Justiça seletiva

Lula sofre nova condenação, agora em processo por sítio de Atibaia

Juíza Gabriela Hardt, da Operação Lava Jato, condenou ex-presidente a 12 anos e 11 meses de prisão. Cabe recurso

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Juíza assumiu interinamente as funções do juiz Sergio Moro, que foi para o Ministério da Justiça e Segurança Pública

São Paulo – O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi condenado a 12 anos e 11 meses de prisão pela juíza Gabriela Hardt, da Operação Lava Jato, no processo que envolve o sítio de Atibaia, no interior de São Paulo. Cabe recurso.

“É uma sentença ilegal, que contraria a jurisprudência do direito brasileiro, porque não se baseia em provas. É uma sentença frágil, já temos decisão de tribunais superiores, de que não existe condenação somente baseada na palavra de delatores”, afirmou o deputado Paulo Pimenta (PT-RS), em entrevista coletiva na Câmara Federal.

Pimenta associa a sentença de primeira instância um projeto de poder, que vem de uma juíza substituta de Sérgio Moro, “que hoje consorciado com Bolsonaro assumiu a gestão do aparelho de Estado”.  

A juíza federal de Curitiba acatou argumento do Ministério Público Federal de que Lula teria participado conscientemente de um esquema criminoso de lavagem de dinheiro e corrupção que envolve a Petrobras e empreiteiras. O ex-presidente é acusado, inclusive, de ter ciência de que os diretores da Petrobras utilizavam seus cargos para recebimento de vantagem indevida em favor de agentes políticos e partidos políticos.

“Como parte de acertos de propinas destinadas a sua agremiação política em contratos da Petrobras, o Grupo Odebrecht e o Grupo OAS teriam pago vantagem indevida ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva consubstanciada em reformas no Sítio de Atibaia por ele utilizado”, apontou Gabriela na sentença.

A juíza assumiu interinamente as funções do juiz Sergio Moro que assumiu o Ministério da Justiça e Segurança Pública no governo de Jair Bolsonaro (PSL). O substituto oficial de Moro deve ser anunciado nesta sexta (8).

Assista à entrevista de Paulo Pimenta e Gleisi Hoffmann

Defesa

A condenação de Lula no processo do sítio de Atibaia ainda é de primeira instância e o ex-presidente pode recorrer da sentença. A defesa do ex-presidente afirma que não há provas de que as reformas na propriedade tenham ligação com um eventual esquema de corrupção que envolva empreiteiras e Petrobras.

O sítio pertence ao empresário Fernando Bittar, amigo de Lula e de seus familiares há décadas. Os advogados do ex-presidente reforçam que o ex-presidente alvo de perseguição política e nega ser dono do sítio.

“A perseguição a Lula não para. Uma segunda condenação a jato foi proferida, exatamente quando cresce a possibilidade de Lula ser Nobel da Paz. Na memória do povo e da história, Lula será sempre maior do que seus carrascos”, afirmou a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), no Twitter.

Gleisi citou um trecho da sentença em que a juíza Gabriela Hardt trata o empreiteiro Leo Pinheiro por duas denominações, como se fossem dois delatores diferentes: “Embora a defesa de Luiz Inácio lula da Silva tente diminuir a credibilidade dos depoimentos de prestados por colaboradores e pelos co-réus Leo pinheiro e José Aldemário…” cita a magistrada. Leo e José Aldemário são a mesma pessoa.

O deputado Pimenta destacou que o processo contra Lula é contaminado por uma disputa ideológica de um grupo de procuradores e que “boa parte do processo foi conduzida por um juiz (Sergio Moro) que hoje é ministro da Justiça do governo Bolsonaro, principal adversário político daquele que eles impediram de ser candidato, que foi o presidente Lula”.

Nota acusa uso perverso das leis

Confira nota divulgada pela defesa do ex-presidente Lula após a sentença da juíza Gabriela Hardt:

A defesa do ex-presidente Lula recorrerá de mais uma decisão condenatória proferida hoje (06/02/2019) pela 13ª Justiça Federal de Curitiba que atenta aos mais basilares parâmetros jurídicos e reforça o uso perverso das leis e dos procedimentos jurídicos para fins de perseguição política, prática que reputamos como “lawfare”.

A sentença segue a mesma linha da sentença proferida pelo ex-juiz Sérgio Moro, que condenou Lula sem ele ter praticado qualquer ato de ofício vinculado ao recebimento de vantagens indevidas, vale dizer, sem ter praticado o crime de corrupção que lhe foi imputado. Uma vez mais a Justiça Federal de Curitiba atribuiu responsabilidade criminal ao ex-presidente tendo por base uma acusação que envolve um imóvel do qual ele não é o proprietário, um “caixa geral” e outras narrativas acusatórias referenciadas apenas por delatores generosamente beneficiados.

A decisão desconsiderou as provas de inocência apresentadas pela Defesa de Lula nas 1.643 páginas das alegações finais protocoladas há menos de um mês (07/01/2019) — com exaustivo exame dos 101 depoimentos prestados no curso da ação penal, laudos técnicos e documentos anexados aos autos. Chega-se ao ponto de a sentença rebater genericamente a argumentação da defesa de Lula fazendo referência a “depoimentos prestados por colaboradores e co-réus Leo Pinheiro e José Adelmário” (p. 114), como se fossem pessoas diferentes, o que evidencia o distanciamento dos fundamentos apresentados na sentença da realidade.

Ainda para evidenciar o absurdo da nova sentença condenatória, registra-se que:

 – Lula foi condenado pelo “pelo recebimento de R$ 700 mil em vantagens indevidas da Odebrecht” mesmo a defesa tendo comprovado, por meio de laudo pericial elaborado a partir da análise do próprio sistema de contabilidade paralelo da Odebrecht, que tal valor foi sacado em proveito de um dos principais executivos do grupo Odebrecht (presidente do Conselho de Administração); esse documento técnico (elaborado por auditor e perito com responsabilidade legal sobre o seu conteúdo) e comprovado por documentos do próprio sistema da Odebrecht foi descartado sob o censurável fundamento de que “esta é uma análise contratada por parte da ação penal, buscando corroborar a tese defensiva” — como se toda demonstração técnica apresentada no processo pela defesa não tivesse valor probatório;

 – Lula foi condenado pelo crime de corrupção passiva por afirmado “recebimento de R$ 170 mil em vantagens indevidas da OAS” no ano de 2014 quando ele não exercia qualquer função pública e, a despeito do reconhecimento, já exposto, de que não foi identificado pela sentença qualquer ato de ofício praticado pelo ex-presidente em benefício das empreiteiras envolvidas no processo;

– foi aplicada a Lula, uma vez mais, uma pena fora de qualquer parâmetro das penas já aplicadas no âmbito da própria Operação Lava Jato — que segundo julgamento do TRF4 realizado em 2016, não precisa seguir as “regras gerais” — mediante fundamentação retórica e sem a observância dos padrões legalmente estabelecidos.

Em 2016 a defesa demonstrou perante o Comitê de Direitos Humanos da ONU a ocorrência de grosseiras violações às garantais fundamentais, inclusive no tocante à ausência de um julgamento justo, imparcial e independente. O conteúdo da sentença condenatória proferida hoje somente confirma essa situação e por isso será levada ao conhecimento do Comitê, que poderá julgar o comunicado ainda neste ano — e eventualmente auxiliar o país a restabelecer os direitos de Lula.