Entrevista

‘Apoiar candidatura de Boulos em 2024 em São Paulo é o caminho da derrota’, diz Jilmar Tatto

Prefeito Ricardo Nunes ensaia aliança com bolsonarismo na capital paulista. Nesse cenário seria “um erro” o PT não ter nome na disputa e candidatura do Psol isolaria a esquerda, acredita deputado

Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados
Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados
Para Tatto, conduta do Psol nas votações do marco fiscal e reforma tributária não ajuda a unificar o PT em torno de Boulos

São Paulo – Muita água vai passar por baixo da ponte antes de alguma definição sobre a posição do PT nas eleições municipais da maior capital do país em 2024. Um eventual apoio do partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao deputado Federal Guilherme Boulos (Psol), em São Paulo, está longe de ser consensual.

Alas do PT nacional, como a da deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR), vêm sustentando que um acordo foi selado no processo eleitoral de 2022, quando Boulos desistiu de concorrer ao governo paulista em troca de ter o apoio petista em 2024 para a prefeitura. Mas outros setores do partido, vinculados a bases da capital paulista ou outros diretórios estaduais, como do Rio, dizem que não há acordo sobre isso e não há definição.

Essa ala defende que o PT precisa ter candidato não apenas para eleger o maior número de vereadores possível. Mas, também, porque seria grande o risco de o prefeito Ricardo Nunes (MDB), aliado à extrema direita bolsonarista, conseguir se reeleger contra um candidato marcadamente à esquerda, como Boulos. Lula e Fernando Haddad (candidato ao governo estadual) venceram na capital em 2022.

O deputado federal Jilmar Tatto (PT-SP) – nomeado secretário de Comunicação Social da Câmara dos Deputados pelo presidente Arthur Lira (PP-AL), no final de março – representa a posição deste segundo grupo. “Acho um erro apoiar uma candidatura do Psol na cidade de São Paulo”, diz.

O PT vem fazendo reuniões quinzenais no âmbito de um grupo de trabalho eleitoral (GTE) para discutir o tema. Nesta segunda-feira (10), é realizado o segundo encontro da série. O Diretório Nacional deve fazer uma reunião em agosto para tirar uma resolução a respeito. Enquanto isso, “não há decisão nenhuma”, esclarece Tatto, em entrevista à RBA.

Além de tudo, o comportamento do Psol, partido da base de Lula na Câmara, irritou importantes lideranças petistas em Brasília nas duas votações mais importantes no semestre para o governo. No primeiro grande teste, o do arcabouço fiscal, em uma questão crucial para o ministro Fernando Haddad (Fazenda), o Psol votou contra, em peso.

Na reforma tributária, a legenda de Boulos teve postura ambígua. Três deputados importantes – Fernanda Melchionna (RS), Glauber Braga (RJ) e Sâmia Bomfim (SP) – votaram “abstenção”, o que equivale a votar contra. E, pior, junto com o bolsonarismo. Um dos argumentos do trio foi que a reforma não mexia nas altas rendas ou em taxação de patrimônio, a exemplo de lucros e dividendos ou grandes fortunas.

Melchionna chegou a dizer que a PEC aprovada “é uma reforma apenas formal, sem avançar no conteúdo necessário”. Para Tatto, “esse comportamento não ajuda a unificar o PT no sentido de apoiar a candidatura deles em SP”.

Leia a entrevista de Jilmar Tatto:

As votações do Psol no arcabouço fiscal e reforma tributária prejudicam um eventual apoio do PT a Guilherme Boulos em 2024?

Nós não discutimos ainda a tática eleitoral de 2024. Ficou marcado no Diretório Nacional fazer uma reunião em agosto pra ter uma resolução sobre isso. Ao mesmo tempo foi criado um GTE, grupo de trabalho eleitoral, que hoje vai ter a segunda reunião e está discutindo o tabuleiro em relação aos municípios, principalmente as capitais. Vamos priorizar os municípios acima de 100 mil eleitores, e a questão de São Paulo vai estar em debate também.

Neste momento está zerado. Não há apoio oficial a nenhum candidato no Brasil inteiro. Na cidade de São Paulo, minha opinião é de que o PT deveria fazer um movimento de juntar todos os partidos que apoiaram Lula por uma candidatura única, para derrotar o prefeito e o bolsonarismo juntos. O bolsonarismo sabe que eles perdem a eleição em São Paulo, então estão se aliando ao (prefeito) Ricardo Nunes para tentar ganhar.

Ou seja, você defende uma alternativa mais ao centro.

Ao invés de juntar os descontentes de centro, nós estamos fazendo uma inflexão à esquerda. Apoiar uma candidatura do Psol é o caminho da derrota. Eu acho que teria que juntar o PSB, PDT, PT, Psol, Rede, Solidariedade, todos esses partidos, e buscar uma candidatura ampla. O Boulos, no Psol, não representa isso. Acho um erro apoiar uma candidatura do Psol na cidade de São Paulo.

O que eu coloco é que, se pelo menos o Boulos fizesse uma inflexão, de ser candidato do PT, ajudaria. Mas ele não faz isso. Não faz nenhum gesto. Em São Paulo, o Psol sempre foi oposição à nossa administração, foram oposição e lançaram candidaturas próprias. Boicotaram a administração de Haddad quando ele era prefeito, num momento difícil. Na Câmara Federal, agora, votaram contra o arcabouço fiscal e, como você observou, três votaram contra a reforma tributária.

Abstenção que, na conjuntura, equivale a ser contra…

Abstenção é contra. Quem se abstém é contra.

Um dos argumentos para votar “abstenção” é que a reforma aprovada não mexe nas altas rendas, como lucros e dividendos ou grandes fortunas. Mas o próprio Haddad vem explicando desde janeiro que esse tema é objeto de projeto de lei, no segundo semestre, e não de PEC, que exige quórum qualificado…

Tanto em relação à reforma de renda como a patrimonial ficou para o segundo semestre, isso foi colocado publicamente. Tivemos reunião no diretório nacional sábado, e discutimos a necessidade de fazer a reforma de renda e de patrimônio, conforme foi falado.

Então, ante a posição em relação ao arcabouço fiscal e à reforma tributária fica mais difícil apoiar Boulos, na sua opinião.

Fica mais difícil. O comportamento deles não ajuda a unificar o PT no sentido de apoiar a candidatura deles em São Paulo. Eu defendo que não precisa ter pressa para decidir a questão da eleição na cidade de São Paulo. Muita água vai passar por baixo da ponte.