tendo dúvidas de que o delegado da Satiagraha viabilizou-se candidato apenas pela vitrine que ganhou no último ano “até pelas trapalhadas que cometeu”, Marcos Wink aponta que Protógenes não tem nenhuma posição ideológica, não era afiliado a partido. “Andou passeando pelo Brasil por conta do PSOL, andou procurando o PDT e foi parar no PC do B. Ele não tem nada a ver com o PC do B, mas está lá porque pode servir para os interesses dele. Longe de dizer que os interesses são escusos. Estou apenas falando que é candidato dele, não do partido.”

O PC do B, que argumenta ter discutido durante três meses a entrada do policial no partido, afirma não estar preocupado com a possibilidade de Protógenes ser maior que a própria sigla. Walter Sorrentino destaca, a cada oportunidade que tem, que o delegado teve um passado de adolescente no então Partido Comunista Brasileiro (PCB), e que posteriormente seguiu para a carreira na Polícia Federal, mas sem deixar de lado sua opção pela esquerda. “A questão é a gente se unir em torno de um projeto político, e nesse ponto Protógenes é muito coeso. Sabe que é preciso reforçar a capacidade de o Estado nacional empreender um novo ciclo de transformação da sociedade brasileira”, afirma o secretário de organização.

Histórico e bandeiras

O caso mais conhecido de um ex-policial federal que se elegeu para cargos do Legislativo no Brasil é o de Romeu Tuma, que foi diretor-geral entre as décadas de 80 e 90 e que está na segunda legislatura.

Marcelo Itagiba, que ganhou notoriedade como secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, tenta no próximo ano reeleger-se deputado federal pelo PMDB. O parlamentar afirma que, para ser próximo da sociedade e por convicção própria, diversificou suas bandeiras, sem focar-se exclusivamente na questão da Polícia Federal. “Meu próprio lema de campanha era ‘Lugar de criança é na escola, lugar de bandido é na cadeia’. Eu já achava que não era apenas questão de segurança pública a solução desses problemas. Se não tiver investimento na área social, não adianta atuar só com a repressão”, ressalta.

Nem Itagiba, nem Tuma, nem Protógenes: para a Fenapef, não houve até hoje deputado ou senador que representasse a categoria. Por isso, a aposta da federação será depositada em Cláudio Avelar. Marcos Wink aponta que o agente terá colaboração dos colegas de PF no Distrito Federal, e que os de outros estados ajudarão no que for possível.

O cientista político Leonardo Barreto considera natural que os partidos procurem “estrelas para poder puxar votos. Porque aqueles que decidirem depositar seu voto de confiança nesses candidatos vão ajudar a formar o coeficiente e a eleger outros nomes do partido”.

No PC do B, a aposta é de que a entrada de delegados não será um fator aglutinador apenas nas urnas. O partido sente o “Efeito Protógenes”, ou seja, passou a ser procurado por mais gente em busca de filiação. “A onda de choque da entrada do Protógenes repercutiu por todo o país. É um nome muito conhecido, que foi despertando essa vontade em outros segmentos da área de segurança, da PF, da Polícia Civil”, afirma Walter Sorrentino.

Mas Leonardo Barreto faz uma advertência sobre a atuação desses candidatos: “Como parlamentar, não vai mais poder exercer suas funções investigativas. A tendência é que levem um tempo de adaptação a essa nova vida caso venham a ganhar o mandato. Alguns se adaptam muito bem, e o maior exemplo é Tuma. Agora, outros fatalmente vão desaparecer por não estarem acostumados a esta vida.”

Marcelo Itagiba considera que esse aspecto, pelo menos para ele, não foi problema: “Com o tempo, você vai deixando de ser um investigador para ser um administrador. Eu saí daquilo que eu mais gostava, que era a execução da ação policial, para uma atividade de administrador e daí para o processo político.”