Contradição

Levy surpreende ao apoiar proposta que impõe critérios para o limite da dívida pública

Ministro defendeu a matéria, mas não disse qual o teto da dívida almejado pelo governo. Segundo ele, a limitação disciplina os gastos públicos contanto que seja acompanhada de outras medidas

Geraldo Magela/Agência Senado

Levy compareceu à CAE de última hora, em substituição ao secretário do Tesouro Nacional, Marcelo Saintive

Brasília – O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, surpreendeu muitos parlamentares, hoje (18), durante audiência pública da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE) sobre a proposta que estabelece critérios e limita o montante de endividamento da União. A matéria, uma proposta de resolução de autoria do senador José Serra (PSDB-SP), vinha sendo contestada e considerada pela base aliada do governo uma forma de enrijecer ainda mais as contas do Executivo. Mas, num sentido oposto de pensamento, Levy disse considerar positiva a criação de um teto para a dívida pública. De acordo com ele, essa limitação disciplina o gasto público e, por isso, acha que deve ser acolhida. Contanto, ressaltou, que seja aprovada acompanhada de outras medidas, como a revisão dos gastos públicos.

Para Joaquim Levy, o país precisa garantir uma trajetória adequada para o gasto público, com o intuito de melhorar o cenário de investimentos e controlar o crescimento da dívida pública. Por esse motivo, o ministro disse que, a seu ver, a discussão da CAE é “muito importante”. Ele citou várias propostas apreciadas recentemente ou em tramitação no Congresso que podem ajudar a conter os gastos públicos. Em relação à proposta de exigência para que operações de planejamento tributário sejam apresentadas à Receita Federal, por exemplo, lamentou o fato de ter sido rejeitada pela Câmara dos Deputados.

Já quanto ao projeto de repatriamento de recursos, enfatizou que o sucesso da lei dependerá de segurança jurídica do texto a ser aprovado em definitivo (a matéria já foi apreciada pela Câmara e está, atualmente, no Senado).

O ministro lembrou que os recursos a serem repatriados permitirão que um percentual do montante a retornar para o Brasil seja utilizado para compensar as perdas dos estados com a reforma do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). E destacou que tal reforma vai destravar investimentos e ajudar a resolver a situação dos governos estaduais, que qualificou como “insustentável” – o que ajudará a diminuir o teto da dívida pública.

Surpresa e confusão

O senador Lindbergh Farias (PT-RJ), um dos maiores oposicionistas à matéria de Serra, que vinha atuando na defesa do governo e acusa o texto de prejudicar as medidas de ajuste fiscal, disse que estava “surpreso e confuso” com o posicionamento de Levy. Segundo Farias, que não conseguiu esconder sua irritação, até onde ele tinha conhecimento, todo o Executivo se manifestava de forma contrária à proposta do senador tucano.

“Não entendi. Pelo que parece, houve alguma reunião na Casa Civil na qual criaram uma posição contrária ao projeto e novas alternativas, mas isso ficou confuso. Não dá para o ministro vir aqui e dizer que apoia a matéria e não entrar nos detalhes dos números e das medidas a serem atreladas ao texto. Digo isso porque sou da base do governo e estou querendo entender melhor o que acontece”, protestou.

O ministro da Fazenda respondeu, de forma lacônica, que seu entendimento é de que maiores detalhes da matéria poderiam ficar para ser discutidos depois. Afirmou que a proposta de resolução cria um arcabouço para o desenvolvimento econômico futuro do país.

“Temos que montar sistemas de maneira estruturada com o gasto, para o país ter um norte. A dívida não pode crescer de maneira sistemática acima do PIB (Produto Interno Bruto). Por isso, o governo tem que se preparar para orientar os gastos obrigatórios em trajetória compatível e sustentável pela sociedade”, afirmou Levy.

O pesquisador da Fundação Getúlio Vargas José Roberto Afonso elogiou a proposta e destacou que o Brasil está na contramão dos demais países emergentes. “Mais do que nunca, é o momento de aprovarmos esta medida. Até porque o Tesouro paga a sua dívida pública com caixa e não teria problemas em limitar essa dívida”, ressaltou.

Afonso acrescentou que já existem limitações para as dívidas públicas dos estados, municípios e o Distrito Federal, e que nestes casos, apenas três dos pouco mais de 5,5 mil municípios não conseguiram cumpri-las. “Não vejo dificuldades para a União cumprir isso. Sem falar que a matéria diz respeito a uma responsabilidade do governo, ao seu papel constitucional”, ressaltou.

Os senadores, mesmo demonstrando estarem divididos quanto ao posicionamento de Levy e de Afonso, prosseguiram a audiência pública, que ainda teve como participantes o professor do Instituto de Economia da Universidade de Campinas Pedro Paulo Zahluth Bastos e o chefe da Assessoria Econômica do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Manoel Carlos de Castro Pires.

Levy compareceu à CAE de última hora, em substituição ao secretário do Tesouro Nacional, Marcelo Saintive. Segundo explicou depois o senador Delcídio Amaral (PT-MT), o próprio ministro se convidou, destacando para os integrantes da comissão que gostaria de, ele próprio, debater o assunto.

Só não se sabe até que ponto o titular do Ministério da Fazenda combinou sua estratégia com a base aliada do Senado.

Leia também

Últimas notícias