legislativo paulista

Base de Alckmin mantém investigações trancadas com CPIs ‘chapa branca’

De cinco CPIs instaladas este ano, duas não têm presidente, uma obteve apenas um depoimento, outra investiga um tema federal e a última repete uma temática que já foi apurada três vezes

Alesp

Com maioria folgada, base de Alckmin protocola CPIs em massa para evitar que oposição proponha investigações

São Paulo – A base parlamentar do governador Geraldo Alckmin (PSDB) iniciou a 18ª legislatura da Assembleia Legislativa de São Paulo com uma semelhança negativa com a anterior: criar Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) com objetivo de impedir que a oposição possa propor investigações. No primeiro dia de sessões plenárias – 17 de março – os partidos da base de Alckmin protocolaram 15 pedidos de CPI. Porém, das cinco iniciadas neste ano, duas estão funcionando, duas não elegeram sequer o presidente e uma realizou somente três reuniões, sendo apenas uma para depoimentos.

A situação já não é novidade na Assembleia Legislativa paulista. Já foi realizada da mesma forma em 15 de março de 2011, com o pedido de abertura de várias CPIs pela base do governo no primeiro dia de trabalhos. Um terço delas não teve nem sequer presidente eleito e metade não teve relatório final.

“Essas comissões não têm o objetivo de produzir resultados para a sociedade. O principal objetivo é travar a oposição. É uma manobra da base do governo, que usa o regimento para impedir qualquer investigação séria. As poucas CPIs que acontecem têm reuniões canceladas por falta de quórum e começam a ser esvaziadas. A maior parte dos relatórios será ‘chapa-branca’, com conclusões inócuas”, afirmou o líder do PT na assembleia, deputado Geraldo Cruz.

Para instalar uma CPI é preciso apoio de 32 deputados. A oposição conta com 18 dos 94 deputados que compõem a assembleia: 15 do PT, dois do Psol e uma do PCdoB. Os demais – PSB, PSD, PV, PDT, DEM, PMDB, PPS – compõem a base do governador.

Além disso, somente cinco CPIs podem funcionar ao mesmo tempo. As comissões que têm o número exigido de assinaturas e cumprem outros requisitos formais são instaladas por ordem cronológica. Na primeira reunião são eleitos presidente, vice-presidente e relator. Têm prazo de funcionamento de até 120 dias, prorrogáveis por até 60 dias.

As comissões instaladas neste ano foram Trabalho Infantil, Diretórios Acadêmicos e Repúblicas de Estudantes, Santas Casas, Acidentes Ferroviários de Carga e Empresas de Telecomunicação. Todas foram constituídas em 28 de abril. A das Santas Casas tinha prazo de 90 dias e foi prorrogada por mais 45 dias. Todas as outras tinham prazo de funcionamento de 120 dias.

A CPI do Trabalho Infantil, que devia investigar a exploração laboral de crianças no estado, e a dos Diretórios Acadêmicos e Repúblicas de Estudantes, que devia investigar violações de direitos humanos em festas e recepções de novos alunos por diretórios acadêmicos, nem mesmo tiveram eleição do presidente. A RBA procurou os deputados proponentes Carlos Bezerra Júnior e Célia Leão, ambos do PSDB, mas não teve retorno.

A CPI dos Acidentes no Transporte Ferroviário de Carga tem realizado as reuniões normalmente e foi prorrogada por 60 dias. Mas investiga um tema de responsabilidade federal. E a das Empresas de Telecomunicações, que também funciona normalmente, aglutina investigações que já foram tema de comissões na última legislatura, nas CPIs da Telefonia Móvel e da TV por Assinatura, e também na 16ª legislatura (2007-2011), com a CPI da Telefonia.

Já a CPI das Santas Casas teve o presidente eleito somente em 18 de agosto. Desde então realizou outras duas reuniões: uma em que foram aprovados requerimentos, inclusive de convocação do secretário estadual da Saúde, David Everson Uip, e outra em que foi ouvido o diretor-presidente da Federação das Santas Casas, Edson Rogatti.

As demais reuniões, em que estava prevista oitiva com o secretário ou com seu adjunto, Wilson Modesto Pollara, não ocorreram. “Quando se percebeu que podia pesar para o lado do governo, a comissão começou a ser esvaziada”, afirmou o deputado Geraldo Cruz (PT). A próxima reunião desta comissão está marcada para terça-feira (22).

A assembleia já realizou uma CPI das Santas Casas, em 2009, que recomendou, entre outras coisas, que o Ministério da Saúde e a Secretaria Estadual da Saúde melhorassem a fiscalização dos repasses e reajustassem a tabela SUS; que o Ministério Público Estadual acompanhasse a situação das Santas Casas; e que o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo fizesse acompanhamento trimestral das contas das Santas Casas.

Mesmo sem desenvolver os trabalhos, as CPIs seguem impedindo que outras sejam instaladas. Pelo menos até que o presidente da Assembleia, atualmente o deputado Fernando Capez (PSDB), decida por sua dissolução ou escolha o presidente e o relator e determine o funcionamento da comissão. Na última legislatura, o então presidente Samuel Moreira (PSDB) acabou por dissolver várias comissões. A RBA procurou a presidência da Assembleia, mas não obteve retorno.

O regimento interno da Assembleia não deixa claro a partir de que momento uma comissão começa a funcionar. Assim, os parlamentares têm entendido que as CPIs podem começar a funcionar a qualquer momento, mesmo com prazo vencido, começando a contar o prazo pela eleição do presidente. E daí ainda é possível aprovar a prorrogação dos trabalhos.

Para a líder da minoria, deputada Beth Sahão, essas manobras expõem a prática dos governos tucanos no estado, de inibir qualquer possibilidade de a Assembleia denunciar os problemas estaduais. “Nós já tentamos investigar a corrupção no Metrô e na Companhia Paulista de Trens Metropolitanos e não conseguimos. Apurações na Fundação Casa, no Rodoanel e na CDHU também não prosperaram. Tudo que tentamos é impedido porque eles são a maioria e não se respeitam vozes dissidentes”, afirmou.

No período 2011-2015 ocorreram CPIs para investigar “os problemas relacionados com o consumo de gordura hidrogenada ou gordura trans, presentes principalmente nos alimentos industrializados” e saber sobre “empresas de telemarketing, com o objetivo de se evitar o abuso dessa prática ao consumidor de forma constrangedora”.

As próximas na fila atual não diferem muito dos temas repetitivos ou inusitados da legislatura anterior. A primeira da fila, proposta pelo deputado Carlão Pignatari (PSDB), pretende investigar irregularidades na prestação dos serviços das concessionárias de energia. Temática semelhante à da CPI da Eletropaulo, criada no ano passado, mas que não funcionou.

Há também propostas para investigar a “epidemia de crack no estado” e a “pratica de vandalismo por grupos organizados”. Outras propõem a apuração do “crescimento da obesidade infantil no estado”, da “suposta ocorrência de uma indústria de invasões em terrenos”, das “consequências da automedicação na saúde dos paulistas” e da “violência praticada por torcidas de futebol”.

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