Blindando a si mesmo

Bolsonaro revoga da Lei de Segurança Nacional, mas veta punição às fake news

Investigado no inquérito das fake news do STF, presidente barrou o combate à “comunicação enganosa em massa”. Legislação que enterra dispositivo criado pela ditadura militar tem outros quatro vetos

Marcos Corrêa/PR
Marcos Corrêa/PR
desenrolar dos recentes acontecimentos do último dia Sete de Setembro, no Brasil, foi a consolidação da farsa e da tragédia

São Paulo – O presidente Jair Bolsonaro sancionou com vetos nesta quarta-feira (1º) a Lei 14.197/2021 que revoga a Lei de Segurança Nacional (LSN), um dos principais resquícios da ditadura. Investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no inquérito que apura a divulgação de informações falsas, as fake news, Bolsonao barrou o artigo que previa punição a “comunicação enganosa em massa”, sob pena de 1 a 5 anos e multa. 

Em despacho publicado na edição de hoje (2) do Diário Oficial da União (DOU)o presidente alegou que o trecho “contrariava o interesse público” por não especificar qual seria a conduta alvo de punição, quem criou a informação falsa ou compartilhou. Bolsonaro questionou ainda se haveria um “tribunal da verdade” para definir a veracidade e declarou que medida poderia “afastar o leitor do debate público”. A decisão, ainda segundo o mandatário, foi acordada em consulta aos ministérios da Justiça e Segurança Pública, da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e o Gabinete de Segurança Institucional (GSI).

O projeto de lei definia a criminalização das disseminação de desinformações, no entanto, como “promover ou financiar, pessoalmente ou por interoposta pessoa, mediante uso do expediente não fornecido diretamente pelo provedor de aplicação de mensagem privada, campanha, ou iniciativa para disseminar fatos que sabe inverídicos, e que sejam capazes de comprometer a rigidez do processo eleitoral”. 

Outros vetos

Enviado pelo Senado em agosto e aprovado pelo Câmara em maio, o texto aprovado ainda deverá ser analisado pelo Congresso. Caberá aos parlamentares decidir, em um prazo de 30 dias, se mantém os vetos do presidente Bolsonaro na revogação da Lei de Segurança Nacional. 

Bolsonaro também vetou todo o capítulo relativo aos crimes contra a cidadania, impedindo a criminalização de quem impedisse “o livre e pacífico exercício de manifestação”. Também foi barrado o artigo que previa ação penal privada subsidiária. Por esse dispositivo, partidos políticos poderiam acionar a Justiça para os casos em que o Ministério Público não atuasse dentro do prazo da lei. Seja na oferta de denúncia ou ordenando o arquivamento de inquérito relativos aos crimes tipificados pela lei de revogação da LSN. Nesse caso, interrupção do processo eleitoral, violência política e comunicação enganosa em massa, entre outros. 

O artigo que estabelecia a perda do posto e da patente em caso de crimes cometidos por militares também foi vetado pelo presidente da República. A decisão foi justificada como uma “violação ao princípio da proporcionalidade”. Assim como o dispositivo que tratava do aumento de pena para crimes cometidos por funcionários públicos ou militares, ou com “violência ou grave ameaça exercidas com emprego de arma de fogo”. 

Entulho autoritário enterrado

Criada em 1983, durante o governo do último general-presidente, João Figueiredo, a LSN, apesar de ser resíduo ditatorial, continuou sendo aplicada durante o regime democrático. Principalmente no período do atual governo. Com base nela, o objetivo principal era punir manifestações críticas e perseguir opositores à gestão federal de Bolsonaro.

À RBA, operadores do direito comemoraram a revogação da Lei de Segurança Nacional pelos parlamentares, considerando-a como “uma resposta aos arroubos autoritários do presidente”. “É uma resposta a esses usos e abusos do direito para reprimir pessoas”, chamou atenção, por exemplo, o professor de Direito da Universidade de Fortaleza (Unifor) e integrante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) Marcelo Uchôa quando o texto foi sancionado no Senado

Apesar de sancionada com vetos, a Lei 14.197/2021 ainda cria um título no Código Penal relativo a crimes contra o Estado democrático de direito. Entre eles, são tipificados 10 crimes, como atentado à soberania e à integridade nacional e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. A lei ainda prevê pena de quatro a 12 anos para o crime de golpe de Estado. Interrupção do processo eleitoral, violência política e espionagem também foram garantidos.

A nova lei também destaca que a atividade jornalística, reivindicação de direitos e garantias constitucionais por meio de passeatas, greves ou outras formas de manifestações políticas com propósitos sociais e o apelo à manifestação crítica aos poderes constitucionais não serão considerados crimes contra o estado democrático de direito.